Histórias Soltas Presas Dentro de Mim

Tordo, João (2023). O Nome Que a Cidade Esqueceu. Lisboa: Companhia das Letras.

Nº de páginas: 336

Início da leitura: 28/06/2024

Fim da leitura: 30/06/2024


**SINOPSE**

"Nova Iorque, 1991.

Ao aterrar na América, Natasha, refugiada de um país da ex-União Soviética, está longe de imaginar que o seu exílio se transformará numa aventura labiríntica pela grande cidade e pela alma humana. O caminho desta rapariga cheia de medos e sonhos cruza-se com o de George B., homem marcado por um passado misterioso, que vive em total isolamento em plena cidade, barricado num apartamento apinhado de objectos inúteis.

George oferece a Natasha um emprego bizarro: ler-lhe em voz alta a lista telefónica de Nova Iorque. Enquanto a rapariga aprende a suportar as saudades da sua família e do seu país, esboçando uma nova vida na metrópole vibrante e crua, George, por seu lado, procura obsessivamente um nome entre os milhões de nomes que a cidade esqueceu; um nome que poderá salvá-lo, ou ser a sua danação.

Tomando como inspiração uma história verdadeira publicada no New York Times, João Tordo constrói um romance enigmático, impulsionado pelo acaso e pela memória. O resultado é uma narrativa que disseca a solidão, grande doença dos nossos tempos, confrontando as suas personagens e os leitores com o passado com que todos tentamos reconciliar-nos.

O Nome que a Cidade Esqueceu marca o regresso de um dos escritores mais estimados do público a um lugar que lhe é familiar, numa história plena de imaginação, arrojo, candura e compaixão."
Adorei este livro. As personagens são cativantes, a premissa é excelente e a forma como foi desenvolvida correspondeu totalmente às minhas expetativas.
Natasha é a narradora desta história. Tudo começa quando ela é enviada pelos pais, como refugiada, para os EUA, pelo facto de o seu país (ex-União Soviética)  estar em guerra. Uma bomba que rebentou no quintal de sua casa, tê-la-á deixado gaga. Mais um problema a juntar ao facto de não conhecer ninguém, nem a própria língua inglesa. Não é fácil para uma menina como ela enfrentar um novo mundo, uma nova vida, deixando todos os que mais ama para trás. Mas Natasha é determinada, decide começar a aprender inglês e acaba por ser contratada para ler a lista telefónica a um homem que não sai de casa, tem fobia social, é um acumulador e com pouca higiene. Curiosa como é, não descansa enquanto não tenta conhecer melhor este homem que lhe paga para ler a lista telefónica e por que o faz. As personagens são cativantes. E, a partir daqui não conto mais, mas devo dizer que há muito mais para além do que mencionei e que tornam este uma história única. Ainda por cima, o autor inspirou-se numa história verdadeira, que leu no New York Times. Vale bem a pena ler! Aconselho.

Vieira, Padre António e Moura, Pedro Vieira de (2024). Padre António Vieira Sermão de Santo António aos Peixes. Lisboa: Levoir.

Nº de páginas: 64
Início da leitura: 23/06/2024
Fim da leitura: 25/06/2024

**SINOPSE**
"O Sermão de Santo António aos Peixes, foi proferido na cidade de São Luís do Maranhão, na sequência de uma disputa com os colonos portugueses no Brasil. Constitui um documento surpreendente de imaginação, habilidade oratória e poder satírico do Padre António Vieira.

Com uma construção literária e argumentativa notável, o sermão tem como objetivo louvar algumas virtudes humanas e, principalmente, censurar com severidade alguns vícios dos colonos.

O Sermão de Santo António aos Peixes, faz parte das leituras do 11º ano."
Gostei desta adaptação a Banda Desenhada da grande obra Sermão de Santo António aos Peixes, de Padre António Vieira. Sem descurar o essencial, nem mesmo a linguagem cuidada da obra, Pedro Vieira de Moura dá-a a conhecer, de uma forma mais simples. Claro que os alunos de 11º ano têm de ler o original. Porém, depois de lerem e analisarem o original, esta obra poderá servir de consolidação do essencial desta obra. As ilustrações estão bem conseguidas e permitem perceber melhor a obra (penso que se se conhecer. Quem nunca leu a obra original, é capaz de se sentir um pouco perdido nas metáforas dos peixes que, com as suas virtudes ou defeitos, representam tão bem as virtudes e vícios dos humanos).

Mola, Carmen (2024). A Nina. Lisboa: Suma das Letras.

Tradução: Gonçalo Neves
Nº de páginas: 384
Início da leitura: 25/06/2024
Fim da leitura: 27/06/2024

**SINOPSE**
"É a véspera do fim do ano chinês, e o ano do porco está prestes a começar. Chesca, responsável pela Brigada de Análise de Casos há um ano, tem um encontro marcado com Ángel Zárate, mas ele não aparece. Ainda assim, ela decide sair para se divertir e acaba por passar a noite com um desconhecido. Na manhã seguinte, acorda com três homens à volta da sua cama, à espera para se juntarem à diversão. E um cheiro repugnante a carne de porco impregna o quarto.

Depois de um dia inteiro sem qualquer sinal dela, os seus colegas da BAC começam a procurá-la, e contam com uma ajuda preciosa: Elena Blanco, que tinha deixado a Polícia após o fracasso do caso Rede Púrpura, mas que não pode virar as costas a uma amiga. Rapidamente se apercebem de que, por detrás do desaparecimento de Chesca, se escondem segredos inomináveis, nomeadamente o que envolve a enigmática Nina, e terão de enfrentar o horror, tanto físico como moral, de que Chesca não é a única vítima."
Carmen Mola é, sem dúvida, para os apreciadores de thrillers (mais macabros e violentos), uma aposta segura. Quanto a mim, foi ainda mais "negro" que os anteriores. Porém, é daqueles livros que é impossível largar, por mais que nos deixe horrorizados com acontecimentos verdadeiramente macabros (não aconselho aos mais sensíveis). 
As personagens são marcantes, quer pelo bem quer pelo mal. Zárate y Chesca são os grandes protagonistas, com os seus segredos, que vão sendo desvendados. E não posso dizer muito mais sem entrar em detalhes que quero deixar para desfrutarem na leitura.
Este thriler serve bem a sua função de entreter, de nos deixar ansiosos e presos à narrativa. Aconselho!

Lagani, Chiara e Cerri, Mara (2023). A Amiga Genial a partir do romance de Elena Ferrante. Lisboa: Relógio D'Água.

Tradução: Margarida Periquito
Nº de páginas: 264
Início da leitura: 23/06/2024
Fim da leitura: 26/06/2024

**SINOPSE**
"Esta é a história da amizade entre Raffaella Cerullo e Elena Greco, Lila e Lenù.
Uma ligação indissolúvel que surge entre duas raparigas que dão as mãos num bairro miserável da periferia de Nápoles, nos anos 1950, e percorre toda a sua vida.
A relação acaba num desaparecimento, uma tentativa desesperada de perderem o rasto uma da outra.

É uma sugestiva viagem pelo imaginário do romance que cativou leitores de todo o mundo, através de sensibilidade artística de Mara Cerri, uma das melhores ilustradoras contemporâneas, e da sabedoria narrativa de Chiara Lagani, dramaturga e intérprete da companhia teatral Fanny & Alexander.

Uma transposição apaixonante, preservando as potencialidades expressivas da linguagem da banda desenhada, o que ilumina com novas perspetivas o romance mais icónico de Elena Ferrante."
Esta novela gráfica desiludiu-me, talvez por ter gostado muito do romance de Elena Ferrante. Penso que fica muito aquém da obra de Ferrante, sendo o texto excessivamente resumido (precisava de mais). Por outro lado, penso que quem não leu o original, pode sentir esta lacuna e não entender a mensagem. Das ilustrações gostei, as personagens surgem com "vida" nos olhos, exprimindo os estados de alma das personagens. Aconselho mais a leitura do original.

Lameiras, João Miguel; Boléo, João Paulo Paiva; Ramalho-Santos, João (2022). Imagens de Uma Revolução - 25 de Abril e a Banda Desenhada. Lisboa: Levoir.
Nº de páginas: 152

Início da leitura: 15/06/2024

Fim da leitura: 22/06/2024

**SINOPSE**

"O 25 de Abril de 1974 é uma data fundamental da História de Portugal. Agora que passámos a viver mais tempo em Democracia do que em Ditadura, é importante, não só comemorar Abril, mas lutar contra o esquecimento.

A Banda Desenhada, pela forma única como conjuga texto e imagem, foi utilizada de forma intensa para transmitir as mais diversas mensagens, antes e depois da Revolução, revelando-se um meio privilegiado para fixar a nossa História de forma dinâmica e atractiva sem abdicar do rigor.

Este livro profusamente ilustrado parte de anteriores trabalhos dos mesmos autores sobre a forma como o 25 foi tratado na BD, para construir uma visão global e actualizada das imagens que perduram da Revolução, por quem a viveu, e por quem ainda não era nascido em 1974. Porque uma revolução que foi desenhada pode ser discutida e reflectida, pode evoluir. Mas dificilmente será esquecida."
Este é um livro que nos permite como era a Banda Desenhada antes e após o 25 de Abril. Lê-se bem, sem se tornar maçador, além de nos ir dando várias sugestões de bandas desenhadas de vários autores. Fiquei curiosa em relação a várias das BD mencionadas e vou, com certeza, procurá-las. Aponto, porém, dois aspetos que poderiam ser melhorados: alguns exemplos que dão de algumas pranchas, estão muito pequenos e não permitem a leitura. Por outro lado, há alguns erros que poderiam ser evitados.

Michaelides, Alex (2024). A Fúria. Lisboa: Editorial Presença.

Tradução: Maria Ferro
Nº de páginas: 304
Início da leitura: 22/06/2024
Fim da leitura: 24/06/2024

**SINOPSE**
"Um dos thrillers mais viciantes do ano.

Estamos numa pequena ilha grega, de acesso exclusivo. Uma das mulheres mais conhecidas do planeta, a ex-estrela de cinema Lana Farrar, convida um grupo de amigos para partilhar umas férias paradisíacas. Dias soalheiros, mar azul a perder de vista e a oportunidade perfeita para relaxar e estar com os amigos de sempre. Este plano tem tudo para correr bem, mas há segredos que teimam em vir à tona.

Longe das luzes da ribalta, fora das redes sociais, nada é o que parece. Quem é Lana? E os outros seis amigos? Mais importante: quem é o assassino? Seja quem for, uma coisa é­ certa: está neste grupo."
Há escritores que escrevem "o tal livro", aquele que nos impulsiona a ler tudo o que escreve. Foi o que aconteceu com A Paciente Silenciosa. Acontece que Alex Michaelides nunca mais teve aquele rasgo de inspiração. 
Este é um livro muito mediano, no qual a ação se arrasta e cujas reviravoltas me pareceram muito rebuscadas. As personagens também não me cativaram. Um livro que serve o propósito de entreter durante umas horas, mas que não é inesquecível.

 Portero, Alana S. (2024). Maus Hábitos. Lisboa: Alfaguara Portugal.

Tradução: Helena Pitta
Nº de páginas: 248
Início da leitura: 20/06/2024
Fim da leitura: 22/06/2024

**SINOPSE**
"Um desafio a corações empedernidos: assim é Maus Hábitos, a história lírica e feroz de uma menina presa num corpo de rapaz, desbravando o caminho rumo à sua identidade, à revelia de tudo e de si mesma.

«Eu, menina esperta, maricas encoberta, gaga, gorducha, com uma pala a cobrir-me o olho esquerdo e uns óculos maiores do que o desejável, era o oposto da imagem de uma pequena endiabrada […]. Quando os adultos olhavam para mim, achavam-me engraçada ou sentiam um pouco de pena, nada grave […]. Dava-me conta disso e aprendi a usá-lo a meu favor. Conseguia pensar em termos cruéis. A consciência de que necessitamos de um armário para nos escondermos torna-nos espertíssimos.»
Este romance leva-nos numa travessia pelo território mais íntimo da natureza humana — uma travessia da qual não saímos incólumes. Maus Hábitos é a história do encontro de uma pessoa consigo mesma, alguém que nasce no corpo errado, no lugar mais triste e sem futuro, num tempo desolado. Pela mão da protagonista, vamos até à sua infância em San Blas — um bairro operário suburbano e dizimado pela heroína nos anos oitenta —, passamos pela adolescência selvagem nas noites clandestinas de Madrid e chegamos ao raiar do milénio, quando a promessa de liberdade é soterrada por um episódio de insuportável violência. Contudo, das cicatrizes mais fundas há de emergir não a redenção, mas a esperança."
Esta não é uma história que se leia de ânimo leve. Num tom acutilante e certeiro, a autora aborda a temática da transexualidade, num contexto social operário de Madrid, no final dos anos 80, época que se confronta com a diferença, com com a transexualidade como doença e algo que deve ser punido com violência gratuita, com a SIDA e outras questões que começam a despoletar.
A protagonista deste livro é uma menina no corpo de um rapaz, que se vê forçada a esconder por detrás da porta da casa de banho os seus sonhos femininos e a disfarçar a sua essência com comportamentos masculinos com os quais não se identifica, mas que lhe servem de máscara social.

 Mai, Nguyen Phan Qué (2024). Quando as Montanhas Cantam. Lisboa: Alma dos Livros.

Tradução: Carla Ribeiro

Nº de páginas: 360

Início da leitura: 18/06/2024

Fim da leitura: 21/06/2024


**SINOPSE**

"Um país em guerra. Uma família dividida. Uma história de coragem e esperança.
Vietname, 1972. Do seu refúgio nas montanhas, a pequena Huong, e a sua avó observam Hanói a arder sob o fogo dos bombardeiros americanos. Até àquele momento a guerra tinha sido apenas uma sombra que afastara a família e dilacerava o país. Agora, entrava de forma brutal nas suas vidas.

Quando regressam à cidade, descobrem a sua casa completamente destruída e decidem reerguê-la, tijolo a tijolo. Para animar a neta, Di¿u Lan começa a contar a história da sua vida: desde os anos nas terras da família durante a ocupação francesa, as invasões japonesas e a chegada dos comunistas; da sua fuga desesperada para Hanói, sem comida nem dinheiro, e a dura decisão de deixar os filhos pelo caminho, na esperança de que, mais tarde ou mais cedo, se reencontrassem.

O tempo passa e quando finalmente terminam a reconstrução da casa, a guerra já terminou. Os veteranos estão a regressar da linha da frente e Huong pode finalmente voltar a abraçar a mãe, que está uma mulher muito diferente daquilo que ela se lembrava. A guerra roubou-lhe a esperança e as palavras; e caberá a Huong dar-lhe voz e ajudá-la na dura tarefa de se libertar do fardo amargo de todos os segredos..."
Este é um livro duro de ler, pois, apesar de ficcional, baseia-se em várias histórias reais e acontecimentos históricos que marcaram a guerra no Vietname. As personagens, uma família separada pela guerra, mas unida por laços que vão muito para além de tudo o que a possa separar, são marcantes e não podemos impedir-nos de partilhar com elas as dores que sentem, as tragédias que as marcam e as pequenas vitórias que alcançam. É incrível ver até onde vai a crueldade do ser humano, por ambição ou pura maldade. 
Para os mais sensíveis este não será um livro fácil. É de uma grande carga dramática, sobretudo por a sabermos tão real. A escrita é intensa, envolvente e dura. Gostei muito deste livro, se bem que, em alguns momentos, me tenha doído a alma perante alguns acontecimentos narrados.

Curia, Álvaro (2024). Filhos da Chuva. Queluz de Baixo: Manuscrito.

Nº de páginas: 304
Início da leitura: 17/06/2024
Fim da leitura: 18/06/2024

**SINOPSE**
Em Domínio, a chuva não tem fim e os relógios pararam nas cinco da tarde. Numa terra sem tempo, as vidas andam todas desencontradas. Conhecedora dos hábitos de cada um, Muda percorre as ruas, carregada de sacos, distribuindo as compras e uma réstia de normalidade. Aguarda o momento em que se cruza com o filho, Amor, um jovem que vive aprisionado numa fábula que o padrasto lhe conta desde pequeno e que mudará a sua vida para sempre. Ao largo de Domínio está a Ilha da Fortaleza, onde encontramos Mãe, mulher possessiva, que nunca deixou Filho conhecer o mundo. Mas algo fará com que ele parta e o seu caminho se cruze com o de Amor. Poderá a decisão de um alterar a vida de todos?

Um romance em que a culpa e a obsessão andam de mãos dadas com o acaso e a coragem.
Este é um livro maravilhoso, sem dúvida! De forma peculiar, entramos na Praia dos Vidros, Rio, Fortaleza e, especialmente, em Domínio (onde decorre quase toda a ação, está sempre a chover e o tempo não passa como nos outros sítios), pela mão dos seus habitantes, personagens que passam a viver em nós, como a Muda (a minha personagem preferida), o filho Amor (algo matreiro) e o marido, o Gordo que quase não come (antes apelidado de Voltinhas), o franzino mas determinado Filho e a Mãe, mulher possessiva que não queria que Filho a deixasse e que mostra personalidades muito distintas. Um mundo mágico, numa linguagem envolvente, onde é fácil entrar, mas de onde é difícil sair. 
De salientar o excelente (como sempre) trabalho de Juan Cavia na ilustração da capa.

 Gama, Maria Francisca (2024). A Cicatriz. Lisboa: Suma das Letras.

Nº de páginas: 168
Início e fim da leitura: 16/06/2024

**SINOPSE**
«Éramos felizes, verdadeiros camaradas e a âncora um do outro. Um dia o nosso barco afundou-se e nenhum dos objetos que éramos nos salvou.»

Um casal foi de férias para o Rio de Janeiro, numa viagem que prometia ser inesquecível. Depois de dias encantadores, banhados pelo sol e pelo espírito leve e sempre em festa carioca, aproveitam uma das últimas noites para irem jantar fora. Quando terminam a refeição, satisfeitos e apaixonados, decidem ir a pé para o hotel, mas não se recordam se o caminho mais perto é pela esquerda ou pela direita. Como é que a vida pode mudar tanto, apenas assim, por uma escolha irrisória?

Um relato profundo e duro, escrito na primeira pessoa, que se debruça sobre a finitude da vida, as decisões irrefletidas que a moldam e o conceito de amor eterno, com a cidade maravilhosa como pano de fundo.
Que livro! Intenso, dramático e com uma estrutura narrativa que nos deixa suspensos da primeira à última página. Gostei muita da forma como a autora escreve e lerei, com certeza, outros livros da mesma. Escreve dialogando connosco, como interlocutores, o que nos leva a sentirmo-nos lá, dentro da narrativa, a usufruir de tudo o que o Rio de Janeiro nos oferece de bom, mas também a sofrer com o que pode trazer de mau. Fica-nos a certeza de uma cicatriz que nos marcará para sempre.
Um livro que aconselho sem reservas.

 Williams, Pip (2022). O Dicionário das Palavras Perdidas. Porto: Porto Editora.

Tradução: Maria do Carmo Figueira
Nº de páginas: 424
Início da leitura: 13/06/2024
Fim da leitura: 15/06/2024

**SINOPSE**
Em 1901, descobriu-se que faltava a palavra “escrava” no Dicionário de Inglês Oxford. Esta é a história da menina que a roubou.
Esme nasceu num mundo de palavras. Órfã de mãe e irreprimivelmente curiosa, passa a infância no Scriptorium, um barracão de jardim em Oxford onde o pai e um grupo de lexicógrafos dedicados selecionam palavras para o primeiro Dicionário de Inglês. Esme acompanha tudo a partir do seu lugar, debaixo da mesa, sem ser vista nem ouvida. Um dia, um pedaço de papel contendo a palavra “escrava” cai ao chão. Esme apanha-o e esconde-o na velha caixa de madeira da sua amiga, Lizzie, uma jovem criada de servir na casa grande. Esme começa a reunir outras palavras do Scriptorium, palavras descartadas ou negligenciadas pelos homens do dicionário. Palavras que a ajudam a entender o mundo.
Com o passar do tempo, Esme percebe que certas palavras são consideradas mais importantes do que outras, e que as que se relacionam com as experiências das mulheres acabam muitas vezes excluídas.
Como surgiram os primeiros dicionários? Quem selecionava as palavras?
E porque é que algumas palavras eram consideradas mais importantes do que outras? Pip Williams conta-nos esta história numa narrativa envolvente que é também uma maravilhosa história de amor.
É com o movimento sufragista feminino no auge e a Grande Guerra a aproximar-se a passos largos que se desenrola a ação de O Dicionário das Palavras Perdidas: uma narrativa escondida nas entrelinhas de uma história escrita por homens. Inspirada em factos reais, Pip Williams mergulhou nos arquivos do Dicionário de Inglês Oxford para contar esta história. O Dicionário das Palavras Perdidas é uma celebração deliciosa, lírica e profundamente instigante das palavras e do poder da linguagem para moldar o mundo.

Foi um prazer ler este livro. Afinal, também eu, ainda que de outra forma, vivo no meio das palavras e sempre me interessei por elas. A protagonista deste livro, Esme, era ainda uma criança que se escondia debaixo da mesa, no local de trabalho do pai, um Scriptorium, onde ele trabalhava como lexicógrafo para o Oxford English Dictionary. Ao deparar-se com um pequeno papel onde estava a palavra "escrava", Esme, que não gostou do sentido desta palavra, resolveu escondê-la para não ser integrada no dicionário. Esme começou a interessar-se cada vez mais pelo Scriptorium, pela recolha de palavras perdidas e decidiu começar a recolher palavras que se ouviam no mercado e que, apesar de serem utilizadas oralmente, não integravam o dicionário. A par desta narrativa em torno das palavras, surge a diferença, o romance, a gravidez, a separação, o sufrágio feminino, o amor, a guerra e a morte, que acabam por dar mais vivacidade à história que, caso se tecesse apenas em torno do Dicionário, se tornaria maçadora. A ficção surge neste livro, sempre com um fundo histórico, o que cria a ideia de verosimilhança.
Gostei muito e aconselho!

Céspedes, Alba de (2024). O Caderno Proibido. Lisboa: Alfaguara Portugal.
Tradução: Ana Cláudia Santos

Nº de páginas: 304

Início da leitura: 10/06/2024

Fim da leitura: 13/06/2024


**SINOPSE**

Roma, década de 1950: Valeria Cossati vai comprar cigarros para o marido, ignorando que sairá da tabacaria com um caderno que há de mudar a sua vida. Ao transformar esse caderno num diário secreto onde regista pensamentos e desejos do dia-a-dia, Valeria transforma-o num instrumento de emancipação: liberta-se das convenções sociais, do sentido de dever para com o marido e os filhos, dos limites autoimpostos que regem o seu pequeno mundo. A partir daqui, tudo é questionado. Valeria compreende que está em translação e decide conquistar o lugar que escolheu para si.

Clássico redescoberto, testemunho histórico de uma época, retrato primoroso da turbulência doméstica, O Caderno Proibido condensa a sede de liberdade de toda uma geração e das outras que se lhe seguiriam. Precursora da linhagem literária mais disruptiva da modernidade - de Virginia Woolf a Natalia Ginzburg, de Marguerite Duras a Vivian Gornick -, Alba de Céspedes celebra aqui o poder da escrita e a audácia indómita de uma mulher numa sociedade em ebulição.
Este livro magnífico faz-me pensar que, de facto, a escrita pode ter um poder catártico. O enredo não é complexo e gira em torno de muitos dos pensamentos sobre o passado, o presente, as relações familiares e pessoais da protagonista Valeria Cossati, que vai mudar a sua maneira de pensar e viver, a partir do momento em que compra e esconde em casa um caderno de capa preta. O que era inicialmente um simples caderno, passará a diário e controlará a sua vida. Vive atemorizada que os filhos ou o marido o descubram, tranca a gaveta onde o esconde e inventa desculpas para ser ela a procurar algo de que alguém possa precisar na despensa ou móveis, uma vez que teme que o encontrem. E o que esconde este caderno de uma mulher tão simples, com uma vida tão comum a tantas outras mulheres? Deixo o convite a entrarem neste diário e descobrirem as reflexões que ali vão sendo registadas.
Vale bem a pena ler. Gostei bastante!

Agustí, Laura (2022). A História de Um Gato. Alfragide: Publicações Dom Quixote.

Tradução: Ana Saragoça
Nº de páginas: 160
Início da leitura: 11/06/2024
Fim da leitura: 12/04/2024

**SINOPSE**
"Este é um livro tão maravilhoso que mesmo os que não gostam de gatos não resistirão a folheá-lo com prazer. Fala de um tempo em que as crianças passavam mais tempo ao ar livre, em contacto com a natureza, e tinham a sorte de saber o que eram galinhas e coelhos sem ser pela Internet.

Esta é a história de Laura e do seu gato Oye, um siamês que chegou a sua casa quando era apenas uma bolinha de pelo branco que cabia na palma da mão e que viveria com a dona ao longo de dezassete anos. Uma narrativa autobiográfica que começa nos anos 1980, numa pequena aldeia da província espanhola de Teruel, onde Laura cresceu atenta ao voo dos pássaros, cercada por besouros, ouriços, coelhos, galinhas, cães e gatos, e lendo histórias sobre animais junto à lareira de casa dos avós. E que continua em Barcelona, para onde Laura vai estudar Belas Artes e continua a cultivar o seu amor à natureza e a nutrir uma dedicada paixão pelos seus animais de estimação: Oye, claro, mas não só.

História de Um Gato é um relato emocionante de uma relação afetiva e de uma ligação ternurenta aos felídeos, temperada com mil e uma curiosidades e sábios conselhos para todos os amantes do mundo dos gatos. Um livro escrito e ilustrado por alguém que o conhece a fundo e destinado a tornar-se um clássico sobre felinos!"
Este é um livro autobiográfico, maravilhosamente ilustrado, que nos conta a relação da autora com os animais que passaram e a acompanharam na sua vida, em especial o gato Oye, um siamês que a marcou profundamente. A par destas "confissões" sobre a sua relação com Oye, vai tecendo considerações sobre as reações dos gatos, as plantas que lhes são tóxicas e as que se podem ter dentro de casa, entre outros aspetos relevantes. Conta-nos, ainda, sobre sobre a evolução da pintura de gatos ao longo dos séculos. Recomendo, especialmente aos amantes de gatos.
Algumas passagens:
"Perco a noção do tempo entre festinhas e ronrons. Fascina-me a sua despreocupação perante tudo, e também a elegância inata dos seus movimentos, aquele estado de alerta constante e o porte sempre orgulhoso, a consciência de que têm tudo sob controlo." (pág. 11)
"...os gatos não nos percecionam como humanos, mas sim como gatos gigantes ao seu serviço." (pág. 83)

Musso, Guillaume; Hyman, Miles (2024). A Vida Secreta dos Escritores. Lisboa: Gradiva BD.

Tradução: Ana Maria Pereirinha
Nº de páginas: 192
Início da leitura: 05/06/2024
Fim da leitura: 11/06/2024

**SINOPSE**
"Depois de publicar três romances muito bem recebidos no mercado, o aclamado autor Nathan Fawles anuncia que vai deixar de escrever e retirar-se para Beaumont, uma ilha tão selvagem quanto bela ao largo da costa do Mediterrâneo.

Vinte anos mais tarde, ainda os seus romances continuam a cativar os leitores, Mathilde Monney, uma jovem jornalista, chega à ilha, determinada a descobrir o seu segredo. Começa um perigoso confronto frente a frente, onde colidem verdades e mentiras onde o amor e o medo se cruzam...

Uma leitura inesquecível.
Um romance fascinante de Guillaume Musso magistralmente adaptado por Miles Hyman."
Esta é uma novela gráfica onde tudo faz sentido: desde o texto, enigmático (um autêntico thriller), repleto de suspense e mistério; as personagens, também elas enigmáticas, determinadas e inesquecíveis, o ambiente recriado - a ilha de Beaumont, um regalo para os sentidos e as ilustrações maravilhosas, em tons pastel, quentes do sol que se reflete nas águas da ilha. Fantástica! Um livro que não é apenas um bom argumento, mas um livro que nos fala de escritores, de literatura, e nos presenteia com frases de vários escritores e que vêm a propósito de determinadas sequências narrativas - Milan Kundera, Agatha Christie, Margaret Atwood, Umberto Eco, Franz Kafka, entre outros - nas quais encaixam na perfeição. Devo dizer que me senti na ilha, também eu em busca de respostas para as questões que se vão levantando em catadupa. Por tudo isto e mais que me possa ter escapado, recomendo muito esta leitura.
E, já agora, o que levará um autor de bestsellers a abandonar a escrita? Convido-vos a visitá-lo na sua magnífica casa em Beaumont e a saber de tudo, de forma direta ou nas entrelinhas.

Giannone, Francesca (2024). A Carteira. Lisboa: Editorial Presença.

Tradução: Maria Ferro
Nº de páginas: 400
Início da leitura: 08/06/2024
Fim da leitura: 10/06/2024

**SINOPSE**
"Apaixonante, esta é a grande história de uma mulher à frente do seu tempo.

Em 1934, a uma pequena aldeia italiana, chega um casal: Carlo, que é do Sul, e está feliz por regressar; Anna, a sua mulher, de uma beleza helénica, parece triste e preocupada. Como será a sua vida naquela terra desconhecida?

Apaixonada pelo marido e desejada pelo cunhado - a quem nunca cederá -, Anna é uma figura completamente diferente de todos: não vai à igreja, é dona do seu nariz, diz o que pensa e nunca se irá vergar às leis e costumes que oprimem as mulheres. E, para espanto de todos, em 1935, decide concorrer ao lugar de carteiro e torna-se a primeira mulher a distribuir correspondência. Na verdade, será muito mais do que isso.

Ao longo das duas décadas seguintes, sem querer, mas sobretudo sem que os habitantes o queiram, Anna será a pessoa que mudará aquela aldeia. A pé, e depois de bicicleta, ela é a carteira, aquela que escuta todos, que leva cartas dos soldados da Segunda Guerra, postais de quem partiu para longe, confidências de amantes secretos. Anna é o fio invisível que liga centenas de vidas e as vai mudar para sempre.

Retrato familiar e de época, este romance é, sobretudo, a história de uma mulher extraordinária e a prova de como uma só pessoa, cheia de alma e coração, pode fazer a diferença nas alegrias e tristezas de tanta, tanta gente."
Um romance que é uma verdadeira saga familiar, envolvente, com personagens peculiares e marcantes (gostei especialmente da Anna e do Daniele). A história envolve-nos desde o início e vai crescendo de intensidade à medida que vamos entrando nos segredos e maneiras de ser das famílias que aqui se cruzam.
Uma mulher muito à frente no seu tempo, Anna, ao chegar à terra do marido e, ainda que não precise monetariamente, arranja um emprego como carteira. Para além deste emprego, muito bem descrito na sinopse, vai levar a cabo um projeto de uma casa para mulheres (muito pouco entendido na altura) desamparadas, que queiram mudar de vida, aprender, estudar, ler... 
Escrito de forma simples e elegante, prende-nos da primeira à última página.
Aconselho, desde já, a leitura!

Ganho, Tânia (2020). Apneia. Lisboa: Casa das Letras.

Nº de páginas: 696
Início da leitura: 05/06/2024
Fim da leitura: 08/06/2024

**SINOPSE**
"Quando Adriana ganha finalmente coragem para sair de casa com o filho de cinco anos, pondo fim ao casamento com Alessandro, mal pode imaginar que o marido, incapaz de aceitar o divórcio, tudo fará para a destruir - nem que para isso tenha de destruir o próprio filho.

Apneia é uma viagem ao mundo sórdido da violência conjugal e parental, através de um labirinto negro em que os limites da resistência psicológica são postos à prova, ameaçando desabar a qualquer instante, e dos meandros tortuosos de uma Justiça por vezes incompreensível, desumana e desfasada da realidade.

Escrito com uma sobriedade e frieza inquietantes, Apneia é um romance intenso, absorvente e perturbador, que ilustra com uma autenticidade desarmante o estado de guerra em que vivem milhares de famílias estilhaçadas, e com o qual, inevitavelmente, muitos leitores se vão identificar, encontrando nestas páginas ecos da sua própria experiência."
Este é um livro que, sendo ficção, é a reprodução ficccional de uma infeliz realidade: a ação da justiça (morosa, fria, calculista, injusta) em casos de violência doméstica (ainda mais difícil de provar quando esta é psicológica), de alienação parental, de abuso de menores. É um livro duro de ler, duro de aceitar, duro por ser tão real! Quantas famílias continuam a debater-se pela guarda dos filhos...Será fácil analisar a inépcia de um pai/mãe? E deverá ser feito apenas em função de terem rendimentos, um emprego estável, uma casa grande? De que forma tudo isso prova a estabilidade emocional do pai/mãe? Mais difícil se torna, quando um deles é maquiavélico ao ponto de não deixar pontas soltas, de apenas avançar até onde sabe que a justiça não terá por onde pegar. Até que ponto tudo isto determinará o futuro da criança? A sua sanidade mental? Os seus medos?
Nem tudo o que parece, é. A frieza, o calculismo, a violência psicológica estão, muitas vezes, presentes em muitas famílias, pela frieza de muitos psicopatas. Psicopatas estes que têm o dom de enganar todos os que o rodeiam, criando sobre si a imagem da pessoa perfeita.
Um livro que deveria ser lido por todos, não apenas os que passam por isto, mas por todos os pais, para que situações assim não continuem a acontecer, como acontecem na realidade. 
Recomendo!

Dicker, Joël (2024). Um Animal Selvagem. Lisboa: Alfaguara Portugal.

                                          
Tradução: José Mário Silva
Nº de páginas: 528
Início da leitura:02/06/2024
Fim da leitura: 04/06/2024

**SINOPSE**
"No dia 2 de julho de 2022, um par de delinquentes prepara-se para assaltar uma grande joalharia na cidade de Genebra. O engenhoso plano em nada se parece com um roubo comum.

Vinte dias antes, nas margens do Lago Léman, Sophie Braun está pronta para comemorar o seu quadragésimo aniversário. Tem uma vida de sonho: mora com a família numa mansão cercada pela floresta, num mundo idílico e aparentemente intocável. Contudo, os alicerces desta ilusão estão prestes a estremecer.

O marido de Sophie oculta inexplicáveis segredos. O vizinho mais próximo, um agente da polícia de reputação impecável, torna-se obcecado por Sophie e espia todos os seus movimentos, até os mais íntimos. E um homem misterioso oferece-lhe um presente que colocará a vida de Sophie em perigo. Serão necessárias muitas viagens ao passado, longe de Genebra, para traçar as origens desta intriga diabólica, da qual ninguém escapará ileso. Nem sequer o leitor.

Um thriller de tirar o fôlego, assinado pelo autor que, desde A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert, se tornou um fenómeno editorial sem par, capaz de agarrar e ludibriar até o mais cético ou engenhoso leitor."
Sou um pouco suspeita. Gosto da forma como Dicker escreve quase 600 páginas, que lemos sem dar por isso, irremediavelmente presos à história. Vai alternando passado e presente, conseguindo manter o suspense do início ao fim. Uma história que não conseguimos largar enquanto não terminamos. Um thriller viciante e envolvente. Aconselho vivamente!

Pinto, Jorge; Renan, Evandro; Nozomi, Talita (2024). Tempo, em busca da felicidade perdida. Lisboa: Iguana.

Nº de páginas: 104
Início da leitura: 03/05/2024
Fim da leitura: 04/05/2024

**SINOPSE**
"Esta é uma história sobre o tempo, o tempo que não para, sobre aqueles que só conseguem ser felizes no passado e que, além de lembrar, precisam de desesquecer. Uma história sobre um homem que todos os dias atualiza um calendário feito de pequenos arbustos, um homem que se castiga e cumpre uma penitência auto imposta, esquecido pelo seus, por um crime acidental.

Um livro sobre solidão, amor e o imparável avanço dos ponteiros do relógio."
Esta novela gráfica, muito bem ilustrada, conta-nos uma história sobre um homem que vivencia o tempo de forma dolorosa, penitenciando-se por algo que fez e que leva a filha a ignorá-lo quando passa por ela e pela suposta neta na rua. Mas haverá tempo para a redenção, a desulpabilização, a aceitação? O tempo é tão efémero que, se calhar, não o aproveitamos da melhor forma e há muitas coisas que nos passam ao lado. Aconselho!

Ernstsen, Martin; Hamsun, Knut (2021). Fome - novela gráfica. Amadora: Cavalo de Ferro.

Tradução: Liliete Martins
Nº de páginas: 232
Início da leitura: 29/05/2024
Fim da leitura: 02/05/2024

**SINOPSE**

"Obra inaugural da grande literatura moderna, Fome, do prémio Nobel de Literatura Knut Hamsun, foi publicado há mais de um século.

Numa abordagem tão fiel quanto original ao romance de Hamsun, o artista norueguês Martin Ernstsen adapta para novela gráfica esta história protagonizada por um jovem escritor que deambula faminto e delirante pela cidade de Kristiania, oferecendo ao leitor uma experiência estética e literária singular.

Traduzido diretamente do norueguês por Liliete Martins."
Apesar de considerar esta novela gráfica muito bem conseguida, quer a nível escrito, quer a nível gráfico, considero que o livro Fome de Knut Hamsun é tão descritivamente gráfico que formei uma história visual na minha cabeça. Nestes casos, é difícil desligar a imagem criada na mente e ler a história de outra forma. É como um filme, nem sempre as personagens e ambientes correspondem à imagem que criámos na nossa mente. Acredito que esta adaptação também terá a ver com a faixa etária a quem se destina - alunos de 15 - 17 anos (ensino secundário) e que tenha havido uma tentativa de amenizar os sentimentos fortes que a obra de Knut nos transmite e a forma crua como o faz. Ainda assim, a sequência narrativa segue bastante a obra original e, se tivesse lido numa ordem inversa, provavelmente teria adorado esta novela gráfica.

Reis, Patrícia (2024). A Desobediente - Biografia de Maria Teresa Horta. Lisboa: Contraponto.

Nº de páginas: 424
Início da leitura: 28/05/2024
Fim da leitura: 01/06/2024

**SINOPSE**
"A dor e o abandono chegaram cedo à vida de Teresinha, a filha mais velha de um dos mais prestigiados médicos da capital e de uma mulher livre e corajosa, descendente dos marqueses de Alorna, que nas ruas e nos melhores salões de Lisboa rivalizava em encanto com Natália Correia. A menina que haveria de ser poetisa vê a morte de perto quando ainda mal sabe andar, sobrevive às depressões da mãe, chegando mesmo a comer uma carta para a proteger. É dura e injustamente castigada e as cicatrizes hão-de ficar visíveis toda a vida, de tal modo que a infância e a adolescência de Maria Teresa Horta explicam quase todas as opções que tomou. Sobreviver ao difícil divórcio dos pais, duas figuras incomuns, com as quais estabeleceu relações impressionantes de tão complexas, foi apenas uma etapa.

Mas quanto deste sofrimento a leva à descoberta da poesia? E quanto está na origem da voz activista de uma jovem que há-de ser uma d’As Três Marias, as autoras das famosas «Novas Cartas Portuguesas», e protagonistas do último caso de perseguição a escritores em Portugal, que recebeu apoio internacional de mulheres como Simone de Beauvoir e Marguerite Duras? A insubmissa, que se envolve por acaso com o PCP e mantém intensa actividade política no pré e no pós-25 de Abril; a poetisa, a mãe, a mulher que constrói um amor desmedido por Luís de Barros; a grande escritora a quem os prémios e condecorações chegaram já tarde (ainda que, em alguns casos, a tempo de serem recusados), entre outras facetas, é a Maria Teresa Horta que Patrícia Reis, romancista e biógrafa experimentada, soube escrever e dar a conhecer, nesta biografia, com a destreza e a sensibilidade que a distinguem.
Gostei muito desta biografia. Primeiro pela grande mulher e escritora biografada. Segundo, porque muito bem documentada, ao que acresce a amizade entre a Patrícia Reis e Maria Teresa Horta, que permitiu a realização de entrevistas que foram uma mais-valia para a construção de uma narrativa fidedigna. Finalmente, porque gosto da escrita despojada de artificialismos e elegante de Patrícia Reis. 
O facto de Maria Teresa Horta ser uma mulher de convicções fortes, tanto na sua escrita como no jornalismo, valeram-lhe alguns problemas. Portugal não estava (e será que já está?) preparado para a forma de pensar, a necessidade sempre premente de dizer o que pensa, de ter uma voz ativa e de lutar pela liberdade das mulheres, de Maria teresa Horta. Portugal não estava preparado e demorou a perceber o talento desta poetisa. Acredito que quem ler esta biografia terá vontade de ler todas as obras que ainda não leu da autora. Recomendo muito este livro!

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Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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