Histórias Soltas Presas Dentro de Mim

 Christie, Agatha (2011). Ausente na Primavera. Alfragide: Edições ASA.

Tradução: Maria David Castro
Nº de páginas: 172
Início da leitura: 25/11/2023
Fim da leitura: 26/11/2023

**SINOPSE**
Ao regressar do Iraque, onde foi visitar a filha, Joan Scudamore dá por si sozinha numa pensão isolada. A viagem de comboio foi inesperadamente interrompida, obrigando-a a permanecer no deserto. Esta súbita solidão leva-a a avaliar a sua vida pela primeira vez e a encarar algumas verdades sobre si própria. Ao olhar para trás, Joan reexamina dolorosamente as suas atitudes, relações e ações, e fica cada vez mais apreensiva com a pessoa que lhe é revelada. Decidida a recuperar o tempo perdido, ela está finalmente de volta a Inglaterra e à vida que pretende transformar drasticamente.
Relato intenso da vida emocional de uma mulher, Ausente na Primavera foi, segundo palavras de Agatha Christie, «escrito com integridade, com prazer. O resultado final foi aquele que eu desejava, e isso é a maior alegria que um autor pode ter.»
Desafiada pelo meu grupo de Tertúlias a ler um livro de capa lilás e fora da minha zona de conforto, optei por um livro de uma autora que não lia há cerca de 30 anos. Porém, este é um livro que foge um pouco aos livros policiais que li da autora. E, sem querer, acabei por chegar a um livro dos que realmente gosto. Um livro que nos conduz a uma introspeção, da personagem e nossa. Aos olhos da protagonista, Joan Scudamore, a amiga que reencontra, Blanche Haggard, deve ter uma vida muito triste, pois envelheceu muito, não cuida de si como antes ou como ela própria. Ainda mais pena dela tem, quando sabe que o marido é de uma condição social inferior.
Quando, algum tempo depois, Joan se vê presa numa casa de repouso, num sítio desértico, um hotel para viajantes, e tendo um momento para si e a sós consigo, começa a refletir sobre a sua vida, as suas escolhas, as pessoas que ama e pondera se é realmente feliz, se a sua vida é mais perfeita do que a da amiga. E toma decisões...
Aconselho a quem goste deste género de leitura mais introspetiva.

 Almeida, Maria Inês; Oliveira, José Almeida de (2019). Sem Abrigo. Lisboa: Nuvem de Letras.

Nº de páginas: 32

Início e fim da leitura: 21/11/2023


**SINOPSE**

"Quando eu era pequenino, via pessoas a dormir na rua e achava que estavam ali, noite após noite, porque gostavam muito de olhar para as estrelas. Afinal, descobri que são pessoas como nós, que só querem uma casa, um emprego, uma vida nova.

Espero que, um dia, possam olhar para o céu pela janela de uma casa que seja sua. Porque acredito no Mundo e no coração das pessoas."
Um livro infantil, muito pequenino, mas com uma mensagem muito bonita. Uma forma simples de explicar às crianças o que é um sem abrigo e que cada um de nós pode fazer a diferença na vida de cada pessoa que passou a ter de viver na rua. Aconselho a miúdos e graúdos.
Deixo duas páginas, que falam por si!

 Vecce, Carlo (2023). O Sorriso de Caterina. Alfragide: Casa das Letras.

Tradução: Dinis Pires
Nº de páginas: 552
Início da leitura: 18/11/2023
Fim da leitura: 24/11/2023

**SINOPSE**
"Caterina é uma rapariga selvagem, nascida livre, como o vento. Corre a cavalo pelos planaltos do Cáucaso, ouve as vozes das árvores, dos animais, dos deuses e dos heróis. O seu povo é um povo fora do tempo; a sua língua, a mais antiga e incompreensível do mundo. Até que, um dia, é subitamente arrastada com violência para a História. Capturada em Tana, a última colónia veneziana na foz do Don, inicia uma incrível viagem através do Mar Negro e do Mediterrâneo. Vê as cúpulas douradas de Constantinopla na véspera da conquista turca, vê Veneza erguer-se das águas como num sonho e, finalmente, Florença no esplendor do Renascimento.

Mas não se trata de uma viagem de lazer. Caterina é uma escrava, uma «coisa». A sua existência está agora entrelaçada com a de piratas, soldados, prostitutas, outros escravos como ela, aventureiros e mercadores, homens e mulheres que a compram, revendem ou alugam. A sua história é tão grande, líquida e móvel como o mar que atravessou. A história de uma rapariga a quem roubaram tudo, o seu corpo, os seus sonhos, o seu futuro, mas que foi mais forte. Sozinha, percorreu as estradas do mundo sem medo, sofreu, lutou, amou, recuperou a sua liberdade e a sua dignidade de ser humano. Um dos filhos que deu à luz quando ainda era escrava: Caterina amava-o mais do que a sua própria vida. E sabe que ele a amava da mesma forma, apesar de nunca lho poder dizer, de nunca a poder chamar de mãe, e de ela ter de fingir que ele não era seu filho. A sua felicidade era dar-lhe tudo o que tinha: o seu amor infinito pela vida, pelas criaturas e pela liberdade. O nome dessa criança, todos nós sabemos.

Chamava-se Leonardo. Também a nós, Caterina dá alegria e liberdade, mas pede muito em troca. Acordar-nos, como que de um longo sono, sem sonhos. Abrir os nossos olhos. Compreender que a sua história não é a história de um passado distante e fabuloso. É a história de hoje: de uma estrangeira no último degrau da escada social e humana, de uma mulher que saiu de um barco e veio sabe-se lá de onde, sem voz nem dignidade. É por isso que deve ser contada. Por Caterina. Pelas suas irmãs que morrem no mar que ela atravessou e que sofrem à nossa volta."
Este não é um livro de ritmo frenético, é um romance histórico que nos leva a conhecer Caterina, a mãe de Leonardo Da Vinci, documentado em pesquisas e conversas e muito bem escrito. E é, com efeito, uma incrível história de uma menina livre, de Cáucaso, mas que se torna escrava, quando capturada em Tana. A par de todas as suas aventuras e desventuras enquanto escrava, está também a sua história de amor, da qual nasceu, de entre muitos filhos, Leonardo Da Vinci. É fácil embrenharmo-nos, comover-nos e acompanharmos as personagens, nesta incrível aventura de vida. Já agora, só uma questão: o sorriso de Caterina não vos remete, de alguma forma, para Monalisa? Aconselho a leitura!

Innocenti, Roberto (2018). Rosa Branca. Lisboa: Kalandraka.
Tradução: Carla Maia Almeida
Nº de páginas: 32
Lido no dia 20/11/2023

**SINOPSE**
"Chamo-me Rosa Branca.
Vivo na Alemanha, numa pequena cidade de ruas estreitas,
velhos fontanários e edifícios altos onde os pombos
vêm pousar nos beirais.
Um dia, chegou o primeiro camião e saíram de lá muitos homens
vestidos de soldados.
O inverno estava a começar…

Rosa Branca é uma menina alemã que presencia a detenção de um rapaz por um grupo de soldados. Seguindo o camião onde o transportam, chega à clareira de uma floresta, e aí descobre muitas crianças prisioneiras e esfomeadas que têm uma estrela cosida na roupa. As suas idas e vindas até ao campo de concentração para lhes levar comida às escondidas tornam-se a partir daí contínuas.

Ambientada na Alemanha da Segunda Grande Guerra, o Holocausto serve de pano de fundo a esta obra de Innocenti. Frente à tragédia humanitária e ao belicismo infundado, a figura de Rosa Branca representa a esperança, através dos sentimentos mais puros da infância: bondade, inocência, generosidade e ausência de preconceitos.

As ilustrações hiper-realistas de Roberto Innocenti refletem o movimento histórico que vai do triunfo do Terceiro Reich até à derrota do nazismo. Tal como os fotogramas de um filme, as imagens - expressivas e de enorme detalhe - mostram os cenários da narrativa através de planos e enquadramentos diversos. A protagonista tem simbolicamente o nome de um grupo da resistência alemã contra o regime de Hitler, do qual alguns dos seus membros foram descobertos e executados."
Mais um belíssimo livro que penso destinar-se a jovens a partir do 2º ciclo. As ilustrações são de tal forma detalhadas, que conseguimos sentir a dor dos olhares, das faces, do corpo... Um livro em que as imagens falam mais do que as poucas palavras que tem. Uma história triste, que convém conhecer, dar a conhecer e nunca esquecer! Deixo algumas das ilustrações.





Adams, Sara Nisha (2022). A Lista de Leitura. Lisboa: Topseller.
Tradução: Maria Ferro

Nº de páginas: 400

Início da leitura: 12/11/2023

Fim da leitura: 18/11/2023


**SINOPSE**

"Mukesh leva uma vida pacata num subúrbio de Londres e tenta manter as rotinas estabelecidas pela sua mulher, Naina, que faleceu recentemente. Vai às compras todas as quartas-feiras, frequenta o templo hindu e tenta convencer as três filhas de que é perfeitamente capaz de organizar a sua vida sozinho.

Aleisha é uma adolescente que trabalha na biblioteca local durante o verão e que, curiosamente, não gosta de ler. Até que encontra um papel amachucado dentro de um exemplar de Mataram a Cotovia com uma lista de livros dos quais nunca ouvira falar. Intrigada, e um pouco entediada com o seu trabalho, decide começar a ler os livros aí sugeridos.

Quando Mukesh vai à biblioteca para devolver um dos livros de Naina e pedir outras sugestões de leitura, numa tentativa de criar laços com a neta, Aleisha recomenda-lhe os títulos da lista. É assim que, livro a livro, vão descobrindo a magia da leitura e encontrando novos significados para as suas vidas. E é através destas leituras partilhadas que Aleisha e Mukesh encontram a força necessária para lidar com os desgostos e problemas do dia a dia e reencontram a alegria de viver."

No início, dado o ritmo lento do avanço da narrativa, confesso que comecei a ficar um pouco cansada deste livro. A história só se torna mais entusiasmante a partir do momento em que as vidas de Aleisha e Mukesh se cruzam. Aleisha era até, quanto a mim, uma rapariga com mau feitio, indisposta com tudo e todos, facto que não dava para perceber a razão de trabalhar numa biblioteca. Porém, algo acabará por ser determinante para uma mudança na sua forma de encarar a vida e de se relacionar com os demais e até com a biblioteca: uma lista que encontra, perdida num dos livros e que, em determinado momento, acaba por lhe captar a atenção. Por que não ler os livros sugeridos, à experiência, uma vez que não gosta de ler e nem sequer sabe aconselhar um livro a quem frequenta o seu local de trabalho? Uma dessas pessoas é Mukesh, um idoso que, tendo perdido a mulher, se lembra de que ela gostava muito de ler e que os livros até poderiam constituir uma forma de atenuar a sua solidão. Porém, Aleisha responde-lhe rudemente, não lhe dando a devida atenção. É a lista que vai mudar tudo. E muda, com efeito, a vida de muitas pessoas. Às vezes, sabe bem sair dos registos rápidos, pois, para frenética, já basta a própria vida!
Gostei também da lista da própria autora, que deixa no final do livro.
Um livro doce, de ritmo lento mas que acaba por cativar, especialmente pelo facto de ir associando os livros listados a determinados momentos da vida das personagens. Um enredo inteligente e uma escrita irrepreensível. Aconselho!

 Fortes, Antón (2009). Fumo. Lisboa: OQO PT
Nº de páginas: 36

Início da leitura: 16/11/2023

Fim da leitura: 16/11/2023

**SINOPSE**

"Tanto como os campos de concentração — com o que implicam de fome, frio, doença, violência e morte — interessa aqui um desses mundos pessoais e familiares que o nazismo destruiu, e que é das poucas coisas que tem cor frente ao cinzento cortante e ao silêncio.


Separação, solidão e saudade estão omnipresentes; a lembrança ajuda a fugir do isolamento e do desterro, e dá lugar — no inóspito do campo (lager) — ao amor, à amizade e à solidariedade: à humanidade, ao fim e ao cabo.

Se toda a violência está injustificada, a que põe fim à inocência ainda mais; contra ela, no processo de amadurecimento do protagonista, assistimos a um compromisso até à fusão com Vadío (única personagem com nome e etnia), que representa o reconhecimento no outro na catarse final.

O protagonista anónimo de Fumo descobre a realidade, mas filtra-a com a memória de um passado melhor. O despertar magoa-o e leva-o a uma aprendizagem rápida: a dureza e dificuldade da situação, e o instinto de sobrevivência obrigam-no a ser um menino responsável.

A inocência, mais que a impotência, marca o desenlace. Os inocentes não sobrevivem, dizia o Primo Levi; é o preço por ver a luz: a mão de Vadío apagando para sempre o medo e escrevendo com fumo uma palavra mágica sobre o céu da Polónia.

Uma comovente história de Antón Fortes com intensas imagens da polaca Joanna Concejo, de grande sensibilidade e beleza, apesar de reflectir a realidade do protagonista, que se torna mais dura ao enfrentá-la recorrentemente com lembranças da vida de onde foi ou foram todos arrancados."
Como é que um livro infantil, pequenino, pode ser tão intenso e conter uma mensagem de forma tão tocante? É o caso. Tudo, neste livro, nos abana e nos abala. E, no entanto, é um livro tão bonito, com ilustrações que dizem mais do que muitas palavras e que é preciso olhar com muita atenção e compreender toda a simbologia nelas impressa pela ilustradora conselho Joana. Num contexto de Guerra, vivido num campo de concentração, a amizade de duas crianças será mesmo até ao fim! Impossível não nos comovermos. Recomendo!
O que parece ser um álbum de fotografias, é apenas desenho, mas muito bem feito!

 Lafebre, Jordi (2021). Apesar de Tudo. Estoril: Arte de Autor.

Tradução: Jorge Colaço

Início da leitura: 12/11/2023

Fim da leitura: 15/11/2023


**SINOPSE**

"Uma deliciosa comédia romântica que põe tudo do avesso.

Ana e Zeno são dois amantes platónicos destinados a encontrarem-se à distância, protagonistas de um romance no qual o final é, na verdade, um novo começo. Ela é a Presidente da Câmara de uma pequena cidade de províncias focada no seu trabalho, ele um espírito livre e sonhador difícil de encaixar. A vida parecia empenhada em mantê-los separados... até que a ambos acabam as desculpas para se reencontrarem.

Jordi Lafebre oferece-nos a sua primeira obra a solo, um relato doce e irresistível sobre um par de corações vibrando em uníssono através do espaço e do tempo narrado com a audácia de todo um mestre."
Que novela gráfica tão, mas tão boa, a todos os níveis: enredo, grafismo e ilustrações. Fabulosa!
Este livro tem início com o reencontro de duas pessoas que se amam, Ana e Zeno, passados 37 anos. Não posso deixar de partilhar esta primeira página, que permite ver a qualidade das ilustrações, bem como todo o sentimento que perpassa através do olhar.
Com efeito, é uma obra doce, feita de separações e reencontros. 
E o curioso é que a história nos é apresentada ao contrário. À medida que avança, a narrativa vai recuando cada vez mais, até chegar ao momento em que se conheceram. Mas desse momento não poderei falar. A vida nem sempre permite que se viva um grande amor mas, se esse amor é verdadeiro, estará sempre presente, ainda que platonicamente. É como duas peças que tentam encaixar-se e que até, aparentemente, encaixam nas suas novas vidas, mas não é aquele encaixe perfeito, aquele que permite apagar os contornos do próprio encaixe. Leiam, que é uma verdadeira delícia!

 Couto, Mia (2023). Compêndio para desenterrar nuvens. Alfragide: Editorial Caminho.

Nº de páginas: 144
Início da leitura: 10/11/2023
Fim da leitura: 11/11/2023

**SINOPSE**
"No universo literário de Mia Couto, em que uma coisa, um animal, por exemplo, pode ser uma pessoa, as nuvens, que, com os nossos olhos, vemos circulando pelo céu, podem, se consideradas com a imaginação, existir debaixo da terra. E se é assim, um Compêndio para Desenterrar Nuvens tem para nós a maior utilidade.

Nestes vinte e dois exercícios de imaginação mais uma vez Mia Couto nos serve de guia para descobrirmos o que está no que vemos com os olhos e no que a imaginação nos dá a ver.

E atenção: nem sempre as duas imagens coincidem."
Que livro fabuloso, tão ao jeito de Mia Couto! Este livro reúne contos do autor, publicados na revista Visão,  de entre os quais destaco "A carta sem correio", onde o filho, afastado da mãe, sonha com o dia do reencontro com ela: "Amanhã cumprirei o sonho de me sentar à tua frente e esperar, em silêncio, que me chames sem nenhum nome. Só assim: Meu filho. E eu voltarei a nascer, como se finalmente chegasse ao meu corpo"; "O vendilhão do tempo", em que se menciona que "o tempo é a mais fatal das doenças"; "A lembrança de Ilda", que, quando finalmente consegue reunir a família em torno dela, lhes oferece um "naperão" a cada um e vê as noras a consultarem "o google em busca da mesma palavra."; "O eterno retorno", que começa assim: "Envelhecer dá tanto trabalho que acabamos por ficar velhos."; "Lição de caligrafia", onde se refere que "a escrita é um rio. As vogais são água. As consoantes são pedras. A escrita é um rio antigo, que se inunda de gente. E o alfabeto é um barco. A maioria das pessoas nunca viajou nesse barco."
Estes são apenas exemplos dos vários contos que compõem esta obra, contos breves, que partem da realidade, povoada por personagens ficcionadas a partir de gente real, onde permanece a magia das crendices populares, a pobreza a todos os níveis, a tradição, os valores... Histórias que ficam na memória. Aconselho!

 Madeira, Carla (2023). Tudo É Rio. Infinito Particular.

Nº de páginas: 192
Início da leitura: 09/11/2023
Fim da leitura: 10/11/2023

**SINOPSE**
"Suor, sangue, lágrimas, saliva, sémen. Tudo flui sem parar.

Lucy é a prostituta mais concorrida da cidade. Dalva, por contraste, é de origem familiar e muito tradicional, mulher de Venâncio, senhor de uns ciúmes doentios.

Lucy e o casal, Dalva e Venâncio, protagonizam um triângulo amoroso que se afasta dos lugares-comuns dos romances e nos faz questionar, sob formas surpreendentemente originais, quais os verdadeiros limites do perdão, até onde pode ir a intensidade de um amor, de que valores se reveste a importância da família e, acima de qualquer outra coisa nesta história, quão forte ou fraca pode ser a afeição entre mulheres.

Neste seu impressionante primeiro livro, a escritora brasileira Carla Madeira socorre-se de uma linguagem sem pudores ou complexos, com uma narrativa madura, mas ao mesmo tempo poética e imagética; e dessa forma incorpora todos os extremos, sem ideias básicas de certo e errado, apresentando-nos o extraordinário mundo de mulheres fortes, fracas, com problemas e soluções, com sentimentos e desejos reais."
Confesso que iniciei esta leitura com alguma apreensão, não sabendo bem com o que contar, uma vez que a história se inicia logo com a desabrida Lucy. Porém, à medida que fui entrando na história e conhecendo as restantes personagens, deparei-me com uma história com personagens muito intensas, sofridas e credíveis. A par da narrativa, muito bem construída, saliento a linguagem da autora, que consegue o deboche de forma quase poética, o que não é, de todo, fácil. É uma linguagem que nos aproxima das personagens e, ao mesmo tempo, nos revela uma profunda comoção com as suas vidas.
Deixo algumas frases que sublinhei:
"Perder amores é escurecer por dentro, uma memória do corpo que o entardecer evoca quando tinge o céu de vermelho."
"Pedir a Deus para não sofrer é como pedir para voar. Mas a gente pede assim mesmo e depois fica com raiva do pobre coitado. O sofrimento é certo como a morte e tão inegociável quanto."
"A morte é vida intensa demais para quem fica."
Aconselho a leitura!




Mcfadden, Freida (2023). A Porta Trancada. Lisboa: Alma dos Livros.
Tradução: Carla Ribeiro

Nº de páginas: 272

Início da leitura: 07/11/2023

Fim da leitura: 09/11/2023


**SINOPSE**

"Nora tinha onze anos. Não fazia a mínima ideia de que, enquanto fazia os trabalhos de casa no quarto, o seu pai passava o tempo a matar mulheres na cave... Até ao dia em que a polícia lhes bateu à porta.

Décadas depois, o pai está a cumprir pena de prisão num estabelecimento de segurança máxima e Nora é uma cirurgiã de sucesso com uma existência tranquila e solitária. Ninguém sabe que o pai é um conhecido assassino em série e Nora deseja que assim continue.

Um dia, uma das pacientes de Nora é assassinada da mesma maneira única e cruel usada pelo pai para matar as suas vítimas.

Alguém conhece o passado de Nora e quer imputar-lhe a culpa deste crime. No entanto, Nora não é uma assassina como o pai. A polícia não a pode acusar. A não ser que procurem na sua cave…"
Este livro surpreendeu-me, uma vez que o anterior tinha ficado muito aquém das minhas expetativas. Consegue prender a atenção do leitor, manter o interesse em acompanhar as personagens e desvendar todos os crimes. Se pensa que adivinha quem é, de facto, o culpado, pode esquecer, porque o próprio final é imprevisível. Um thriller que entretém, se lê num ápice e que aconselho a quem gosta do género.

 Schweblin, Samanta (2017). Distância de Segurança. Lisboa: Elsinore.

Tradução: Miguel Filipe Mochila

Nº de páginas: 128

Início da leitura: 05/11/2023

Fim da leitura: 06/11/2023


**SINOPSE**

«"Eu penso sempre no pior dos casos. Agora mesmo estou a calcular quanto tempo demoraria a sair a correr do carro e a chegar até junto da Nina se ela de repente corresse até à piscina e se atirasse. Chamo-lhe "distância de segurança", é assim que chamo a essa distância variável que me separa da minha filha, e passo metade do dia a calculá-la, embora arrisque sempre mais do que devia.» Amanda está às portas da morte numa cama de hospital. A seu lado, a fazer-lhe companhia, está um menino chamado David. Juntos contam-nos uma história de toxinas, desespero e do poder da família.

Num apaixonante primeiro romance, Samanta Schweblin coloca-nos repetidamente perante questões que optamos por evitar: Existe algum apocalipse que não seja pessoal? Qual é o ponto exato em que, sem o sabermos, damos um passo em falso e nos condenamos? Até onde nos é possível controlar o mundo em redor? Distância de Segurança é um relato hipnótico e vertiginoso sobre o amor e a perda, sem medo de mostrar que nada é um cliché quando, no final, acaba por nos acontecer.»
Apesar de ser um livro pequeno, confesso que me foi difícil lê-lo, uma vez que tem um enredo intricado, com situações paranormais difíceis de discernir, para o que contribuem os diálogos com várias narrativas intercaladas.
Tudo começa quando David, filho de Carla e Omar, bebe água, de um ribeiro, contaminada com químicos e fica muito doente. Amanda começa por contar sobre uma tarde passada com Carla, que conhece, numas férias que passa com a sua filha Nina, numa casa alugada.
Amanda cria uma "distância de segurança" em relação à filha, de forma a assegurar-se de que ela está sempre livre de quaisquer perigos. Esta distância acaba por se tornar uma obsessão e damos por nós a sentir a ansiedade que vai dominando a personagem nesta ânsia constante de proteção da filha. Parece que o perigo está sempre ali, a vigiá-las com os seus grandes tentáculos.
Confesso que não foi um livro que me tenha prendido à história, que considero um tanto ou quanto surreal, apesar dos vários prémios literários que ganhou.

 Brown, Natasha (2022). Encontro. Lisboa: Livros do Brasil.

Tradução: Tânia Ganho
Nº de páginas: 120
Início da leitura: 04/11/2023
Fim da leitura: 05/11/2023

**SINOPSE**
"A narradora deste romance é uma mulher negra britânica, com uma posição de destaque no mercado financeiro e um namorado oriundo de uma família conservadora. Seguiu todas as boas regras: ser cortês num ambiente hostil, conseguir a melhor formação superior, lançar-se numa carreira rentável, comprar um bom apartamento, comprar arte, comprar uma espécie de felicidade – e principalmente, manter-se calada, discreta e prosseguir. Agora, enquanto se prepara para participar na festa de aniversário de casamento dos pais do namorado, debate-se com algo que poderá mudar a sua vida, definitivamente. É preciso tomar uma decisão. Esta é uma história sobre as histórias de que somos feitos: de raça e classe social, de segurança e liberdade, de vencedores e vencidos. E do que significa assumirmos o controlo do nosso destino."
A narradora é uma mulher negra britânica, com uma posição de destaque no mercado financeiro e um namorado oriundo de uma família conservadora. Vai-nos apresentando reflexões sobre a sua vida, o cansaço que a domina na luta diária pela ascensão,  as dúvidas que a assolam, as memórias que lhe perpassam pela mente. 
Mesmo sendo uma mulher de sucesso, sente que a família do namorado a recebe com algum desconforto, como a "mais recente" aquisição do filho, e, como tal, descartável, desejavelmente descartável. 
Um livro intenso, que aborda questões raciais, igualdade de género, emigração, ascensão social, escravidão, entre muitos outros temas pertinentes. Uma obra a ler!

Adichie, Chimamanda Ngozi (2021). Notas Sobre o Luto. Alfragide: Publicações Dom Quixote.

Tradução: Tânia Ganho
Nº de páginas: 112
Início da leitura: 02/11/2023
Fim da leitura: 03/11/2023

**SINOPSE**
"No dia 10 de junho de 2020, na Nigéria, o académico James Nwoye Adichie morreu subitamente.
Chimamanda Ngozi Adichie, sua filha, partilha connosco os efeitos devastadores que esta morte teve em si. Tece na sua própria experiência os fios da história da vida do pai até aos seus últimos dias, já em confinamento, em que conversava com os filhos e os netos por videochamada.

  Notas sobre o Luto é um tributo a uma vida vivida em pleno. É a história do amor imenso de uma filha por um pai. Ao falar-nos sobre uma das experiências humanas mais universais, é um livro sobre aquilo que nos une a todos." 
Um livro pequeno, mas grandioso. Para mim, representou muito, nesta fase que atravesso. A recusa em aceitar, a forma como se lida com as pessoas no velório, os sentimentos por vezes um pouco egoístas que perpassam relativamente a pessoas mais velhas que continuam vivas. 
Este é um livro que nos fala da morte do pai da autora, durante a pandemia por COVID 19, através deste vírus que acabou por atacar as fragilidades, em termos de saúde, do pai da autora, como aconteceu com tantas outras pessoas. Como diz a autora:
"As perdas eliminaram tantas camadas, que a vida parece fina como papel". Uma dura verdade.
Um livro imperdível!
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Sobre mim

Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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