Histórias Soltas Presas Dentro de Mim

Rodrigues, Pedro (2020). Alice do Lado Errado do Espelho. Lisboa: Cultura Editora.

N.º de páginas: 128
Início da leitura: 16/11/2025
Fim da leitura: 19/11/2025

**SINOPSE**
"E se um dia acordássemos do outro lado do espelho? E se a maçã vermelha de Eva fosse a mesma que a Branca de Neve trincou? Será que a Rapunzel cortou o cabelo para evitar o contacto social? E o Lobo: porque é que é sempre ele o mau da fita? Estaria a profecia da Bela Adormecida certa? E a Cinderela: precisaria, ela, de ir ao baile para ser feliz? De uma coisa devemos estar certos: o mundo pode ruir como um póquer de ases - mas voltará a erguer-se como um castelo de cartas.

A Capuchinho-Vermelho encomendou a comida para a avó pela Uber Eats mal sabia ela que o entregador era o Lobo Mau."
Em Alice do Lado Errado do Espelho, Pedro Rodrigues propõe um exercício literário que parte de um gesto simples: revisitar figuras clássicas do imaginário infantil e transportá-las para o quotidiano contemporâneo, marcado pelo contexto pandémico. O livro, composto por sete contos breves, funciona como um espelho estilhaçado onde cada fragmento devolve uma imagem familiar mas subtilmente distorcida, obrigando o leitor a rever aquilo que julgava conhecer.
A escolha das protagonistas, Alice, Bela, Capuchinho Vermelho, Cinderela, Rapunzel, Branca de Neve e Bela Adormecida, não é casual. Representam arquétipos profundamente enraizados na cultura popular, facilmente reconhecíveis, mas que aqui surgem reconstruídos num registo sóbrio e atual. O diálogo com os contos de fadas originais existe, mas serve sobretudo para expor fragilidades humanas contemporâneas, medos atuais e distorção de conceitos morais, marcados pela pandemia.
A presença da pandemia, recorrente em todos os contos, não é tratada de forma sensacionalista. Surge como pano de fundo e, por vezes, como força determinante na narrativa, alterando rotinas, expondo solidões e acelerando processos de transformação interna. Esta atualização não desvirtua os contos originais, antes lhes acrescenta camadas de leitura que os tornam mais próximos do leitor adulto.
A escrita de Pedro Rodrigues é contida e direta, apostando na limpidez em vez do ornamento. Isso confere aos textos uma tonalidade sóbria que contrasta, de forma interessante, com o caráter fantástico das personagens. A brevidade dos contos, contudo, deixou-me uma sensação de que certas ideias mereciam maior desenvolvimento; há universos que se abrem rapidamente e se fecham com igual rapidez, deixando ecos que, embora sugestivos, poderiam ter sido explorados com mais profundidade.
Ainda assim, Alice do Lado Errado do Espelho cumpre o propósito de um livro de contos contemporâneo: surpreende, questiona e reinterpreta. 

 Dueñas, Maria (2025). Se Um Dia Voltarmos. Porto: Porto Editora.

Tradução: Carla Ribeiro
N.º de páginas: 448
Início da leitura:14/11/2025
Fim da leitura:17/11/2025

**SINOPSE**

"Orán, Argélia francesa, finais da década de 1920.
Ana Cecilia Belmonte, uma jovem espanhola de apenas 17 anos, foge de casa após um episódio traumático. Sem documentos nem destino, atravessa o mar Mediterrâneo e refugia-se numa terra estranha.
Num ambiente hostil, onde imperam a desigualdade, o colonialismo e a opressão, Cecilia encontra trabalho nas fábricas de tabaco, nos campos e nos bairros mais esquecidos de Orán. A cada passo, enfrenta humilhações, perigos e perdas. Mas é também aí, na margem da sociedade, que descobrirá alianças inesperadas, redes de apoio e de solidariedade feminina, vínculos e paixões que, aliados à sua coragem e resiliência, acabarão por conduzi-la por um caminho repleto de reviravoltas, conquistas e desafios.
A Guerra Civil Espanhola, o avanço nazi no Norte de África e o conflito pela independência da Argélia marcam o contexto desta poderosa história de resistência, que é também uma reflexão sobre identidade, pertença e os laços que nos unem à terra de onde partimos – mesmo quando já não é possível voltarmos."
Se Um Dia Voltarmos é um romance que se impõe pela forma como cruza destinos pessoais com momentos decisivos da história do século XX. María Dueñas constrói uma narrativa ampla, guiada por personagens que se movem entre o íntimo e o político, sempre com uma humanidade discreta, mas persistente.
A autora acompanha trajetórias marcadas por violência, perda, deslocação e resistência. As vidas que aqui encontramos são consistentes, feitas de escolhas imperfeitas, erros, avanços e recuos. Essa verosimilhança sustenta a força do livro: não há heroísmos fáceis, apenas pessoas confrontadas com circunstâncias que as ultrapassam e que, ainda assim, procuram manter alguma forma de dignidade.
O pano de fundo histórico, a Argélia francesa, a presença espanhola no Norte de África, a Guerra Civil Espanhola, o exílio, a Segunda Guerra Mundial e, mais tarde, a Guerra da Independência argelina, não surge como simples cenário. Funciona antes como estrutura que molda os percursos individuais, revelando a forma como a história coletiva interfere, condiciona e, por vezes, derrota ou reorienta a vida de quem a atravessa. Dueñas articula estes contextos com clareza e sem excessos, dando espaço ao leitor para acompanhar a evolução das personagens ao longo de décadas de conflito e transformação.
A narrativa é marcada por momentos de abuso, homicídio, silêncio e ruptura, mas também por gestos de coragem, reencontros e uma persistência quase teimosa em manter viva alguma esperança, mesmo quando esta parece frágil. A escrita mantém-se contida, evitando dramatizações exegeradas, o que torna o impacto emocional mais efetivo.
Adorei e recomendo vivamente!

Tordo, João (2025). Inventário da Solidão. Lisboa: Companhia das Letras.

N.º de páginas: 368
Início da leitura: 11/11/2025
Fim da leitura: 13/11/2025

**SINOPSE**
"Ao fim de quase quarenta anos de silêncios e ausências, um antigo grupo de colegas da faculdade reúne-se na Irlanda para um último adeus a Rebecca Connelly, cuja morte, súbita e inesperada, traz ao de cima fantasmas há muito enterrados.
De todos a mais intrépida, mas também a mais inconstante, ninguém poderia imaginar o rumo que a vida de Becca levaria, nem a devastação que traria na sua esteira. Ninguém, excepto o rapaz que a amou durante os tempos de faculdade - o narrador, agora sexagenário, que tenta ainda fazer sentido de todos os caminhos que trilharam o seu destino.
Será que na revisitação desse passado de segredos encontrará resposta para a solidão que o consome? Conseguirá ele, com a morte do seu primeiro amor, apaziguar-se com o rapaz que foi e o homem que se tornou?
Mais do que um romance sobre o vazio que os grandes amores deixam em nós quando terminam, Inventário da solidão é um livro poderoso sobre as doenças invisíveis que corroem o espírito, as matérias perigosas de que todos somos feitos."
Inventário da Solidão, de João Tordo, é um romance que se lê como uma viagem ao âmago de um ser marcado pelo peso do passado e pela impossibilidade de o ultrapassar. O ponto de partida é o reencontro de um grupo de antigos colegas universitários, quase quatro décadas depois, na Irlanda, para o funeral de uma mulher que os marcou a todos, mas sobretudo o narrador, e que desencadeia um fluxo de memórias, feridas e desejos não resolvidos. Tordo constrói aqui uma narrativa que, embora assente num acontecimento concreto, rapidamente se expande para questões universais: a paixão, a insegurança que propicia, a obsessão amorosa, a saúde mental, o medo de falhar, e a solidão que se alastra quando o amor não cumpre a promessa de salvar aquele que ama.
O narrador é uma figura que vive num permanente estado de suspensão: refez a vida, mas nunca a reconstruiu verdadeiramente; avançou, mas não deixou de olhar para trás. A solidão que o acompanha não é a solidão da ausência física de outros, mas antes a solidão íntima, aquela que nasce do sentimento profundo de não ter sido capaz de corresponder às suas expectativas nem às dos que o rodearam. Quando o pathos se instala como condição de existência, como Tordo tão bem demonstra, a vida passa a desenrolar-se à sombra de um eco contínuo: o do silêncio interior que denuncia a frustração, o falhanço, a desilusão. E é nesta espiral que o romance coloca uma questão fundamental: até que ponto somos vítimas da vida ou cúmplices dos destinos que dizemos lamentar?
A escrita de João Tordo, aqui em plena maturidade, convoca referências que ampliam a espessura do livro, como a mitologia grega, aa filosofia, a música e a contextualização socio-política da época. Todas estas camadas surgem de forma orgânica, como se o autor quisesse lembrar-nos de que nenhuma história existe isolada do mundo, e que toda a experiência humana, mesmo a mais íntima, dialoga com uma herança cultural mais vasta. O tom oscila entre a euforia e uma melancolia pungente, num registo que parece estar sempre à procura da verdade emocional das personagens. Há, nos momentos de maior honestidade, uma crueza desarmante; noutros, uma delicadeza que confere dignidade ao sofrimento.
O romance é, afinal, um exercício de inventário da solidão,  das marcas que o tempo deixa, das escolhas que não se fizeram, das palavras que não se disseram. Tordo escreve como quem abre gavetas interiores, com o cuidado de quem sabe que certos objetos cortam ao toque. E talvez seja isso que torna este um livro especial: a capacidade de transformar o íntimo numa reflexão que ultrapassa a personagem e ecoa no leitor. Ao fechar o livro, permanece a sensação de ter sido conduzido por uma voz que não se limita a contar uma história, mas que, ao fazê-lo, nos confronta com a nossa própria cartografia de perdas, silêncios e nostalgias.

Corominas (2024). Dorian Gray. Lisboa: LEVOIR. 

Tradução: Sandra Alvarez
N.º de páginas: 104
Início da leitura: 12/11/2025
Fim da leitura: 13/11/2025

**SINOPSE**
"De visita ao seu amigo pintor Basil Hallward, Lord Henry conhece o jovem Dorian Gray, cujo retrato Basil acabou de pintar. Espantado com a sua beleza juvenil e ingenuidade, rapidamente faz amizade com ele e brinca que, uma vez terminado o retrato, só ele conservará a sua beleza para sempre, enquanto Dorian envelhecerá gradualmente.

O jovem declara que daria a sua alma para que o retrato envelhecesse no seu lugar. Perante estas palavras, toda a gente riu... no momento. Um erro fatal, porque o seu desejo será realizado: o aristocrata inglês poderá certamente permanecer eternamente jovem, mas este desejo tem um custo: é o retrato que envelhecerá no seu lugar, gradualmente marcado pelos anos, vícios e crimes."
Acredito que não seja fácil adaptar um drama como este em Banda Desenhada, mas, o que é certo é que senti que o estilo enfático e teatral de Óscar Wilde se consegue encontrar nesta novela gráfica. Apresenta-nos uma 
reinterpretação fascinante do clássico, mantendo a essência da obra original e, ao mesmo tempo, adaptando-a, em termos visuais, através de ilustrações que captam bem a essência sombria e melancólica da história. 
Dorian Gray, na adaptação de Corominas, é retratado como um jovem belo e encantador, uma figura quase etérea que, inicialmente, é pura e inocente. Acaba por se deixar corromper pelas influências de Lorde Henry, que lhe ensina a ideia da procura do hedonismo, a falta de arrependimento e o ignorar das consequências morais das suas ações. Dorian não envelhece, mas o retrato pintado por Basil Hallward torna-se o reflexo do seu interior, envelhecendo e absorvendo as marcas da sua decadência moral. Esta representação física do seu interior depravado está no centro da obra. 
Dorian é uma personagem com que não me identifico e que considero de um egoncentrismo pior que o de Narciso. Não contempla o seu retrato na água, mas observa-se no seu retrato, oferecendo a sua alma em troca da eterna juventude. Porém, reconheço a moral transmitida através desta personagem.

Sukegawa, Dirian (2025). Os Gatos de Shinjuku. Lisboa: Edições ASA.

Tradução: Ana Marta Caio
N.º de páginas: 224
Início da leitura: 08/11/2025
Fim da leitura: 11/11/2025

**SINOPSE**
"No coração de Tóquio, o bairro de Shinjuku resiste à proliferação de arranha-céus e à azáfama da vida moderna. Neste pequeno mundo de ruínas sublimes e lanternas coloridas, encontra-se um bar chamado Karinka, abrigo de eleição de pessoas excêntricas e gatos vadios. É aqui que dois jovens se conhecem: Yama, um argumentista de televisão daltónico; e Yume, a tímida empregada de mesa e protetora dos muitos felinos da zona. À medida que estes dois seres solitários ganham a confiança um do outro, a amizade parece tornar-se em algo mais profundo, mas o passado de Yume teima em não ficar para trás...

A exuberância das noites de Tóquio é o pano de fundo de Os Gatos de Shinjuku, uma história feita de encontros - humanos e felinos -, vidas intrincadas, poesia palpitante e redenção. Terno e original, é um romance inesquecível."
Situado no bairro muito frequentado e, por vezes, cruel de Shinjuku, em Tóquio, o romance conduz-nos por ruas onde se cruzam sonhos desfeitos, vidas à margem e pequenos gestos de bondade que resistem à indiferença. Sukegawa tem o dom de transformar o quotidiano urbano em poesia, uma poesia discreta, que se insinua nas entrelinhas e nas pausas do texto.

O livro aborda temas complexos: a empatia como forma de resistência, os amores impossíveis que nascem em contextos adversos, e a violência silenciosa das relações de poder, sobretudo no mundo laboral. No entanto, o autor nunca cede ao melodrama nem à moralização. A dor está presente, mas é tratada com uma doçura que nunca é ingénua. É precisamente nessa tensão entre a dureza da realidade e a suavidade da linguagem que reside a beleza da obra.

Os “gatos” do título funcionam como metáfora dos próprios protagonistas: seres livres e vulneráveis, que procuram um lugar de pertença num mundo que parece sempre prestes a expulsá-los. Há algo de profundamente universal nesta procura por abrigo e afeto.

A escrita de Sukegawa é poética, mas nunca excessiva. Cada frase parece cuidadosamente medida, como se o autor procurasse o equilíbrio entre a leveza do haiku e a densidade da prosa contemporânea. O resultado é uma leitura que se desenrola com a serenidade de uma canção triste, dessas que ecoam muito depois de terminarem.
Gostei!

Farré, Gemma Ventura (2025). A Lei do Inverno. Lisboa: Alma dos Livros.

Tradução: Rita Custódio
N.º de páginas: 112
Início da leitura: 07/11/2025
Fim da leitura: 08/11/2025

**SINOPSE**
"A Lei do Inverno é um convite a reconhecer a beleza dos laços intangíveis, a aceitar o ciclo da perda e a escutar o murmúrio daqueles que nos guiam, mesmo quando já partiram.

No silêncio suspenso do inverno, quando as cerejeiras se despem e a casa se enche de suaves ecos, uma jovem vela o avô. Em profunda solidão, discorre entre a memória e a imaginação, descobrindo que as presenças mais profundas são, por vezes, feitas de ausência.

Gemma Ventura Farré tece uma ode delicada ao invisível — aquilo que não se vê, mas que permanece: as vozes que nos sussurram ao ouvido, o amor que resiste ao tempo, a saudade que ilumina os dias e a forma como superamos cada ausência.

Num registo íntimo e mágico, esta é uma história destinada a tocar quem a lê. Celebra a delicadeza, a força do coração e o poder da imaginação, e recorda-nos de que, para renascer, é necessário, antes de mais, deixar ir."
Quando comecei a ler este livro, não sabia exatamente o que esperava, apenas me apercebi de que falava da morte, que nos é dada inclusive pelo título, uma vez que o inverno simboliza a morte. Sabia, contudo, dado o tema, que seria um livro difícil de ler e pesado. Mas não, foi uma leitura que me surpreendeu, pela tranquilidade com que a morte é encarada, como se fosse um fechar de pálpebras do inverno. A capa é encantadora, pelo que recorri a ela em muitas passagens. Por vezes, tenho necessidade de ir revendo a capa para pensar na própria história narrada.

A história nasce do gesto íntimo de uma jovem que vela o avô. O cenário é minimalista e, nele, imperam o frio, o silêncio, a casa, o corpo ausente (e é precisamente neste vazio que se faz o eco da memória). A narradora mergulha nas suas lembranças e nas das gerações que a antecederam, num movimento que transforma o luto em genealogia afetiva. As presenças que a rodeiam são feitas de ausências; as vozes, de silêncios. Farré constrói assim uma narrativa que é menos sobre acontecimentos e mais sobre perceções, sobre o modo como o tempo e a morte moldam a nossa identidade e o nosso olhar sobre o mundo.

A linguagem é de uma beleza subtil e profundamente poética. Cada frase parece escrita com a cadência de um poema em prosa, onde o ritmo e a imagem ganham mais peso do que a própria ação. Essa escolha estilística confere à leitura uma leveza inesperada, como se o lirismo fosse uma forma de salvação perante a finitude. 

Aconselho! 

 Rulfo, Juan. Pedro Páramo. Lisboa: Cavalo de Ferro, 2017.

Tradução: Rui Lagartinho e Sofia Castro Rodrigues

N.º de páginas: 147

Início da leitura: 05/11/2025

Fim da leitura: 07/11/2025

**SINOPSE**

"«Álvaro Mutis subiu, a passos largos, os sete pisos da minha casa com um pacote de livros, separou do monte o mais pequeno e curto e disse-me, morto de riso:
— Leia isto, carago, para que aprenda!
Era Pedro Páramo.
Nessa noite não consegui adormecer enquanto não terminei a segunda leitura. Nunca, desde a noite tremenda em que li A Metamorfose, de Kafka, numa lúgubre pensão para estudantes em Bogotá — quase dez anos antes —, eu sofrera semelhante comoção (…).
Não são muito mais de 300 páginas, mas são quase tantas, e creio que tão perduráveis, como aquelas que conhecemos de Sófocles.»
Do texto introdutório de Gabriel García Márquez, Prémio Nobel de Literatura

A obra de Juan Rulfo influenciou de forma decisiva autores distinguidos com o Prémio Nobel de Literatura, como Gabriel García Márquez e Octávio Paz."
Ler Pedro Páramo é entrar num labirinto de ecos, vozes e sombras. A breve, mas densa, narrativa de Juan Rulfo transporta-nos para Comala, uma aldeia mexicana fustigada pelo calor e pela memória, onde a fronteira entre os vivos e os mortos se dissolve num murmúrio constante. É nesse espaço espectral que acompanhamos Juan Preciado, um jovem que parte à procura do pai que nunca conheceu, o temido e enigmático Pedro Páramo. Contudo, o que parecia ser uma viagem de reconciliação, transforma-se num mergulho no irreal, num mundo em que o tempo se fragmenta e as almas se confundem.
Rulfo constrói Comala como um lugar suspenso, onde a morte não significa esquecimento, mas antes uma persistência da culpa e do desejo. À medida que Juan percorre as suas ruas, apercebemo-nos de que os habitantes não são verdadeiramente vivos: são vozes presas num ciclo de arrependimento e lembrança. A revelação de que todos estão condenados a permanecer em Comala, não apenas por conhecerem Pedro Páramo, mas por serem cúmplices, vítimas ou reflexos da sua tirania, confere à narrativa uma dimensão quase bíblica, em que o castigo e a redenção se confundem.
O elemento que une estas personagens é, de facto, o mais fascinante da obra: a condenação à repetição e à solidão eternas. Rulfo não oferece saídas nem consolações; o leitor, tal como Juan Preciado, afunda-se na atmosfera sufocante de Comala, sentindo o peso de um passado que nunca se extingue. A ausência de linearidade reforça essa sensação de desorientação. Os acontecimentos sobrepõem-se, as vozes misturam-se, e o tempo torna-se circular, como se estivéssemos presos na própria respiração da terra.
Essa estrutura fragmentada pode, à primeira leitura, causar estranheza, mas é precisamente ela que dá à obra a sua força poética. A linguagem de Rulfo é seca e fulgurante, marcada por um lirismo contido que traduz a aridez do cenário e das emoções. A simplicidade do estilo contrasta com a complexidade simbólica da narrativa, fazendo de Pedro Páramo uma das obras fundadoras do realismo mágico latino-americano, anterior até à consagração do género por Gabriel García Márquez.
No fim, a viagem de Juan Preciado é também a do leitor: uma travessia para um território onde a memória se confunde com o sonho, e onde a morte não é um fim, mas um estado de permanência. Pedro Páramo não é apenas um romance sobre um homem e o seu poder, é um retrato de um país, de uma cultura e de uma humanidade presa aos fantasmas do passado.
Seja lido como alegoria, mito ou lamento, o livro de Rulfo é uma experiência literária inesquecível: uma viagem sem volta ao coração do México e da própria condição humana. Não é um livro indicado para quem prefere leituras mais "leves".

Torrado, António: Pimentel, Tiago (2016). Milagre de Natal. Lisboa: Edições ASA.

Início e fim da leitura: 04/11/2025

**SINOPSE**

"O que para o Pai Natal foi um azar - a aterragem acidentada do seu trenó e, consequentemente, uma pilha de presentes espalhados pelo chão - para um menino e para um certo cãozinho de orelhas caídas foi uma grande sorte. Ou, mais do que isso, foi um verdadeiro milagre de Natal!"

Milagre de Natal, escrito por António Torrado e ilustrado por Tiago Pimentel, é um conto que se inscreve na tradição das histórias natalícias que procuram despertar a empatia e o sentido de solidariedade. A narrativa, aparentemente simples, centra-se num pequeno cão que, na véspera de Natal, se deixa encantar pelas luzes e sons da cidade e acaba por se perder do seu lar. A partir desse momento, o leitor é conduzido por um percurso de solidão e desamparo, vivido através do olhar inocente e confuso do animal, uma perspetiva que, mais do que infantil, é profundamente humana.
O texto de António Torrado, conhecido pela sua sensibilidade e capacidade de falar aos leitores de todas as idades, combina ternura e crítica social. Ao colocar o leitor na pele de um ser indefeso e esquecido em plena azáfama natalícia, o autor denuncia, de forma subtil, o egoísmo e a distração de uma sociedade que, mesmo em tempo de celebração e fraternidade, se esquece de olhar para o outro. O “milagre” que o título anuncia não é apenas um evento mágico, mas também a possibilidade de redenção humana, o despertar de um gesto de bondade num mundo apressado e indiferente.
As ilustrações de Tiago Pimentel desempenham um papel essencial na construção emocional do conto. Com traços delicados e cores que oscilam entre o calor do lar e o frio da cidade, as imagens reforçam a dualidade entre o conforto perdido e a esperança de reencontro. Cada página parece convidar o leitor a abrandar o ritmo, a olhar com atenção, a sentir, em perfeita sintonia com o tom poético e reflexivo do texto.
Milagre de Natal é, assim, mais do que uma história para crianças: é uma parábola moderna sobre empatia e compaixão, que nos recorda a importância de estender a mão (ou o olhar) a quem mais precisa. Numa época tantas vezes dominada pelo consumo e pela pressa, este pequeno livro é um apelo silencioso à humanidade e talvez esse seja, afinal, o verdadeiro milagre que António Torrado e Tiago Pimentel nos oferecem.

Lispector, Clarice. Felicidade Clandestina. Rio de Janeiro: Rocco Digital, 2013.

N.º de páginas: 160
Início da leitura: 01/11/2025
Fim da leitura: 03/11/2025

**SINOPSE**

Nesta coleção de vinte e cinco textos, reunimos alguns contos e crônicas publicadas nos livros A legião estrangeira, Para não esquecer e A descoberta do mundo. Temas caros ao universo clariceano estão presentes neste livro: a relação mágica com os animais, a descoberta do outro, as inúmeras possibilidades de se escrever uma história, a presença do inesperado no cotidiano previsível. Nos textos de cunho autobiográfico é possível flagrar, por exemplo, momentos da infância marcados pelos sentimentos mais diversos; da euforia das descobertas ao choque das frustrações, como em “Restos do carnaval” ou em “Cem anos de perdão”.
Felicidade Clandestina é uma das obras mais representativas do estilo de Clarice Lispector, tanto por seu caráter introspetivo e psicológico, quanto pela sensibilidade com que a autora trata as pequenas experiências humanas. Publicado em 1971, o livro reúne vinte e cinco contos e crónicas que, apesar de independentes entre si, formam um mosaico da alma humana, com as suas contradições, desejos e descobertas.
A escrita de Clarice transcende as fronteiras entre conto, crónica e ensaio, revelando uma autora que não se submete às convenções literárias. Em vez de narrativas lineares e centradas em ações externas, as suas histórias mergulham nos fluxos mentais e emocionais dos personagens. A ênfase está no instante revelador, a chamada epifania, momento em que a personagem experimenta uma súbita compreensão da realidade ou de si mesmo. Essa estratégia literária confere à obra um tom filosófico e existencial, aproximando a autora de correntes como o existencialismo e a psicanálise.
Ao longo da obra, Clarice demonstra um domínio raro da linguagem. A narrativa é fragmentada, poético, às vezes enigmática, mas profundamente humana. O leitor é convidado a participar ativamente da construção do sentido, não havendo respostas prontas, apenas caminhos possíveis. Essa abertura interpretativa faz com que cada leitura se torne única, dependente da própria sensibilidade de quem lê.
Além da análise psicológica e existencial, Felicidade Clandestina também revela um olhar atento às relações humanas, especialmente às femininas. As personagens, frequentemente mulheres, enfrentam dilemas ligados à identidade, à maternidade, ao amor e à solidão, num retrato subtil da condição feminina no século XX. Aconselho.

Barral, Nicolas (2025). O Desassossegado Senhor Pessoa. Lisboa: Levoir.

N.º de páginas: 144
Início da leitura: 22/10/2025
Fim da leitura: 27/10/2025

**SINOPSE**
"Esta obra foi uma das grandes sensações no mundo da Banda Desenhada em França em 2024 e Candidato aos prémios do festival de banda desenhada de Angoulême 2025, O Desassossegado Senhor Pessoa, é "um retrato comovente de Fernando Pessoa, um dos maiores escritores do século XX".

Simão Cerdeira, um jovem jornalista do Diário de Lisboa é indicado para escrever o obituário de Fernando Pessoa, porque corre o rumor, em Novembro de 1935, de que o poeta está doente e morrerá em breve. Mas Cerdeira nada sabe sobre o poeta lançando-se numa investigação, percorrendo o seu rasto, entrevistando as principais testemunhas da vida desta enigmática figura.

Ao mesmo tempo, Pessoa prepara a sua morte. Na altura Fernando Pessoa trabalhava nos textos do Livro do Desassossego, do heterónimo Bernardo Soares. Esta obra tem um posfácio e tradução de Ricardo Belo de Morais, escritor, investigador e especialista em Fernando Pessoa.

Dizem que Pessoa tinha um baú cheio de milhares de textos, uma espécie de caixa de correio onde todos esses escritores vinham regularmente deixar os seus manuscritos. Um baú cheio de pessoas que talvez só existam na imaginação do seu dono."
Fernando Pessoa é, sem dúvida, uma das figuras mais enigmáticas da literatura portuguesa. Sou uma fã incondicional da sua poesia e dos seus heterónimos, bem como de Pessoa ortónimo.
O Desassossegado Senhor Pessoa, de Nicolas Barral, é uma novela gráfica que nos conduz pelos últimos dias de vida do poeta, cruzando-os com a história de um jornalista que foi incumbido de escrever o seu obituário. É precisamente nesta premissa que reside grande parte do encanto da obra: o autor consegue transportar-nos para dentro do universo pessoano, permitindo-nos sentir que, ao fechar o livro, sintamos um Pessoa mais próximo, menos etéreo.
O final é particularmente comovente. Mostra-nos um homem esgotado, fragmentado entre as suas múltiplas vozes e personalidades, tentando dar sentido ao mundo através da criação (que se revoltam, a certa altura, com Pessoa, pois acham que têm voz própria e que ele abafa as suas vozes na literatura. É o retrato de uma existência marcada pelo peso do pensamento e por uma solidão que, em parte, foi escolhida, talvez como forma de se proteger da complexidade dos outros. 
O Desassossegado Senhor Pessoa é, assim, uma leitura belíssima e introspetiva, uma homenagem delicada e inteligente, que nos convida a olhar para Pessoa não como mito, mas como homem — frágil, contraditório e profundamente humano.

Lawhon, Ariel (2025). Rio de Gelo. Liaboa: Cultura Editora.

Tradução: Paula Antunes
N.º de páginas: 512
Início da leitura: 24/10/2025
Fim da leitura: 27/10/2025

**SINOPSE**
"Maine, 1789. Quando o rio Kennebec congela e devolve o corpo de um homem, Martha Ballard é chamada a examiná-lo. Parteira e curandeira respeitada, Martha conhece como ninguém os segredos que se escondem por detrás das portas fechadas de Hallowell. Regista-os com precisão no seu diário: nascimentos, mortes, crimes, escândalos.

Meses antes, anotara o testemunho de uma jovem que acusava dois homens influentes da cidade de violação. Agora, um deles aparece morto, enterrado no gelo. Quando um médico local desmente as suas conclusões e declara a morte como acidental, Martha recusa-se a aceitar o silêncio e decide investigar por conta própria.

Rio de Gelo dá voz a uma mulher determinada e corajosa, numa época em que as mulheres eram esperadas para escutar, não para falar.

Baseado na vida e no diário real de Martha Ballard, parteira do século XVIII, este é um mistério histórico envolvente sobre justiça, coragem e memória — e sobre como algumas histórias se recusam a desaparecer."
Rio de Gelo, de Ariel Lawhon, é um daqueles romances que nos conquistam logo nas primeiras páginas e não nos largam até ao fim. Inspirado em várias histórias reais, o livro entrelaça factos e ficção de forma magistral, criando uma narrativa intensa, emotiva e profundamente humana. A autora tem uma escrita envolvente, capaz de transportar o leitor para dentro da história, fazendo-nos sentir parte das vidas e dos dilemas das personagens.

Trata-se de um romance que combina de forma equilibrada elementos de crime, mistério e thriller, sem nunca perder a dimensão emocional que o torna tão marcante. Ao longo das páginas, são abordados temas difíceis e profundamente reais, como os partos em casa, a violação, os filhos nascidos dessas situações traumáticas, a busca por justiça, o amor e a importância da família. Tudo isto é feito com uma sensibilidade notável, sem recorrer ao sensacionalismo, mas antes com uma empatia que nos faz refletir sobre as várias formas de resistência e esperança humanas.

É, sem dúvida, uma leitura intensa e memorável, um excelente exemplo de como a ficção pode dar nova vida às histórias do passado, tornando-as universais e profundamente tocantes. Rio de Gelo é um livro que se sente tanto quanto se lê, e que permanecerá connosco muito depois de fecharmos a última página.

Velho, Susana Amaro (2025). As Últimas Linhas Destas Mãos. Lisboa: Casa das Letras

N.º de páginas: 256
Início da leitura: 20/10/2025
Fim da leitura: 23/10/2025

**SINOPSE**
Depois da morte da mãe, Teresa herda um caixote de cartas antigas, fotografias sem data e pequenos objetos de valor insignificante. Escritas ao longo de décadas por uma mulher que assina com o mesmo nome da mãe, Alice, mas que fala de amores clandestinos, lugares que a filha não reconhece, de despedidas que parecem dirigidas a alguém que não ela.

Nas entrelinhas dessas palavras, começa a desenhar-se uma história paralela à que lhe foi contada, à que viveu, àquela a que tentou a custo sobreviver: feita de omissões, de vidas vividas à margem do possível, uma narrativa subterrânea que emerge em frases soltas, por vezes, desconcertadas, que despem uma desconhecida. 

No regresso à casa da infância, Teresa procura reconstituir a figura da mãe: quem foi esta mulher antes de se deixar domesticar, antes de ceder o corpo e a linguagem ao papel de esposa e mãe?

Na ressonância das cartas que percorre, Teresa descobre o que acontece quando o amor não cabe na vida que se escolheu viver. 
Há livros que nos tocam de forma subtil, quase silenciosa, e há outros que nos agarram pela força das palavras, pela intensidade das emoções e pela delicadeza com que abordam temas universais. Esta obra de Susana Amaro Velho, pertence claramente a esta segunda categoria. Desde as primeiras páginas senti-me rendida à escrita da autora. Há nela um dom raro de contar histórias fortes num tom poético e cuidado, que nos envolve e nos faz ler devagar, saboreando cada frase.

O romance mergulha nas águas profundas do luto, do abandono e do amor impossível, temas que poderiam facilmente cair no dramatismo excessivo, mas que aqui são tratados com uma elegância contida, quase musical. O ritmo das palavras, a escolha das imagens e a sensibilidade da narrativa revelam uma escritora que conhece bem o poder da linguagem e o usa para nos aproximar da fragilidade humana.

Um dos aspetos que mais me encantou foi a estrutura narrativa. As diferentes personagens assumem, de forma alternada, a voz da narração, oferecendo-nos múltiplos pontos de vista sobre os mesmos acontecimentos. Essa alternância não só enriquece a história, como nos permite compreender melhor as motivações, os silêncios e as feridas de cada um. É um exercício de empatia que desafia o leitor a olhar para o mundo com mais profundidade e menos certezas.

As últimas linhas destas mãos é, acima de tudo, um livro sobre a persistência da memória e sobre a forma como o amor, mesmo quando impossível, continua a marcar presença nas nossas vidas, transformando-se em palavras, em gestos e, talvez, nas “últimas linhas” que nos restam escrever. Susana Amaro Velho confirma, com esta obra, a sua voz singular no panorama literário contemporâneo português: sensível, intensa e profundamente humana.

Baldini, Laura (2025). Um Sonho de Beleza. Lisboa: Alma dos Livros.
Tradução: Beatriz Cadete
N.º de páginas: 328
Início da leitura: 17/10/2025
Fim da leitura: 19/10/2025

**SINOPSE**
"A história de Estée Lauder, a mulher extraordinária que transformou o seu sonho numa marca mundial. Ela não seguiu as tendências. Criou-as.
«Com os perfumes é como no amor. Um pouco nunca é suficiente.» — Estée Lauder
Nova Iorque, 1928. A jovem Esty começa a misturar cremes artesanais no quintal do tio. Apaixonada por fragrâncias e determinada a criar algo único, desenvolve os seus próprios cremes. Estas primeiras criações, ainda embaladas em frascos de compota, são vendidas pela própria na praia, apenas com uma pequena mesa desdobrável e um sonho maior do que o mundo. As suas primeiras clientes ficam maravilhadas! É o início de um percurso notável.
Determinada a deixar a sua marca no mundo da cosmética, Esty assume o nome Estée, muda-se do bairro operário de Queens para o coração sofisticado de Manhattan, e luta por conquistar um lugar nos balcões do luxuoso armazém Saks na Quinta Avenida.
Com ideias revolucionárias para a época — como oferecer amostras grátis para conquistar clientes — e uma dedicação incansável, rapidamente se torna uma referência no universo da beleza.
Mas todo o sucesso tem um custo. As exigências da sua carreira ameaçam afastá-la do homem que ama."
Um Sonho de Beleza, de Laura Baldini, é uma biografia romanceada de Estée Lauder, a mulher que revolucionou o mundo da cosmética e construiu um império, quando o papel das mulheres ainda era rigidamente limitado ao espaço doméstico. O livro destaca-se pela forma como retrata a ambição, a coragem e a perseverança de Estée, mostrando uma mulher determinada a alcançar os seus objetivos profissionais num contexto em que tal ousadia era vista quase como uma afronta.
Ao longo da narrativa, acompanhamos não só a sua ascensão no mundo dos negócios, mas também os desafios da sua vida pessoal, marcada por escolhas pouco convencionais para a época. É particularmente interessante (e por vezes desconcertante) ver como o marido de Estée assume o papel de ficar em casa com o filho, enquanto ela se dedica inteiramente à carreira e ao crescimento da marca. Esta inversão dos papéis tradicionais é um dos aspetos mais fascinantes do livro, pois evidencia a visão à frente do seu tempo de Estée Lauder e, ao mesmo tempo, o quanto foi incompreendida por quem a rodeava.
Apesar de admirar a sua força e determinação, confesso que nem sempre apreciei a sua personalidade, sobretudo quando se deixa influenciar por comentários alheios, especialmente de clientes que a criticam por ter um marido “dependente” e “sem ambição”. Nestes momentos, a personagem parece perder um pouco da sua segurança e da coerência que a tornam inspiradora. Ainda assim, esta fragilidade também contribui para a tornar mais humana e real, lembrando-nos de que até as figuras mais fortes enfrentam dúvidas e pressões sociais.
A escrita de Laura Baldini é envolvente e fluida, conseguindo equilibrar o rigor biográfico com um tom intimista e emocional que prende o leitor. A autora conduz-nos com leveza pelos bastidores da criação de uma marca lendária, sem nunca perder de vista a mulher por detrás do sucesso - ambiciosa, imperfeita, visionária.

Dazai, Osamu (2023). Um Homem em Declínio. Lisboa: Editorial Presença.

Tradução: Manuel Alberto Vieira
Nº de páginas: 160
Início da leitura: 15/10/2025
Fim da leitura: 17/20/2025

**SINOPSE**
"«A minha vida foi marcada pela vergonha. Não consigo sequer imaginar como será viver a vida de um ser humano.»

Yozo vê-se como um verdadeiro fracasso. A sua vida - a que ele mesmo nos narra - quase pode parecer normal, mas a incapacidade que sente em perceber os outros seres humanos é absolutamente dilacerante.

Desde muito cedo, Yozo viu crescer esse fosso entre si e o resto do mundo. Na adolescência, tenta sobreviver tornando-se o palhaço da escola, mas a máscara que usa para camuflar a sua alienação cai quando a tentativa de suicídio, já na vida adulta, sai gorada.

Não dando espaço ao sentimentalismo e sem conceder ao drama o que permite à dor crua, Yozo regista, nestas páginas, a crueldade dos dias, mas, do mesmo modo, os raros momentos em que se sente ligado aos outros, em que a ternura representa um vislumbre de vida humana.

Com claros traços autobiográficos, Um Homem em Declínio é o derradeiro e mais importante romance de um dos grandes escritores japoneses do século XX, Osamu Dazai. Sobre ele, muitos escreveram tratar-se de um símbolo de uma geração, a que deixava a guerra para trás e via já os alvores de uma sociedade pós-moderna. É, sem sombra de dúvidas, um brutal e íntimo retrato da alienação individual."

Esta é uma obra profundamente introspetiva e angustiante, que mergulha na psicologia do protagonista, Yozo Oba. O livro segue a jornada de Yozo, um homem profundamente atormentado com a sua própria identidade e incapaz de se conectar verdadeiramente com os outros. Dazai constrói uma narrativa marcada por uma sensação de desconforto existencial, onde Yozo luta com a sua própria alienação e com o conceito de identidade, refletindo as suas falhas, os seus medos e os seus momentos de auto destruição.

A obra é marcada por uma escrita perturbadora, mas de grande profundidade emocional, na qual o protagonista reflete sobre as convenções sociais e sobre a sua incapacidade de se encaixar nelas. Através de suas anotações, vemos não apenas o declínio físico e psicológico de Yozo, mas também o desespero de uma pessoa que sente que não há sentido em suas ações ou na sua própria existência.

O estilo de Dazai, frequentemente descrito como desesperançado e melancólico, cria uma atmosfera tensa e densa, mas também profundamente humana. A forma como ele explora o sofrimento psicológico e a alienação é uma das forças do livro, tornando-o, quanto a mim, uma obra importante dentro da literatura japonesa.
É um livro ideal para quem aprecia histórias reflexivas que abordam a complexidade da mente humana e as dificuldades existenciais. Gostei muito e recomendo.

Sans Segarra, Manuel; Cebrián, Juan Carlos (2025). A Supranconsciência Existe, Vida Depois da Vida. Lisboa: Planeta de Livros.

N.º de páginas: 232
Início da leitura: 12/10/2025
Fim da leitura: 15/10/2025

**SINOPSE**
"O médico Manuel Sans Segarra, prestigiado cirurgião e pioneiro na investigação da Supraconsciência, em colaboração com o jornalista e empreendedor Juan Carlos Cebrián, explora as Experiências de Quase Morte (EQM) à luz de não só uma ótica científica, inspirada na neurociência e física quântica, como também de uma perspetiva espiritual.

Através de relatos reais, este livro revela uma nova compreensão sobre a consciência humana e a vida depois da morte, desafiando todas as conceções tradicionais de existência e criando um guia poderoso para superarmos os nossos medos e refletirmos sobre a nossa vida.

O livro definitivo sobre o fenómeno das Experiências de Quase Morte e o seu poder para transformar as nossas vidas."
A Supraconsciência Existe – Vida Depois da Vida, de Dr. Manuel Sans Segarra e Juan Carlos Cebrián, foi, para mim, uma leitura completamente fora da minha zona de conforto. O tema — a existência de uma consciência superior e a possibilidade de vida após a morte — é, por si só, desafiante, especialmente quando não nos movemos habitualmente neste tipo de reflexão entre a ciência, a espiritualidade e a filosofia.
Tendo em casa uma situação semelhante às descritas no livro, entre experiências-limite e a procura de sentido perante o fim da vida, aproximei-me destas páginas com curiosidade, mas também com alguma expectativa de encontrar respostas — ou, pelo menos, novas perspetivas. No entanto, talvez por ignorância minha ou, simplesmente, porque não há ainda nada de facto cientificamente provado, acabei por sentir esta leitura como algo distante, demasiado filosófica e, por momentos, até aborrecida.
Os autores esforçam-se por conciliar a linguagem médica e científica com uma dimensão espiritual que procura transcender o físico, mas o resultado, a meu ver, fica num território ambíguo. Fala-se muito sobre energia, consciência e eternidade, mas sem o suporte empírico que um leitor mais racional pode esperar — e, sem isso, a mensagem perde força.
Ainda assim, reconheço o mérito da tentativa. É um livro que pode tocar profundamente quem já tenha refletido sobre o tema, ou quem procure um olhar mais espiritual sobre a existência. Para mim, no entanto, ficou a sensação de não ter encontrado respostas — talvez porque, no fundo, essas respostas ainda não existem, ou pertencem a um plano onde a ciência e a fé raramente se encontram.

Branco, Francisco; Alves, Roberto Macedo e Sousa, Válter (2025). Camões (Re)visitado. Funchal: Sétima Dimensão.

N.º de páginas: 98
Início da leitura: 12/10/2025
Fim da leitura: 15/10/2025

**SINOPSE**
"Camões (Re)Visitado é uma obra que apresenta uma abordagem contemporânea da figura de Luís de Camões, visando torná-lo mais acessível e relevante para os leitores mais jovens e para todos os que desejam redescobrir a sua obra.

Esta banda desenhada, que combina literatura, artes visuais e pedagogia, explora as várias dimensões do poeta e da sua obra através de diferentes expressões artísticas, destacando a sua presença no imaginário português e a sua influência na cultura lusófona.

Camões (Re)Visitado é um convite a mergulhar na vida e na obra de Camões, oferecendo uma nova perspetiva sobre o poeta e o seu legado, e reforçando a sua importância na identidade cultural portuguesa."
Esta novela gráfica, concebida para celebrar o quinto centenário de Luís Vaz de Camões, parte de uma história atual em que um jovem, Martim, é interpelado pelo próprio poeta após uma apresentação desastrosa, em Lisboa. Este jovem, comparado a um perdigão que “perdeu a pena”, acaba por encontrar o espírito de Camões, que o vai interrogando ao longo da narrativa, desafiando-o e levando-o a crescer espiritualmente.
Ao longo desse diálogo entre épocas e consciências, Martim aprende o verdadeiro sentido de valores como a resiliência, a criatividade e o poder da obra que perdura no tempo. O encontro entre o jovem e o poeta transforma-se, assim, numa viagem interior de descoberta e inspiração, que ultrapassa a simples homenagem histórica.
Camões (Re)Visitado revela-se, deste modo, uma forma diferente e atual de celebrar o autor de Os Lusíadas: uma presença ousada, que mistura o clássico e o contemporâneo, e que poderá inspirar novas gerações a olhar o legado camoniano com um inovo "olhar". Há, é certo, algumas correções ortográficas de que o texto ainda carece, mas nada que não possa ser melhorado numa próxima edição.

Montes, Raphael (2025). Suicidas. Lisboa: Cultura Editora.

N.º de páginas: 384
Início da leitura: 10/10/2025
Fim da leitura: 13/10/2025

**SINOPSE**
"Ainda antes de o mundo sonhar com o terrível jogo da baleia azul, que leva jovens a tirar a própria vida, ou que a série de televisão Thirteen Reasons Why se tornasse conhecida, Raphael Montes, então com 22 anos, já tratava do tema do suicídio entre jovens, com a ousadia que virou a sua marca registada.

Neste seu primeiro livro, que a Cultura edita depois dos sucessos Jantar Secreto e Uma Família Feliz, conhecemos a história de Alê e seus companheiros, jovens da elite do Rio de Janeiro encontrados mortos na quinta de um deles em condições que indiciam que os nove amigos haviam participado num jogo de roleta-russa.

O que terá levado aqueles adolescentes, aparentemente felizes e privilegiados, a tirar a própria vida?

A inspetora Diana Guimarães terá de juntar as peças de um puzzle sangrento e de convocar as mães dos suicidas para compreender o que aconteceu.

Do autor de Beleza Fatal e de Bom Dia, Verônica, séries da Max e da Netflix."
Como acontece com os restantes livros de Raphael Montes que já li, Suicidas confirma, mais uma vez, a capacidade do autor de nos surpreender e de nos prender irremediavelmente à narrativa. Montes tem o dom de explorar o lado mais sombrio da mente humana e de o fazer com uma crueza desarmante, sem filtros nem complacência.
Não é, de todo, uma leitura fácil. É um livro que exige estômago, que desafia o leitor a enfrentar a violência e a degradação moral que se escondem sob a superfície de uma juventude aparentemente banal. O autor constrói um thriller intenso, sangrento, quase claustrofóbico, que nos obriga a encarar o que há de mais desprezível - e, simultaneamente, de mais real - no ser humano.
O enredo, centrado num pacto macabro entre jovens que decidem pôr fim às suas vidas, não é apenas um exercício de horror psicológico. É também um espelho desconfortável da nossa sociedade contemporânea, marcada pelo vazio existencial, pela pressão do sucesso e pela incapacidade de lidar com a dor e o fracasso. Suicidas é, assim, uma chamada de atenção, que nos recorda o quão frágil pode ser a linha entre o desespero e a autodestruição.
Raphael Montes escreve com uma precisão quase cirúrgica: cada detalhe, cada diálogo, cada descrição contribui para adensar a atmosfera de tensão que domina o livro do início ao fim. Mesmo quando o enredo se torna quase insuportável, é impossível largar a leitura - somos arrastados pela curiosidade, pelo medo, pela necessidade de compreender o porquê de tudo aquilo.
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Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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