O Abismo do Esquecimento, Paco Roca/Rodrigo Terrasa

Roca, Paco; Terrasa, Rodrigo (2024). O Abismo do Esquecimento. Benavente: Ala dos Livros.

Tradução: Ricardo Magalhães Pereira
Nº de páginas: 304
Início da leitura: 09/02/2025
Fim da leitura: 16/02/2025

**SINOPSE**
"A 14 de setembro de 1940, 532 dias depois de a Guerra Civil Espanhola ter terminado, José Celda e outros onze homens foram fuzilados pelo regime franquista em Paterna, Valência e, com eles, enterrado numa vala comum. Após mais de sete décadas, e depois de um percurso longo e conturbado pelos meandros burocráticos e políticos de um país que convive mal com a memória do seu passado, Pepica, filha de José, agora com oitenta anos (tinha 8 quando o pai foi morto), conseguiu finalmente localizar e recuperar os seus restos mortais para assim restaurar a sua dignidade.

Na batalha pessoal que Pepica Celda travou contra o esquecimento, o papel de Leôncio Badía foi decisivo. Naquela época, Leôncio era um jovem republicano que, depois de sair da prisão, se viu condenado a trabalhar como coveiro no cemitério da cidade. Obcecado pelo sentido da vida e pela ordem do universo, e pondo em risco a sua própria sobrevivência, colaborou secretamente durante anos com as viúvas dos fuzilados para permitir a posterior identificação dos seus corpos e enterrando-os da forma mais digna possível.

Em O Abismo do Esquecimento, Paco Roca viaja ao passado para recuperar, juntamente com o jornalista Rodrigo Terrasa (que desempenha um papel importante na documentação e contribuição de ideias), a história real de Leôncio e José, exemplo das dezenas de milhares de espanhóis que foram violentamente fuzilados após o fim do conflito em Espanha. Acompanham também a luta de Pepica Celda num intrincado e comovente labirinto que tenta desvendar as contradições de um país que parece desprezar a sua memória."

Esta é uma obra de grande profundidade emocional, abordando temas como o envelhecimento, a perda de memória e o impacto da doença de Alzheimer na vida das pessoas. A história é tocante e retrata, com sensibilidade, o sofrimento e as dificuldades enfrentadas pelos pacientes, as suas famílias e as pessoas que cuidam deles.
A ilustração de Paco Roca complementa magistralmente o tom introspetivo e melancólico da narrativa. O estilo gráfico é sombrio, mas com uma certa suavidade, evocando empatia, através de traços delicados e cores suaves, que acompanham as emoções das personagens e transmitem a sensação de desorientação e esquecimento.
O enredo desenrola-se com uma cadência tranquila, refletindo a fragmentação da memória do protagonista. A narrativa é não linear, algo que reforça a desconexão e a dificuldade de a personagem principal se lembrar do passado. 
As personagens são genuínas e sensíveis, sendo as suas motivações e dilemas explorados de maneira a cativar o leitor. O protagonista, com a sua luta interna contra o esquecimento, é uma figura com a qual muitos podem se identificar, especialmente aqueles que convivem com a doença ou com a perda gradual das faculdades mentais.
A ação de O Abismo do Esquecimento decorre durante a ditadura franquista em Espanha, mais precisamente no período pós-Guerra Civil Espanhola, que se estende por várias décadas, destacando-se as décadas de 1940 e 1950.
Este período foi marcado por uma forte repressão política, social e cultural, e a obra toca, de forma subtil, nas consequências de um regime autoritário que moldou a vida de muitas pessoas, afetando a sua memória histórica, política e pessoal. A história desenrola-se num contexto em que os ecos da guerra e da ditadura ainda reverberam nas vidas dos personagens. Aconselho veementemente este livro!

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