Histórias Soltas Presas Dentro de Mim
Morais, Richard C. (2011). A Viagem dos Cem Passos. Alfragide: D. Quixote.


     A Viagem dos Cem Passos é um livro escrito por Richard C. Morais, um escritor que nasceu em Lisboa, de nacionalidade americana. Foi traduzido por Ana Lourenço.
     Hassan é o protagonista do livro, que cresceu no ambiente da cozinha do restaurante de seu avô na Índia. Quando a mãe morre, partem para Londres e de Londres para Lumière, pequena cidade francesa, onde pai e filhos decidem começar tudo do zero, abrindo um restaurante indiano. Mas numa cidade assim pequena, apesar de escassa, a concorrência pode mesmo dificultar a vida. É o que acontece com Madame Mallory, que possui um restaurante muito antigo em frente ao deles. Esta não descansa enquanto não convence Hassan, o jovem indiano com um talento inato para a culinária, a trabalhar para ela. Hassan empreende a viagem de sua casa para casa de Mallory, uma pequena viagem de cem passos até ao restaurante em frente ao seu. Torna-se pupilo de Mallory, uma reputada chef de culinária francesa. Para quem gosta de culinária, é fácil deixar-se envolver pelos aromas e paladares dos pratos confecionados por Hassan. E o melhor é fazê-lo depois de comer ou terá de fazer uma pausa no livro para ir degustar alguma coisa de forma a manter os sentidos despertos para a história.
     É num determinado dia, enquanto faz um piquenique com Margaret, com quem tem um relacionamento amoroso, que Hassan decide abrir asas, deixar tudo para trás e procurar a fama enquanto cozinheiro. Parte para Paris, onde passa por uma série de restaurantes até atingir a ascensão que sempre desejara.

Este livro teve uma adaptação cinematográfica com o título A 100 Passos de um Sonho, contando com a premiada atriz Helen Mirren no papel de Madame Mallory. Mas por que não ler o livro e depois ver o filme? Fica, pois, o convite para empreender esta viagem ao mundo da gastronomia, que comanda os sonhos deste livro, A Viagem dos Cem Passos, de Richard C. Morais.

Título: A Viagem dos Cem Passos 
Autor: Richard C. Morais
N.º de páginas: 264
Editora: D. Quixote


Wiesel, Elie. Noite. Lisboa: Texto Editora, Lda. 2003


Noite de Elie Wiesel é mais um dos imensos livros que abordam a época do Holocausto, 2ª Guerra Mundial. Porém, tal como outros, não deixa de nos surpreender, de nos dar a conhecer atuações mórbidas e que nunca poderíamos supor, nem na pior das hipóteses. Gostei bastante deste livro. Dar-lhe-ia 4* e só não dou 5, porque, em alguns momentos, faltou-me um pouco mais. Talvez essa lacuna se deva ao vazio de emoções que, a dada altura, invadiu todos os que passaram por estes horrores. A fome, a dor física e da alma são tão fortes que anestesiam, esfriam, esvaziam. Só esta hipótese consegue, quanto a mim, explicar as situações em que, perdendo completamente a razão, pela promessa de um pouco de pão, os prisioneiros servissem de carrascos ou não interviessem pelos seus familiares. Só esta situação desarrazoada explica que os prisioneiros ficassem impávidos e serenos perante mortes e mortes que se iam sucedendo de forma terrível e à sua frente. E, apesar de inicialmente o narrador dizer que não se esquecerá jamais de todos os acontecimentos (e passo a citar: “Nunca mais esquecerei esta noite, a primeira noite no campo (…). Nunca mais esquecerei aquele fumo. Nunca mais esquecerei estas chamas que consumiram para sempre a minha fé. (…) Nunca mais esquecerei estes momentos que assassinaram o meu Deus e a minha alma, e os meus sonhos, que tomaram a aparência de um deserto”), mais à frente, acaba por confessar que esquece tudo, esquece-se até do pai, quando este é encaminhado para o crematório, porque deixou de ter capacidade física e mental para sentir o que quer que fosse (e passo a citar “Eu não chorava e o facto de não conseguir chorar fazia-me mal. Mas já não tinha mais lágrimas.”).

O narrador deste livro, Eliezer, tinha treze anos, acreditava no seu Deus e o sonho dele era arranjar um mestre que o pudesse guiar no estudo da Cabala. Postos fora de casa, o jovem Eliezer e a família, acompanhados de muitos outros judeus, ao chegar a Birkenau, foram confrontados com a separação, a mãe foi para um lado, ele e o pai para outro. Daqui foram para Awschwitz, onde permaneceram três semanas e, posteriormente, para Buna, acabando, mais tarde, por ser encaminhados para Gleiwitz e Buchenwald, onde o pai foi transportado para o crematório, sem chorar, com o ar de quem finalmente está livre de tudo.
                                                                                                              Célia Gil
                                                                                         
Márai, Sándor. A Ilha. Alfragide: Dom Quixote. 2012.


A Ilha é um livro escrito por Sándor Márai e traduzido do húngaro por Piroska Felkai.

         A Ilha é um livro escrito por Sándor Márai e traduzido do húngaro por Piroska Felkai.
O protagonista desta obra, Viktor Askenasi, um homem de meia idade, respeitado professor no Instituto de Estudos Orientais de Paris, vive rodeado de dúvidas existenciais. Não sendo um livro extenso, é um livro cuja leitura carece de especial atenção, profunda, enigmática, onde todos os fios narrativos são fundamentais para a compreensão da história e da mensagem que o autor nos passa.
Aos 47 anos, depois de, num ato de insanidade, ter abandonado a esposa, a filha e o trabalho para viver com uma bailarina russa, que também acaba por abandonar por não responder à sua questão existencial de busca da felicidade, Askenasi resolve empreender uma viagem a Paris, seguindo o conselho de amigos, para descansar. Mas, ao parar numa estância balnear do Adriático, a meio da viagem, pensa que deverá ser ali que pode procurar a resposta para a sua pergunta. Para a ilha, vai apenas aquando de um encontro com uma terceira mulher que o atrai ao seu quarto no Hotel Argentina e que acredita que tem a resposta que nem Deus é capaz de lhe dar. É nessa viagem que se inicia um desfiar de memórias, na procura de respostas para a ambiguidade do amor, a angústia, a incerteza, a sensação de perda, de esquecimento e a solidão.      
     E é por entre os fios cruzados do passado com o presente, que o protagonista nos vai lançando fios que temos de juntar para construir o enredo. Tudo isto numa linguagem magistral, à qual Márai nos habituou em todas as suas obras, uma linguagem que nos envolve, nos deixa expectantes. Ainda que parta de questões com que o ser humano, em qualquer momento da sua vida, se depara, como porque trabalhamos toda uma vida? Não será necessário de aparentemente deixar de ver para passar a observar com nitidez? Será preciso perder aparentemente a memória, para nos recordarmos do que efetivamente é importante para nós?

É um daqueles livros que é preciso degustar, palavra a palavra, voltar atrás algumas linhas e reler, para não perder nada, já que tudo é importante. Parar para, de alguma maneira, questionarmos a nossa própria vida. É esse o maior poder de Márai no leitor, abaná-lo, questioná-lo por meio de uma personagem que pode muito bem ser qualquer um de nós. Porque, apesar de todos sermos uma ilha inexplicável e inacessível, na qual pensamos estarem as respostas para as nossas dúvidas, a ilha pode muito bem ser o isco que nos aprisiona e que impede que nos libertemos e encontremos a felicidade.
                                                                                               Célia Gil


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Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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