A Bailarina de Auschwitz, Edith Eger

Eger, Edith (2018). A Bailarina de Auschwitz. Porto Salvo: Saída de Emergência.

Poderia ser apenas mais um relato sobre o Holocausto, mas não é. É uma obra muito bem escrita, que se lê com o coração nas mãos, mas que vai para além de uma vivência traumatizante, uma vez que nos apresenta um exemplo, o exemplo de uma mulher que viveu os piores horrores, que passou por todas as dificuldades, traumas pós-holocausto, exclusão social, mas que conseguiu repensar e refazer a sua vida. Hoje, com 92 anos, continua uma força da natureza, mesmo depois de tudo o que vivenciou. Tornou-se psicóloga, e especialista em stress pós-traumático, tendo decidido escrever um livro para contar o que aconteceu, mas, principalmente, para mostrar que todas as pessoas têm alternativas na vida.
Numa madrugada de 1944, a família - que residia em Kassa, na Hungria - foi acordada pelos nazis. Viveram quase toda a guerra sem saberem o que se passava com os judeus na Europa. Edith sonhava ser bailarina e, até ser deportada, trabalhava diariamente para atingir esse objetivo.
"Não sabíamos de nada. Os meus pais tinham bilhetes para irmos para a América e não os usaram. Não fazíamos ideia do que se estava a passar. Nunca ouvir falar de Auschwitz até ao dia em que cheguei lá vi a tabuleta a dizer: O trabalho traz a liberdade. Mesmo assim não sabia onde estava até ver o Dr. Mengele que me separou da minha mãe. Os meus pais morreram nas câmaras de gás nessa mesma noite. Eu vi a chaminé e o fogo sair e disseram-me que eles estavam lá a arder."
Acompanhada pela irmã mais velha, Magda, Edith começou o percurso pelas mãos dos nazis frente a Joseph Mengele, o homem que ficou conhecido como Anjo da Morte, pelas experiências que realizou em seres humanos, em especial em crianças e gémeos.
A jovem foi obrigada a dançar, e foi nessa noite, que descobriu a primeira estratégia para sobreviver - "Fechei os olhos quando dancei para o doutor Mengele, imaginei a música de Tchaikovsky e estava a dançar o Romeu e Julieta na Opera House de Budapeste".
Ela reconhece que muita da resistência lhe vem da forma como decidiu encarar o mundo, logo aos 16 anos "Não sei de onde me veio a ideia mas imaginei, que de alguma forma, seriam os nazis a pagar com a consciência o que estavam a fazer. Eram eles os verdadeiros prisioneiros. Não sei como criei dentro de mim esse mundo em que me podiam espancar, enviar para a câmara de gás, mas nunca poderiam matar o meu espírito."
Em dezembro de 1944, Edith e a irmã mais velha, Magda, foram retiradas de Auschwitz e seguiram numa marcha da morte através da Europa. Em maio de 1945 foram libertadas na Áustria, quando ambas davam já poucos sinais de vida. Um soldado americano notou a mão de Edith mover-se ligeiramente numa pilha cadáveres.
De regresso à terra natal Edith e Magda reencontram a irmã, Klara, que passou o último ano da guerra com um professor católico. As três são os únicos elementos da família que residia na Europa a sobreviverem.
Durante os 20 anos seguintes a jovem sobrevivente esconde totalmente a experiência que teve em Auschwitz. Ninguém sabe que ela foi vítima dos nazis. Escondeu-o porque pensou que assim poderia esquecer mais depressa.
Foi já como psicóloga que percebeu que a estratégia não estava a resultar. Nos anos 80 regressou ao antigo campo de concentração na Polónia "Perdoar-nos é muito difícil e ainda estou a fazê-lo. Demorei cerca de 40 anos até começar realmente a dar-me autorização para libertar a culpa e a vergonha. Não sei porque é que tinha a vergonha e a culpa de ser sobrevivente, mas foi ao ponto de faltar à minha licenciatura porque achava que não o merecia porque os meus pais estavam mortos".

A História deve ser contada para que não se repita.
                                                                                               Célia Gil

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