Coelho,
João Pinto (2017). Os Loucos da Rua Mazur.
Alfragide: Leya.
Neste
romance, João Pinto Coelho aborda a história de uma comunidade da “rua
Mazur”, situada na Polónia, uma sociedade que convivia pacatamente, não fazendo
prever a crueldade praticada pelos cristãos em relação aos judeus durante a II
Guerra Mundial. O convívio inicial é substituído, de forma perversa, pela denúncia
e antissemitismo extremistas, que acontecia entre os polacos, sem que fossem
necessários campos de concentração para se viver uma situação infernal de fragmentação
da sociedade e de execução.
Uma
narrativa que nos prende desde o início e para a qual é necessária alguma
concentração, uma vez que vai mudando o espaço, o tempo da ação e os próprios
acontecimentos se vão intercalando.
Tudo
começa com dois velhos, Yankel, cego, dono de uma livraria em Paris, que só
aceitava como amantes quem se transformasse nos seus olhos e lhe prometesse “maratonas
de leitura” e Eryk, amigo de infância de Yankel, que o procura para escrever um
livro, depois de anos a fio a escrever supostos ensaios do único que queria
escrever. Para tal, considera que precisa da ajuda de Yankel que, apesar de
cego, teve sempre uma visão mais ampla de todos os momentos e acontecimentos.
Apresenta-se na livraria com a sua mulher, Vivianne, a fria editora de Eryk.
Mas quem seria mesmo esta Vivianne? EryK está doente e não quer morrer sem se
redimir com o livro que quer escrever.
A
narrativa, a partir deste momento, passa a ser a duas vozes, a de Yankel, que
fala e a de Eryk, que escreve, dando dinamismo e diferentes perspetivas de cada
acontecimento.
Eryk decide começar este romance pela inocência e é assim que conhecemos a história
de Yankel, Eryk e Shionka, na adolescência. Um triângulo perturbador de amizade
e amor. O primeiro, cego e judeu; o segundo, cristão e maquiavélico e a última,
uma bela jovem convenientemente muda. E é neste ambiente inocente que começa a
ser brilhantemente abordada a história de uma comunidade polaca de shtetl, uma pequena cidade no leste da europa,
de cristãos e judeus, de sãos e loucos, que se fragmenta com a invasão de
alemães e russos, uma invasão cruel que haveria de a dizimar.
“Quando as cinzas assentaram, ficaram apenas um
judeu, um cristão e um livro por escrever.”
Os Loucos da Rua
Mazur, prémio
Leya 2017, é, sem dúvida, um livro marcante que aconselho vivamente à leitura.
Célia Gil
0 Comentarios