As Fifis do “mete na conta”



Não sei que rumo a vida vai tomar ou que destino lhe daremos nós, humanos. De dia para dia, se corrompem valores, se alteram costumes e se passa por cima da moral. Quando assim falo, note-se, não me refiro a valores, costumes e moral rígidos, pois nem sou freira, muito menos beata ou defensora dos ideais salazaristas. Apenas olho com algum desagrado o percurso que a vida segue. Senão reparem: há poucos dias, numa loja de pronto-a-vestir infantil, em que não falta roupa juvenil e de adulto, deparei com uma pretensa cliente que, peça aqui peça acolá, acabou por abarrotar o balcão de roupa que me questionei se alguma vez usufruiria. Logo me senti algo incomodada ao verificar que eu própria tinha seleccionado umas meias de lã, azuis, número oito. Comparadas às compras da senhora, que rapidamente alcunhei de Fifi, o que eu tencionava comprar era uma insignificância. Pior me senti quando a cliente da moda me dirigiu aquele olhar de cima a baixo, como quem pensa para com os seus botões” Olha p’ra esta, vir à boutique por uns reles collants! Coitada da pobrezinha!”.

Evitando o olhar usurpador e violador da Fifi da moda, dirigi-me a uma prateleira de camisolas de gola alta, procurando, sem precisar, uma camisola preta que não ia comprar. Desviada a atenção da Fifi da moda, concluí que a cliente de altíssimo prestígio teria, provavelmente, tanto dinheiro que não sabia como gastá-lo. Teria também uma fraca criatividade, levando peças repetidas, de cores diferentes. Dei por mim a sorrir ao pensar na proposta que lhe poderia fazer “ Excelentíssima Senhora, gostaria de informá-la de que, para o caso de não saber o que fazer a tanta roupa, há um recipiente, junto a um hipermercado, que recolhe roupas para África.” Mas, às tantas estou redondamente enganada e a Madame vai abrir alguma boutique nova no Fundão!

O que é certo é que eu estava realmente intrigada e repreendi-me por estar a pensar num assunto que não me dizia minimamente respeito. Que importância tinha o facto de a Fifi da moda levar metade da mercadoria da loja? Até estava a contribuir para o pequeno comércio. Era um acto de benevolência para com a dona da loja!

Chegada a estas conclusões, logo me voltei a surpreender. Desta feita com a dona da loja que, em vez de apresentar um ar radiante de quem já facturou umas massas, dirigia um olhar enjoado para o balcão repleto de roupa. “Não percebo. Devo estar a ter alucinações!” pensei e repreendi-me “ deixa lá o que se está a passar aqui e paga mas é as meias!”

Resoluta, dirigi-me novamente ao balcão, claro que um pouco encavacada com as simples meias que levava. “ Há dias em que mais vale ficar em casa!”

Foi então que o mais surpreendente aconteceu: a minha prezada Fifi, a minha fabulosa e misteriosa cliente da moda solicitava à dona da loja “Olhe querida, ponha-me a roupa em sacos e meta na conta!”. Meu Deus, vejam só a razão, mais que justa, do enjoo da nossa querida dona da loja. Tinha afinal razões de sobra para se sentir preocupada.

Agora, resta-me um conselho às “Fifis do mete na conta”: gastem dentro das vossas possibilidades. Não ensinem aos vossos filhos estes padrões de vida, que não correspondem à realidade. Sejam menos consumistas e mais ponderadas. Por que valores se regem? Que costume é este? Qual a moral da história? Afinal lucrou mais a dona da loja, naquele dia, com as meias que comprei do que com tudo quanto a Fifi levou e não pagou. Fifis da moda, não fiquem a dever em todo o lado – na farmácia, no café, na cabeleireira, no restaurante, e em muitas outras lojas onde acumulam dívidas sem o mínimo pudor, sem vergonha de tamanha falta de conduta!
                                                                                              Célia Gil

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