Faria,
Rosa Lobato de (2010). Os Três Casamentos
de Camilla S. Alfragide: Edições ASA.
Numa
narrativa pessoal, biográfica e emotiva, Os
Três Casamentos de Camilla S, de Rosa Lobato de Faria, é um romance envolvente,
que cativa não só pela intensidade das vivências narradas pela protagonista,
como pela beleza e expressividade da linguagem, num ritmo que envolve e prende
desde a primeira página.
Aos
90 anos, Camilla, entrega à sua neta os seus diários, para que ela os reveja,
corrija e os transforme num livro de, e paço a citar, “leitura amena e
portuguesa”.
Camilla
vive desde cedo com os tios, após a morte precoce dos pais, vítimas de
tuberculose. Paca é a sua ama de leite, uma adivinha, mestre em artes da
bruxaria, que a cria, a educa e que a acompanha ao longo da sua vida e a quem
Camilla considera como a sua verdadeira mãe.
Aos
doze anos, os tios comunicam-lhe que casará com um médico, Monsieur Seabra, de
pouco mais de quarenta anos e, de casamento marcado, Camilla apenas questiona
se pode levar consigo as suas bonecas.
Paca
ensina-lhe tudo o que Camilla tem de saber sobre o casamento, a puberdade e a
entrega ao marido, aconselhando-a a que, para ser feliz, deverá escutar o seu
sangue, abrir-se ao mistério e entregar-se ao prazer. O marido, entretanto,
aguarda pacientemente que ela se torne numa mulher.
Quando
Camilla faz 15 anos, o marido organiza um baile para a apresentar à sociedade.
Nesse baile, Camilla dança com André Sobral, a quem deixa elogiar, cortejar e
murmurar o desejo de um encontro no dia seguinte.
É
quando a vê nos braços de outro, que o marido se apercebe que já é uma mulher e
que lhe pertence.
Paca
prepara-a para a noite em que Emídio pretende ensiná-la, para que nunca se
esqueça, do que significa ser casada.
Mas
terá o seu envolvimento com André terminado, mesmo com o afastamento que se vai
impondo entre eles?
É
em Londres que Camilla é mãe pela primeira vez e que perde o marido.
Regressa
a Portugal para tentar recuperar a casa da Estrela, quando recebe uma carta a
mencionar as dívidas que o marido deixou em Lisboa.
Começa
a trabalhar como pianista para uma modista da época, uma tal Madame Armandine,
momento da vida de Camilla de que não se orgulha, mas que contribuiu para o seu
amadurecimento.
Volta
a casar, desta feita com Salomão, um engenheiro abastado, com quem também vive
um período de felicidade. Tem, entretanto, outro filho, desta vez de André.
Este
acontecimento acaba por levá-la a um divórcio.
Casa-se,
depois de alguns anos, com Alexandre, um antigo amigo da família, sogro do seu
filho mais velho, que lhe proporciona uma felicidade serena, um companheirismo,
cumplicidade e confiança, levando-a a prescindir da paixão.
Passo
a citar duas passagens nas quais Camilla resume bem o que significaram para ela
os seus casamentos e a forma como vivenciou as suas relações:
“Não
sei se conseguirei acabar de contar a minha vida, se é que ela já não se contou
a si própria. Mas pelo menos, gostaria de falar dos meus três casamentos porque
eles pautam a vivência de três mulheres diferentes que são todas eu. Poderia considerar
três ciclos que se interligam e se separam, se sobrepõem e se distinguem, que
entre si se criticam, se julgam e se perdoam: o ciclo do sonho, o ciclo do
corpo e o ciclo do coração. Espero serenamente o ciclo da alma”.
“Pensa-se
que uma mulher se deita com um homem sempre pelo mesmo motivo, mas não é assim.
Há mil razões para uma mulher receber um homem no seu corpo. Ao longo da minha
aventurosa vida deitei-me por obrigação, por paixão, por medo, por necessidade,
por amor ou por prazer mas nunca, como com o Alexandre, por ternura infinita,
por repouso secreto, por procura da paz.”
Célia Gil
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