Agualusa, José Eduardo (2006). O Vendedor de Passados. Lisboa: Publicações Dom Quixote.
Nº
de páginas: 231
Início
da leitura: 23/05/2021
Fim da leitura: 23/05/2021
O
Vendedor de Passados é
um livro escrito por José Eduardo Agualusa e é muito peculiar. Fazendo lembrar
uma fábula, a história chega-nos através de uma osga, o Eulálio, que se sentia
ignorada por Félix Ventura até ao dia em que ele a ouviu rir. A partir daí, Félix
passa a chegar mais cedo a casa e a conversar com ela, pelo que ela chega a
pensar que já se sentem ligados por “um fio de amizade”. Além de testemunha,
confidente, esta é uma osga com sonhos e emoções.
Félix,
um negro albino, residente em Luanda, apresenta-se, normalmente, como um
genealogista, mas o que ele realmente faz é vender passados que lhe encomendam,
sendo uma espécie de traficante de memórias, um negócio secreto com que
lucravam ambas as partes. Ele, que as vendia, e quem lhas comprava também, uma
vez que passava a ter um passado com ilustres ancestrais, uma árvore
genealógica, até com fotografias dos avós e bisavós. Compravam um passado
decente, uma família numerosa, mostrando-se, às vezes, muito exigentes. Os seus
clientes eram, geralmente, empresários políticos, generais, pessoas importantes
da emergente burguesia angolana.
Esta
construção de passados é, para Félix, de certa forma, fácil, uma vez que possui
uma vasta biblioteca, herdada pelo pai, que era alfarrabista. O seu interesse
pelos livros, pelas histórias, a pesquisa que efetua, permitem-lhe criar
árvores genealógicas verosímeis.
Um
livro diferente, bem escrito, revelando um grande sentido de humor por parte do
escritor, uma imensa criatividade. O final também é surpreendente.
Não
é um livro fácil, mas é um livro que nos faz pensar. Até que ponto pode ir a
manipulação da memória? Só seremos alguém se tivermos um passado brilhante? Até
que ponto não seremos todos nós criadores de passados? Ao recordarmos o
passado, não o fazemos de forma pessoal, recriando e ficcionando acontecimentos
de acordo com os nossos desejos? Não escrevemos todos nós o nosso passado? Até
que ponto, a guerra e a perda de alguma identidade esteve na origem desta
necessidade de recriar passados, sem manchas de sangue, de guerra, de opressão?
Aconselho a
leitura!
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