Faciolince, Héctor Abad (2023). Somos o Esquecimento Que Seremos. Lisboa: Alfaguara.
Tradução: Margarida Amado AcostaN.º de páginas: 336
Início da leitura: 16/11/2024
Fim da leitura: 18/11/2024
**SINOPSE**
"A obra-prima do escritor colombiano é um comovente tributo à memória pessoal, familiar e política do seu pai. Um dos romances latino-americanos mais celebrados do século XXI.
A 25 de Agosto de 1987, o médico colombiano Héctor Abad Gómez é assassinado por paramilitares na cidade de Medellín, a poucos dias de umas eleições em que era candidato. Seis balas na cabeça puseram fim a uma vida de luta contra a opressão e a desigualdade social, num país amordaçado pelo narcotráfico e pela política suja.
Vinte anos depois, o filho, o escritor Héctor Abad Faciolince, decidiu contar a história do pai até ao terrível epílogo. O resultado é um livro belíssimo, poderoso no que conta, comovente no que deixa intuir, uma história dilacerada e dilacerante sobre família e pertença, sobre perda e luto.
Educação sentimental, romance de formação, radiografia da sociedade colombiana desfigurada pela violência, Somos o Esquecimento que Seremos é um romance em que pulsam memórias e afetos, escrito com a cabeça e com o coração, que emociona sem sentimentalismo, que indigna sem reclamar vingança. A obra-prima de um dos mais elogiados escritores colombianos do nosso tempo."
Este é um livro de memórias do autor colombiano, em memória do pai, vítima de homicídio em Medellín, por querer lutar contra as desigualdades sociais e contra a violência.
Aos poucos é-nos dado a conhecer este pai, que era um pai tão diferente dos outros pais, no contexto em que viviam. Não temia a morte, consciente de que essa é certa para todos, mas acreditando que cada um pode fazer a sua parte para tornar o mundo num local melhor, sem desigualdades, sem violência, sem maldade, sem ambição. Um homem que, para além de médico, era professor universitário e não tinha qualquer constrangimento em chorar em frente aos seus alunos. Um homem que sabiamente dizia que as pessoas já nascem desiguais, "E não devido a fatores biológicos, mas a fatores sociais (condições de vida, desemprego, fome)". O seu jardim esplendoroso, de roseiras, era sinal de muita dedicação, um ensinamento de que nada se consegue sem esforço e entrega. Um homem que mimava os filhos com afeto.
Não é um livro de fácil leitura, é denso, compacto e é, aos poucos, que nos vamos ligando às personagens, à sua forma de pensar e de agir. Como diz o próprio autor, "A memória é um espelho opaco que se fez em cacos ou, melhor dizendo, é feita de intemporais conhas de recordações dispersas numa praia de olvidos." Cabe ao leitor ir juntando esses cacos até à totalidade da história lhe chegar plenamente.
"...o egoísmo e a indiferença são características dos que são cegos para a evidência, pois estão satisfeitos com as suas boas condições e negam as más condições dos outros."
Não podia deixar de registar aqui o poema de Jorge Luís Borges, cujo primeiro verso deu título a este livro:
Aqui. Hoje.
Já somos o esquecimento que seremos.
A poeira elementar que nos ignora
e que foi o ruivo Adão e que é agora
todos os homens e que não veremos.
Já somos na tumba as duas datas
do princípio e do término, o esquife,
a obscena corrupção e a mortalha,
os ritos da morte e as elegias.
Não sou o insensato que se aferra
ao mágico sonido de teu nome:
penso com esperança naquele homem
que não saberá que fui sobre a Terra.
Embaixo do indiferente azul do céu
esta meditação é um consolo.
– Jorge Luis Borges (Tradução: Charles Kiefer)