Wiesel, Elie. Noite.
Lisboa: Texto Editora, Lda. 2003
Noite de Elie Wiesel é mais um dos imensos livros
que abordam a época do Holocausto, 2ª Guerra Mundial. Porém, tal como outros,
não deixa de nos surpreender, de nos dar a conhecer atuações mórbidas e que
nunca poderíamos supor, nem na pior das hipóteses. Gostei bastante deste livro.
Dar-lhe-ia 4* e só não dou 5, porque, em alguns momentos, faltou-me um pouco
mais. Talvez essa lacuna se deva ao vazio de emoções que, a dada altura,
invadiu todos os que passaram por estes horrores. A fome, a dor física e da
alma são tão fortes que anestesiam, esfriam, esvaziam. Só esta hipótese
consegue, quanto a mim, explicar as situações em que, perdendo completamente a
razão, pela promessa de um pouco de pão, os prisioneiros servissem de carrascos
ou não interviessem pelos seus familiares. Só esta situação desarrazoada explica
que os prisioneiros ficassem impávidos e serenos perante mortes e mortes que se
iam sucedendo de forma terrível e à sua frente. E, apesar de inicialmente o
narrador dizer que não se esquecerá jamais de todos os acontecimentos (e passo
a citar: “Nunca mais esquecerei esta noite, a primeira noite no campo (…). Nunca
mais esquecerei aquele fumo. Nunca mais esquecerei estas chamas que consumiram
para sempre a minha fé. (…) Nunca mais esquecerei estes momentos que
assassinaram o meu Deus e a minha alma, e os meus sonhos, que tomaram a
aparência de um deserto”), mais à frente, acaba por confessar que esquece tudo,
esquece-se até do pai, quando este é encaminhado para o crematório, porque deixou
de ter capacidade física e mental para sentir o que quer que fosse (e passo a
citar “Eu não chorava e o facto de não conseguir chorar fazia-me mal. Mas já
não tinha mais lágrimas.”).
O
narrador deste livro, Eliezer, tinha treze anos, acreditava no seu Deus e o
sonho dele era arranjar um mestre que o pudesse guiar no estudo da Cabala.
Postos fora de casa, o jovem Eliezer e a família, acompanhados de muitos outros
judeus, ao chegar a Birkenau, foram confrontados com a separação, a mãe foi para um lado, ele e o pai para outro. Daqui foram para Awschwitz, onde permaneceram três semanas e, posteriormente,
para Buna, acabando, mais tarde, por ser encaminhados para Gleiwitz e Buchenwald,
onde o pai foi transportado para o crematório, sem chorar, com o ar de quem
finalmente está livre de tudo.
Célia Gil
Célia Gil
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