Este ano estamos a viver um Natal
diferente. Sem subsídio de Natal, olhamos para os presentes que gostaríamos de
comprar com alguma angústia, pois não há poder de compra. Sem poder de compra,
os comerciantes veem os produtos por vender e por aí adiante. A crise é este
ciclo vicioso que tem o poder de tirar o encantamento a este momento que fez
sempre parte dos nossos sonhos de infância.
Sinto então
necessidade de procurar a chave do Natal em casa das minhas avós, em Silvares.
São seis da tarde. Vejo-me ainda menina em casa da minha avó materna, a comer
filhoses acabadas de fritar. São quentes e gosto delas quase em massa. Daqui a
pouco, começa a preparar-se o jantar. Eu estou feliz. Pedi ao Pai Natal livros
de banda desenhada da Disney. Com certeza, trar-me-á dois ou três e isso é
fantástico. Após o jantar, ouvimos um som no sótão. Corro à varanda e ainda
vejo na minha ingénua imaginação, o Pai Natal sair no seu trenó. Corro às
escadas do sótão e lá estão dois livros, do Patinhas e do Pateta. Fico
felicíssima e sinto vontade de os começar logo a ler. Mas é hora de ir para
casa da minha avó paterna.
Em casa da
minha avó, estão os meus tios e primos. A mesa está posta para a ceia com tudo
de bom, a minha avó foi sempre uma excelente cozinheira. Brinco com os meus
primos até à hora de o Pai Natal chegar aqui, depois de percorrer as restantes
casas da aldeia. Os meus tios, pais e avó conversam alegremente e há amor e
alegria no ar. Cheira a sonhos de uma família feliz.
Chamam-nos
para a mesa. Comemos por lambarice e não já por fome, mas o convívio é bom e os
doces convidam-nos o apetite. O tio e o pai contam histórias do seu dia-a-dia e
é tão bom sentir esta paz familiar que nos acalenta a alma e nos dá força para
mais um ano de trabalho. Estes os momentos que valem a pena.
Colocámos os sapatinhos
na salinha de estar e nós, crianças, nem nos apercebemos que as mães saíram da
sala onde nos encontramos a cear. Não nos apercebemos também que o meu pai já
ali não está. Ouvimos uma gargalhada. O Pai Natal acabara de sair. Ainda o
vemos. É então que o meu primo mais novo diz “O Pai Natal tem os sapatos iguais
aos do tio Fernando!” Rimo-nos todos ante esta astúcia de 2/3 anos. Mas
depressa esquecemos o incidente e corremos para a salinha, onde cada sapatinho
tem um ou dois presentes, não mais. E lá estão mais dois livros de banda
desenhada. Sinto-me a menina mais sortuda do mundo.
Por isso
mesmo, entristece-me ver as crianças reagirem sem qualquer entusiasmo perante
uma série de presentes de Natal. A crise domina-nos a todos os níveis. Não
apenas a nível económico, parece que até o valor dado às coisas está em crise.
Por isso, Pai
Natal da minha memória, traz-nos o entusiasmo, a força de vontade e a alegria
que o tempo ousou roubar! Faz-nos recuperar a essência do Natal!
Célia Gil
Célia Gil