Histórias Soltas Presas Dentro de Mim

Monginho, Julieta (2024). Corpo Vegetal. Porto: Porto Editora.

N.º de páginas: 176
Início da leitura: 15/09/2025
Fim da leitura: 17/09/2025

**SINOPSE**

"«Ser ou não ser» é a questão com que Mimi se debate depois de conhecer Samson X, o célebre escritor americano cujo livro está a traduzir.

O corpo invadido, a vida estilhaçada, nada será como antes para esta mulher, que terá de decidir: ou age e faz ouvir a dor que toma conta dos seus dias, ou vive em silêncio o trauma e a raiva que a consomem, sem que o grito se escute, sem que a justiça se faça.

No novo romance de Julieta Monginho, a dicotomia consentimento versus abuso sexual ganha protagonismo, partilhando-o com as repercussões jurídicas e as consequências devastadoras que uma agressão desta natureza tem na vida de quem a sofre. Mas, com a mestria a que já nos habituou, a autora não deixa no tinteiro uma última nota de esperança, e Corpo Vegetal mostra como, mesmo no meio da dor e do trauma, é possível encontrar um novo fôlego, um novo caminho."

Corpo Vegetal, de Julieta Monginho, não é um livro que se ofereça ao leitor de forma imediata ou complacente. A sua leitura exige entrega, quase um abandono deliberado das defesas que normalmente erguemos perante narrativas de dor e de injustiça. A linguagem poética, cadenciada e densa, por vezes cria um certo distanciamento inicial, mas é justamente nesse ritmo peculiar que reside o poder da obra: o de nos enredar, lentamente, até já não conseguirmos escapar ao que nos é contado. O enredo cru, despido de ornamentos fáceis, coloca-nos diante de uma realidade difícil de encarar, mas tristemente reconhecível — a vulnerabilidade das mulheres, tantas vezes silenciadas, tantas vezes reduzidas a um corpo que se tenta apagar ou domesticar.

A protagonista, mergulhada nas dúvidas que cercam a denúncia de um abuso sexual, é confrontada não apenas com o agressor, mas também com a corrosiva desconfiança social que ameaça devorá-la. O romance expõe, assim, com firmeza e delicadeza, a violência mais subtil e mais devastadora: a de não se acreditar na palavra da vítima. Julieta Monginho dá corpo literário a esse dilema, transformando-o numa experiência sensorial e emocional que não se esquece. Gostei muito e recomendo.

Nelson, Suzanne (2025). As Bibliotecárias de Lisboa. Lisboa: Topseller.

Tradução: José Remelhe
N.º de páginas: 368
Início da leitura: 13/09/2025
Fim da leitura: 15/09/2025

**SINOPSE**
"Lisboa, 1943. A 2.ª Guerra Mundial assola a Europa.
Cidade glamorosa à beira do caos, Lisboa aloja espiões de duas fações. Entre eles, encontram-se Selene Delmont e Beatrice Sullivan, bibliotecárias de Boston. Oficialmente recrutadas para recolher livros proibidos, ambas são, na verdade, agentes secretas cuja missão consiste em infiltrarem-se na rede de espionagem do Eixo.
Em breve, contudo, dão por si envolvidas em jogos de enganos com dois dos homens mais conhecidos da cidade: um barão português exilado, Luca Caldeira, e um espião letal de nome de código Gable. Enquanto Selene seduz Luca nos seus luxuosos salões de baile, Bea, mais dada aos livros, mergulha no mundo sombrio dos informadores de Gable. Quando, porém, uma traição desvenda uma teia de mentiras cuidadosamente tecida, tudo aquilo por que ambas lutaram é posto em causa. Será este o seu ponto de rutura?
Inspirada por acontecimentos reais, Suzanne Nelson cria um enredo cativante com duas mulheres singulares, cuja coragem, determinação e amizade foram capazes de resistir à devastação da guerra."
Ao iniciar a leitura de As Bibliotecárias de Lisboa, de Suzanne Nelson, a expectativa de encontrar uma narrativa centrada na vida das bibliotecárias, com descrições ricas sobre livros e bibliotecas, cedo se revelou defraudada, uma vez que a obra se orienta sobretudo para uma intriga de espionagem em plena Lisboa de 1943. 
Essa deslocação do foco inicial pode gerar alguma deceção para o leitor que procure uma exaltação do universo literário ou das instituições culturais. Contudo, a autora compensa essa ausência com uma trama envolvente, marcada pelo mistério, pelo romance e pelo pano de fundo histórico da Segunda Guerra Mundial. A cidade de Lisboa, nesse período, surge como espaço privilegiado de encontros clandestinos e de jogos diplomáticos, e é justamente esse cenário que ganha protagonismo ao longo da narrativa. O reconhecimento dos lugares, o retrato da atmosfera de uma Lisboa dividida entre neutralidade e intriga internacional, bem como a forma como as personagens se movem nesse ambiente de tensão e ambiguidade, tornam a leitura cativante e dão ao romance um carácter singular. Assim, apesar da frustração inicial, o livro conquista pelo enredo e pela reconstituição de época, oferecendo ao leitor uma experiência literária que, embora distinta da esperada, acaba por se revelar aprazível e enriquecedora.
A autora parte de personagens e situações reais (como as bibliotecárias espiãs da IDC, como Adele Kibre e Maria Josepha Meyer; Aristides de Sousa Mendes, que terá inspirado a criação da personagem Luca Caldeira, meritório pelos seus extraordinários esforços em assegurar passagem segura para milhares de passageiros durante a guerra). E, por incrível que pareça, quando referidas as minas de volfrâmio de Portugal (contrabandeado para a Alemanha nazi), lá surgem as nossas Minas da Panasqueira, através do nome da minha cidade - Fundão (Cabeço do Pião).
 Aconselho a quem gosta de romances de ficção histórica, espionagem e romance.

Hart, Emilia (2025). As Sereias. Porto: Porto Editora.

Tradução: Célia Correia Loureiro
N.º de páginas: 352
Início da leitura: 12/09/2025
Fim da leitura: 13/09/2025

**SINOPSE**
"Uma história de irmãs separadas por séculos, mas unidas pelo poder do mar.
2019: Lucy acorda no quarto do ex-namorado, a asfixiá-lo. Horrorizada, foge para casa da irmã, Jess, numa cidade costeira em Nova Gales do Sul, em busca de conforto e de uma explicação para os sonhos vívidos que precederam o ataque. No entanto, Jess está desaparecida. Enquanto aguarda o seu regresso, Lucy vai descobrindo estranhos rumores sobre a cidade: desaparecimentos de homens ao longo de várias décadas, um bebé abandonado numa gruta à beira-mar, sussurros de mulheres vindos do oceano. Os sonhos de Lucy parecem mais reais do que nunca…
1800: Mary e Eliza são condenadas ao exílio e deixam o seu lar na Irlanda, embarcando num navio de prisioneiros com destino à Austrália. À medida que o barco as afasta de tudo o que lhes é familiar, começam a reparar em mudanças bizarras nos próprios corpos.
As sereias é um romance extraordinário sobre mulheres que enfrentam o inesperado e aceitam o potencial que descobrem em si mesmas. Uma história de resiliência feminina de cortar a respiração."
As Sereias, de Emilia Hart, é um mergulho numa narrativa onde o mar é tão personagem quanto as protagonistas. Entrelaçando passado e presente, o romance fala de irmandade, dor herdada, força feminina e o poder misterioso da natureza. Não se limita a um romance com mitos, é também uma reflexão sobre violência, desejo, sobrevivência e transformação. Em termos de recomendação, sugeriria-o para leitores de fantasia literária ou realismo mágico com apetência para o histórico, mas não necessariamente para quem procura ação intensa ou resoluções claras — aí talvez o ritmo ou a ambiguidade possam pesar. É uma obra que brilha, sobretudo pelo seu ambiente, pela evocação do mar, pelas personagens femininas carregadas de dor, força e mistério, e pela maneira como o passado e o presente se entrecruzam. Não é uma leitura leve — exige envolvimento emocional, disponibilidade para aceitar ambiguidades —, mas, para quem gosta desse tipo de narrativa, recompensa bastante. É um livro de lendas e água, de segredos e murmúrios, de mulheres que recusam ser silenciadas pelo tempo ou pelo medo. Recomendo!

Woods, Evie (2025). A Misteriosa Paradia da Rue de Paris. Porto: Singular.

Tradução: Luís Filipe Silva
N.º de páginas: 288
Início da leitura: 09/09/2025
Fim da leitura: 11/09/2025

**SINOPSE**
"Aninhada no meio das ruas empedradas de Compiègne, havia uma padaria em nada igual às outras. Pela cidade corriam rumores de que os seus bolos tinham um sabor mágico capaz de expulsar até a mais sombria mágoa. Uma mera dentada num croissant poderia trazer sorte, desbloquear uma memória preciosa há muito esquecida ou revelar desejos ocultos…
Depois de uma importante perda, Edith Lane sente que a sua vida precisa de uma mudança. Ao ver um anúncio de emprego, candidata-se à vaga que a faz viajar da Irlanda para Paris, onde se encontra a encantadora padaria para a qual foi contratada. Porém, quando se trata de Edie, a receita para o desastre não precisa de muitos ingredientes: uma quantidade pouco saudável de ilusões e uma pitada de desespero são suficientes para gerar o caos. É o que acontece quando percebe que não irá trabalhar na cidade dos seus sonhos, e que a padaria fica a uma hora de comboio da capital. Ao chegar lá, são muitos os dias em que pensa ter feito a escolha errada, sem perceber os mistérios daquele estranho lugar e o encanto que exerce sobre todos os que provam as suas iguarias. Contudo, o tempo e um segredo escondido sob as tábuas do soalho revelam-lhe não apenas uma história antiga cuja pista vale a pena seguir, mas também o caminho para encontrar o lugar a que verdadeiramente pertence."
Há livros que nos chegam às mãos como um verdadeiro bálsamo para a alma leitora — e A Misteriosa Padaria na Rue de Paris, de Evie Woods, é um desses casos. Não se trata de uma narrativa destinada a mudar radicalmente a forma como pensamos o mundo ou a literatura, mas antes de uma história envolvente, plena de charme e com um manifesto sentido de humor que a torna irresistível.

O romance constrói-se a partir de uma premissa simples, mas eficaz: personagens que carregam consigo fragilidades, sonhos por cumprir e um quotidiano por vezes cinzento encontram, naquela pequena padaria parisiense, uma centelha de magia capaz de alterar o rumo das suas vidas. Woods tem o talento de equilibrar leveza e emoção sem cair em excessos, oferecendo-nos uma narrativa que, sem exigir demasiado, nos envolve desde as primeiras páginas.

A escrita é acessível, quase coloquial, mas com uma cadência que prende e diverte. A autora joga com o humor de forma natural, nunca forçada, e cria situações que nos arrancam sorrisos genuínos. É este tom descontraído que faz do livro uma leitura perfeita para intercalar com obras mais densas ou exigentes: uma espécie de pausa literária que, em vez de quebrar o ritmo, o enriquece.

Não será, certamente, um título para quem procura uma literatura carregada de simbolismos ou experimentalismos, mas é um excelente exemplo de como a chamada “ficção de conforto” pode ser bem construída, cativante e memorável. 

Siascia, Leonardo. Uma História Simples. Lisboa, 2025: Editorial Presença.

Tradução: João Pedro Vala
N.º de páginas: 80
Início e fim da leitura: 08/09/2025

**SINOPSE**
"Sicília, década de 1980. O telefone toca na esquadra: ao que parece, um velho diplomata quer falar com a polícia porque encontrou uma coisa estranha em sua casa. A partir daqui, tudo sucede numa espécie de ato contínuo, sem tempo para deduções ou explicações. Embora tempo pareça ser tudo o que a polícia tem a mais e não use convenientemente naquele lugar.

Ao que parece, afinal, houve um suicídio. Seria simples, a história, não fosse o jovem polícia deparar, na sua investigação, com uma enorme parede intransponível, composta pelas intrincadas argamassas que dão pelo nome de máfia, polícia, corrupção e, afinal, toda a Sicília.

Retrato de um sítio onde a verdade não conhece definição e a justiça teima em não chegar, o último livro de Sciascia é um magnífico exercício de economia de escrita, uma pequeníssima janela que abrimos e da qual, tremendamente espantados, vemos tudo."

Uma História Simples, de Leonardo Sciascia, é uma obra breve mas intensa, onde a ironia do título se revela logo no enredo: o que aparenta ser um suicídio simples, transforma-se num caso de corrupção, silêncio cúmplice e instituições comprometidas. 

Com uma escrita direta e precisa, Sciascia elabora uma parábola sobre a justiça e a sua fragilidade, colocando no centro um agente da autoridade solitário que resiste, quase em vão, ao conformismo do sistema. A obra, embora enraizada na atmosfera siciliana, transcende o local para espelhar uma realidade universal: a verdade só tem valor se houver quem a sustente, e, em sociedades corrompidas, ela acaba quase sempre silenciada.

Pequeno na forma, mas imenso na reflexão, este livro é um retrato amargo da condição humana e da impotência da razão perante o poder, mantendo-se de uma atualidade perturbadora.

Jackson, Shirley. Contos Sombrios. Lisboa, 2025: Cavalo de Ferro.

Tradução: Catarina Ferreira de Almeida
N.º de páginas:256
Início da leitura: 07/09/2025
Fim da leitura: 08/09/2025

**SINOPSE**
"Algo de podre se esconde nos subúrbios da América. Uma senhora idosa vigilante dos bons costumes é a autora de cartas anónimas que semeiam a suspeita entre os vizinhos, um regresso a casa depois de um dia de trabalho transforma-se numa paranoica perseguição, uma jovem comete uma série de roubos sem que ninguém dela desconfie, um cidadão exemplar revela ser um assassino em série. Seja na comunidade, no seio familiar ou na intimidade do eu, nada é o que parece, e nenhum lugar é seguro…

Volume póstumo, Contos Sombrios reúne as dezassete histórias mais perturbadoras de Shirley Jackson, incluindo A Possibilidade do Mal, a que foi atribuído o Edgar Allan Poe Award em 1966. Considerada mestre do gótico literário e do suspense psicológico, a autora norte-americana inspirou gerações de escritores na forma exímia com que retrata a crueldade do quotidiano e a ambiguidade humana, num mundo onde a loucura e o terror estão à espreita."
Contos Sombrios, de Shirley Jackson, é uma colectânea de dezassete contos. O que à partida se apresenta como banal — uma vizinhança tranquila, uma dona de casa zelosa, um gesto de cortesia — transforma-se rapidamente em terreno fértil para o desconforto e a inquietação. Jackson domina como poucos a arte de revelar o insólito no quotidiano, desmontando a falsa segurança da vida suburbana americana e expondo os impulsos mais obscuros que se escondem por detrás das convenções sociais. A sua prosa é precisa, de uma simplicidade enganadora, capaz de criar tensão através de pequenos detalhes, de um diálogo interrompido ou de uma vírgula que altera por completo o sentido de uma frase. Mais do que histórias de terror no sentido clássico, estes contos são exercícios de horror psicológico, onde a crueldade e a alienação humanas surgem disfarçadas de normalidade. Mantêm uma atualidade perturbadora: mostram que o mal raramente se manifesta de forma espectacular, mas infiltra-se silenciosamente no tecido da vida comum. É precisamente nesta ambiguidade — entre o familiar e o inquietante — que reside a grandeza de Shirley Jackson, e Contos Sombrios é um testemunho exemplar do seu génio literário.

Osman, Richard (2022). O Homem que Morreu Duas Vezes. Lisboa: Planeta.


Tradução: Carmen Saraiva
N.º de páginas: 384
Início da leitura: 04/09/2025
Fim da leitura: 06/09/2025

**SINOPSE**
"Elizabeth, Joyce, Ron e Ibrahim estão à procura de alguma paz e tranquilidade, na luxuosa comunidade para reformados onde vivem, depois de terem resolvido o seu primeiro caso. Resolver um novo assassinato não fazia parte dos seus planos de reforma. Mas parece que estão com pouca sorte. Um visitante inesperado - um velho amigo (ou quem sabe algo mais…) de Elizabeth - aparece desesperado por ajuda. Está em apuros. Foi acusado de roubar diamantes, no valor de 20 milhões de libras, ao homem errado. E a sua vida corre perigo. O primeiro corpo é encontrado. Mas não será o último. Este difícil caso envolve um mafioso impaciente, reuniões regadas a vinho, segredos antigos, pulseiras da amizade, decisões importantes como a de adotar ou não um cão… E um assassino implacável que não hesitaria, um segundo, em matar os quatro simpáticos reformados de Coopers Chase.

Será que os membros de O Clube do Crime das Quintas-Feiras vão ser capazes de encontrar o assassino (e, já agora, os diamantes), antes do assassino os encontrar a eles?

Richard Osman está de volta com o seu famoso e carismático quarteto de detetives para mais uma aventura divertida e inteligente. Impossível parar de ler. Mais de 3,5 milhões de leitores já se juntaram a O Clube do Crime das Quintas-Feiras."
Richard Osman volta a surpreender com O Homem que Morreu Duas Vezes, o segundo volume da série que acompanha o peculiar Clube do Crime das Quintas-Feiras. Se o primeiro livro já tinha conquistado pelo conceito original – um grupo de reformados que investiga crimes com mais argúcia do que a polícia – este segundo livro consolida a fórmula e aprofunda a ligação entre o leitor e as personagens.

A história mantém o ritmo ágil e o humor subtil que caracterizam Osman, mas ganha em densidade emocional, sobretudo porque conhecemos melhor as fragilidades, manias e cumplicidades do quarteto protagonista. Elizabeth, Joyce, Ron e Ibrahim já não são apenas figuras excêntricas: tornam-se companheiros de leitura, daqueles de quem temos saudades quando fechamos o livro. A forma como se apoiam mutuamente, entre piadas mordazes e gestos de ternura inesperada, é um dos pontos mais fortes da narrativa.

Quanto à intriga policial, a teia é habilmente construída, cheia de reviravoltas e de pistas falsas, sem nunca perder a leveza que distingue esta série do típico “thriller” sombrio. Osman consegue equilibrar o mistério com um olhar profundamente humano sobre a amizade, a velhice e o valor da experiência.

Gostei particularmente da forma como o autor joga com o contraste entre a aparente tranquilidade da comunidade de reformados e o submundo do crime internacional. Essa justaposição gera situações inesperadas, divertidas e, ao mesmo tempo, plausíveis dentro do universo criado.

Portabales, Arantza (2025). Beleza Vermelha. Lisboa: Publicações Dom Quixote.

Tradução: Rui Elias
N.º de páginas: 416
Início da leitura: 01/09/2025
Fim da leitura: 02/09/2025

**SINOPSE**
"Um cadáver, seis possíveis assassinos.
Ninguém está livre de suspeitas, nem mesmo a própria vítima.
Um crime passional em Santiago de Compostela, com ecos de Joël Dicker.

Seis suspeitos jantam no jardim de uma luxuosa casa nos arredores de Santiago de Compostela enquanto o corpo de Xiana Alén, de quinze anos, jaz no chão do seu quarto coberto de sangue, como se fosse uma instalação artística: os pais, a tia Lía Somoza - uma pintora de renome internacional -, um casal de amigos e a tia idosa das irmãs Somoza.

Todos os indícios apontam para Lía, mas alguns dias depois ela tenta suicidar-se e é internada num hospital. O comissário Santi Abad, com a ajuda de Ana Barroso - uma polícia jovem, forte e temperamental, com quem desenvolverá uma relação intensa e conflituosa -, terá de desvendar os segredos mais bem guardados da família Alén Somoza, uma das famílias mais poderosas e ricas da alta sociedade galega.

Beleza Vermelha é uma intriga excecional, em que nada é o que parece e ninguém é quem diz ser, que confirma Arantza Portabales como a nova senhora do romance policial espanhol."
Quando peguei em Beleza Vermelha, confesso que esperava um policial daqueles que não se conseguem largar, cheios de ritmo e tensão. A premissa parecia promissora: um crime brutal numa escola religiosa, uma vítima jovem, segredos escondidos e uma dupla de inspetores para nos guiar pela investigação. Tudo isto parecia reunir os ingredientes certos para me prender da primeira à última página.

No entanto, à medida que avançava, senti que a narrativa se arrastava. Há um excesso de repetições — tanto nos diálogos como nas descrições — que tornam a leitura mais lenta do que deveria ser. Dei por mim a querer saltar páginas, à espera de um avanço significativo na investigação, mas o enredo parecia sempre a circular no mesmo ponto. Para quem procura a adrenalina típica de um thriller, esta opção narrativa pode ser frustrante.

Ainda assim, não posso negar que Arantza Portabales tem um talento especial para explorar as personagens. Há um cuidado na forma como expõe fragilidades, tensões e contradições, que torna o livro mais denso e humano do que muitos policiais que já li. E, mesmo assim, não consegui sentir empatia pelas personagens.

O problema é que, para mim, essa escolha acabou por pesar demasiado na balança. Fiquei com a sensação de que a autora sacrificou o ritmo da intriga em nome da introspeção. E, sendo honesta, não era isso que eu procurava quando comecei o livro.

Lourey, Jess (2025). Raptadas. Lisboa: Topseller.

Tradução: Pedro Póvoa
N.º de páginas: 368
Início da leitura: 30/08/2025
Fim da leitura: 31/08/2025

**SINOPSE**
"Minnesota, verão de 1980

Três meninas aventuram-se a entrar numa floresta, apesar da lenda local sobre o Homem de Borracha, que as assombra implacavelmente. Apenas uma regressa naquele dia, envolta num silêncio mortal, e sem qualquer memória do que aconteceu. O mistério que rodeia as Raptadas toma o país de assalto.

Verão de 2022

A inspetora Van Reed e o cientista forense Harry Steinbeck são destacados para um caso de homicídio perturbador: uma mulher foi enterrada viva e, na sua mão, descobriu-se um colar pertencente a uma das meninas desaparecidas. Se Van Reed segue o seu instinto, Harry baseia-se em factos, mas ambos estão desesperados por encontrar o assassino antes que ele mate novamente — e ambos estão ligados ao caso original, de maneiras que dificilmente quererão partilhar. À medida que a equipa consegue relacionar o crime que tem em mãos com o outro cometido há décadas, Van Reed luta contra memórias da sua própria infância de pesadelo, e contra o medo de que a descoberta da verdade sobre as Raptadas a leve por um caminho do qual também ela possa nunca mais regressar."
Raptadas, de Jess Lourey, é um thriller psicológico que recupera com mestria o espírito dos grandes romances de mistério do passado, recusando a superficialidade dos thrillers atuais e cativando o leitor com uma construção cuidadosa, envolvente e emocionalmente poderosa.

A história começa no verão de 1980, numa pequena localidade de Minnesota, onde três meninas entram numa floresta assombrada pela lenda do “Homem de Borracha” — mas apenas uma regressa, silenciosa, traumatizada e sem memória do que viveu. Décadas mais tarde, um crime chocante reacende o horror: uma mulher encontrada enterrada viva segura um colar que pertenceu a uma das desaparecidas.

O enredo alterna entre passado e presente, com a inspetora Van Reed, que segue o instinto, e o cientista forense Harry Steinbeck, que confia em factos — ambos ligados ao caso original de formas pessoais que vão-se desvelando ao longo da narrativa. Esta estrutura temporal gera tensão, provoca reflexão e mantém o leitor colado às páginas: um verdadeiro "page-turner".

O que me encantou neste thriller é a forma como Lourey aborda traumas profundos, cicatrizes invisíveis e memórias enterradas. Sentimos a dor da protagonista, a urgência da investigação e o suspense psicológico, tudo isso envolto numa atmosfera que remete para os thrillers clássicos, aqueles que exploravam o medo sem recorrer a modismos ou facilidades narrativas.

Além disso, a profundidade emocional do texto não impõe sacrifícios ao ritmo nem ao suspense — pelo contrário: a dor, o trauma e o instinto de sobrevivência são motores poderosos da história. A construção é inteligente e humana, com personagens complexos que resistem a estereótipos. O enredo faz-nos pensar sobre o peso do passado, sobre como eventos traumáticos podem moldar a vida e como a verdade pode ser devastadora mesmo quando libertadora.

E o final? Deixa-me na expetativa de ler uma continuação!

Recomendo.

 Pires, Maria José (2025). O Mistério da Cor. Lisboa: Edições Flamingo.

N.º de páginas: 30
Ilustração: José Oliveira
Início e fim da última leitura: 31/08/2025

**SINOPSE**

"O Afonso é um menino muito curioso, que sonha vir a ser cientista. Não perde uma oportunidade para aprender e, também, para mostrar os seus conhecimentos, que são um pouco acima da média para a sua idade. Para além disso, ele tem uma grande preocupação em sensibilizar os amigos para a importância do saber. A sua irmã, Matilde, tem por ele uma grande admiração.

O Afonso tem uma habilidade especial para encontrar uma palavra, uma expressão ou até uma situação que possa ser usada para induzir conversas nas quais possa brilhar.

Nesta história, foi a reação da irmã quando o Afonso a foi acordar para ver a neve que, surpreendentemente, tinha caído na noite de 24 de dezembro:

(…)
— Levanta-te! Não são muitas as oportunidades de ver neve no nosso jardim.
(…)
— Estás a ver neve "ao vivo e a cores" — disse o Afonso.
— A cores!? Mas a neve é branca! — exclamou a Matilde.
(…)
— "Ao vivo e a cores" é uma expressão que significa "presencialmente"… mas, espera… a propósito de "cores" vou aproveitar para te explicar umas coisas muito interessantes sobre a COR. Vais ficar surpreendida, tenho a certeza. Sabias que a luz que vem do Sol é composta por várias luzes e de várias cores? O arco-íris é a prova disso.
— Sabes como se forma o arco-íris!? — questionou a Matilde.
(…)"
Esta foi a terceira leitura que fiz desta história maravilhosa. As personagens, jovens cativantes, especialmente o Afonso, um jovem encantador e inteligente, que não só aprende, mas deseja compartilhar o sabor do conhecimento com os outros — especialmente ao introduzir conceitos científicos de forma lúdica, conduzem-nos a uma aventura pelo mistério, que continua a ser, a cor. 
É uma obra que diverte, ensina e emociona, motivando a curiosidade e valorizando o saber em contexto familiar. O enfoque simples, mas eficaz, nas explicações científicas e na relação entre irmãos agrega autenticidade e afeto à narrativa.
As ilustrações suaves apresentam-nos as personagens e os espaços que elas frequentam de uma forma tão bonita, que realçam a história, já de si cativante.
Recomendo muito a leitura para todas as idades, em especial para crianças e jovens.

Jaeggy, Fleur (2025). O Medo do Céu. Lisboa: Alfaguara. 

Tradução: Ana Cláudia Santos
N.º de páginas: 128
Início e fim da leitura : 29/08/2025

**SINOPSE**
Estas são histórias trespassadas pela morte, ensombradas pela vingança do céu, desenhadas com clarividente onirismo.

Há uma mãe que detesta a filha e lhe nega um destino promissor; uma criada vinda de uma aldeola italiana com um objeto de devoção; duas mulheres que se conhecem no jardim zoológico e se juntam, honrando uma promessa; a assombração de um cão; gémeos órfãos que tomam posse de uma casa em ruínas e se dedicam a enfeitar caixões.

Há flores murchas; ares lacustres estagnados; instituições governamentais para velhos, ou incapacitados; objetos de culto profanados e vingativos; pais e filhos que se punem; a vaidade na velhice. As personagens destes contos temem o céu e agradecem-lhe, já que apenas o céu conhece as profundezas dos seus desejos.

Fleur Jaeggy volta a afinar aqui a tessitura única — trama, linguagem, imaginação — que transforma cada um dos seus livros em peças cintilantes de inquietação humana e literária."
É impossível não reconhecer a singularidade da escrita breve, fragmentada e de uma clareza cortante, mas ao mesmo tempo impregnada de uma estranheza que incomoda, de Jaeggy.

O livro apresenta um conjunto de narrativas onde a infância, a solidão e a morte se insinuam de forma quase obsessiva. São histórias povoadas por personagens que se movem em ambientes fechados, muitas vezes claustrofóbicos, onde a ternura é sempre negada ou adiada. O título — O Medo do Céu — sugere essa tensão permanente entre o desejo de transcendência e o peso de uma realidade fria, implacável.

A economia verbal obriga-nos a abrandar, a regressar a frases que, de tão nuas, se tornam quase oraculares. Ao contrário de narrativas que procuram desenvolver personagens e enredos, Jaeggy prefere oferecer lampejos, fragmentos que funcionam como visões: incompletas, mas poderosas. Essa recusa de explicação pode ser frustrante para alguns leitores, mas é também aquilo que confere à sua escrita uma força hipnótica.

O Medo do Céu não é literatura de conforto; é uma experiência de estranheza e de silêncio, feita de sombras e de fulgores breves. Ao fecharmos o livro, ficamos com a sensação de que estivemos diante de uma autora que escreve contra a fluidez, contra a pressa, e que, nesse gesto, consegue tocar num território mais profundo: o da inquietação essencial que nos acompanha.

Jaeggy, Fleur (2024). Viagem no Proleterka. Lisboa: Alfaguara.

Tradução: Ana Cláudia Santos
N.º de páginas: 120
Início da leitura: 29/08/2025
Fim da leitura: 29/08/2025

**SINOPSE**
"«As crianças desinteressam-se dos pais quando são abandonadas. […] Com determinação, sem tristeza. Tornam-se alheias. Por vezes, hostis. Já não são elas os seres abandonados, mas são elas que batem mentalmente em retirada. E vão-se embora. Em direção a um mundo sombrio, fantástico e miserável. E, no entanto, por vezes exibem felicidade.»

Esta é a história de uma viagem que cruza os mares da Grécia, ou pelo menos da recordação dessa viagem, filtrada pelo tempo. Johannes e a filha conhecem-se mal e mantêm uma relação distante. Reencontram-se no Proleterka, e procuram aí remediar um hiato sem remédio, recompor uma história de família, alimentar uma ideia de amor. Sobre eles, paira contudo a sombra de episódios passados, fragmentos espectrais que não chegam a diluir-se. É então que esta travessia se transforma numa outra: somos levados, pela mão da protagonista, à descoberta do prazer e do desejo, sem o filtro do interdito, sem o limite da convenção.

Viagem no Proleterka — tal como Felizes anos de castigo — mergulha no núcleo da inquietação, tome esta a forma de uma mãe gélida, ou de um pai desconhecido, ou de um marinheiro impetuoso. Da escrita fulgurante de Fleur Jaeggy, ninguém sai incólume."
Viagem no Proleterka, de Fleur Jaeggy, é um daqueles livros curtos que, apesar da brevidade, constituem uma boa experiência de leitura. A autora escreve com uma frieza lapidar, quase cirúrgica. Nada sobra, nada é gratuito. O resultado é um texto austero, mas de uma intensidade rara.

A narrativa acompanha a viagem de uma jovem com o pai a bordo do navio Proleterka, e é nesse espaço suspenso que se encenam tanto a descoberta da sexualidade como o afastamento afetivo entre pai e filha. O que poderia ser uma história de iniciação é, nas mãos de Jaeggy, um retrato sombrio, em que a proximidade nunca gera intimidade e o desejo nunca chega a ser reconfortante. Há uma atmosfera de desamparo constante, como se a protagonista se movesse num mundo onde a ternura fosse impossível.

O estilo de Jaeggy é talvez o que mais divide leitores: a sua escrita é seca, distante, quase impessoal, recusando o calor narrativo a que tantos romances nos habituaram. Mas é precisamente nessa contenção que reside a sua força. As imagens surgem rápidas, cortantes, e o silêncio entre as palavras diz tanto quanto o que está escrito.

Não é uma leitura que procure agradar. É, antes, uma experiência estética exigente, que pede atenção ao ritmo e aceitação da dureza. Embarquem nesta viagem!

Erpenbeck, Jenny (2024). Kairos. Lisboa: Relógio D'Água.


Tradução: António Sousa Ribeiro
N.º de páginas: 336
Início da leitura: 27/08/2025
Fim da leitura: 28/08/2025

**SINOPSE**

"Berlim. 11 de Julho de 1986. Encontram-se por acaso num autocarro. Ela é uma jovem estudante. Ele é mais velho e casado. Nasce uma atracção súbita e intensa, alimentada por uma paixão partilhada pela música e pela arte e intensificada pelo secretismo que precisam de manter.
Mas, quando ela se afasta por uma única noite, ele não lhe consegue perdoar. Uma fissura surge entre os dois, abrindo espaço para a crueldade, a punição e o exercício do poder.
Entretanto, o mundo em redor está a mudar. À medida que a RDA começa a ruir, também as velhas certezas e lealdades se desfazem, anunciando uma nova era cujas conquistas trazem consigo uma perda profunda.
Um relato íntimo e devastador do caminho de dois amantes pelos escombros de uma relação, num dos períodos mais turbulentos da história europeia."
O romance acompanha a relação entre uma jovem estudante e um homem mais velho, uma ligação que oscila entre a paixão avassaladora e a sombra da manipulação, sempre em paralelo com a lenta derrocada da República Democrática Alemã. Erpenbeck procura fundir o íntimo e o político, mostrar como as estruturas de poder que moldam um país também contaminam os afetos. A intenção é forte e ambiciosa, mas a execução nem sempre cativa. A prosa é minuciosa, por vezes quase clínica, e essa atenção ao detalhe, que podia ser uma virtude, acaba por saturar: capítulos que se arrastam, diálogos que parecem repetir-se, uma cadência que exige do leitor mais paciência do que recompensa.

Há momentos de grande lucidez — quando a autora expõe a fragilidade da memória, ou quando deixa entrever como o amor pode degenerar em prisão — mas esses instantes surgem dispersos, perdidos num tecido narrativo que, a certa altura, se torna cansativo. Talvez seja essa a razão do incómodo: Kairos tem todos os elementos de uma obra importante, mas a sua densidade aproxima-se mais do exercício intelectual do que da experiência viva da leitura.

 Kawabata, Yasunari (2024). O Arco-Íris. Lisboa: Publicações Dom Quixote.

Tradução:Francisco Agarez
N.º de páginas: 208
Início da leitura: 24/08/2025
Fim da leitura: 27/08/2025

**SINOPSE**
"Poucos anos depois de terminada a Segunda Guerra Mundial, e com o Japão ainda abalado pelos seus efeitos, duas irmãs - filhas do mesmo pai mas de mães diferentes - esforçam-se por compreender o novo mundo em que caminham para a idade adulta. Asako, a mais nova, vive obcecada pelo propósito de encontrar uma terceira irmã, ao mesmo tempo que experimenta o amor pela primeira vez.

Enquanto isto, Momoko, filha primogénita do seu pai - assombrada pela perda do namorado kamikaze e pelos últimos dias tormentosos que viveram juntos -, procura refúgio numa série de romances doentios e ambas se sentem incapazes de escapar ao legado das suas falecidas mães.

Romance sensível e profundo sobre os persistentes traumas da guerra, os indestrutíveis laços familiares e a inelutabilidade do passado, O Arco-Íris é uma obra lancinante e melancólica de um dos maiores escritores japoneses."
Há livros que não se deixam ler à pressa, e O Arco-Íris de Yasunari Kawabata é precisamente um desses. A narrativa move-se como a luz que se reflete na água: subtil, demorada, muitas vezes indecifrável à primeira vista, mas carregada de uma beleza que só se revela a quem aceita o compasso lento da contemplação.

Kawabata, conhecido pelo seu estilo delicado e profundamente introspetivo, constrói aqui uma história que não procura o enredo imediato ou a catarse fácil. Antes, convida o leitor a entrar num espaço onde as personagens vivem entre silêncios, memórias e pequenas epifanias quotidianas. Há uma cadência quase musical na forma como descreve os gestos, os lugares, os olhares — como se cada detalhe fosse um fragmento de vida suspenso no tempo.

O arco-íris do título funciona menos como metáfora óbvia e mais como uma presença difusa: algo que surge e desaparece, que não se pode reter. Do mesmo modo, a própria narrativa escapa à ânsia de linearidade; é feita de imagens que brilham e logo se dissipam, obrigando-nos a ler devagar, a regressar a passagens, a aceitar que a plenitude está no intervalo entre as palavras. É essa mesma recusa de velocidade que torna o romance profundo: Kawabata não descreve apenas acontecimentos, mas a forma como eles ressoam no íntimo das personagens.

Longe de ser uma leitura “fácil” ou de consumo imediato, O Arco-Íris exige entrega, como quem contempla um jardim em silêncio até reparar que cada folha, cada sombra, guarda uma história. 

Apesar de reconhecer estas qualidades e de apreciar muito os livros de Kawabata, reconheço que este me custou a ler. Não é, definitivamente um livro para ler no verão, entre mergulhos. Será, talvez, ideal para nos acompanhar em dias de outono ou inverno, entre um chá ou café, com uma manta, no sofá. Assim, achei a história um pouco monótona e repetitiva.

Kincaid, Jamaica (2025). Lucy. Lisboa: Alfaguara.

Tradução: Alda Rodrigues
N.º de páginas: 184
Início da leitura: 23/08/2025
Fim da leitura: 24/08/2025

**SINOPSE**
"Lucy nasceu numa ilha das Antilhas, o cenário de férias idílico para qualquer turista, mas que para ela nunca foi senão uma colónia refém do sol e da seca, uma prisão insuportável. A fim de quebrar as amarras e, ao mesmo tempo, libertar-se do amor sufocante da mãe e da cruel indiferença do pai, aos dezanove anos, Lucy decide partir para outra ilha, Manhattan, em busca de um presente e de um futuro só seus.

Começa, então, a trabalhar como au pair na casa de uma família de classe média. Bonitos, ricos e felizes, Lewis, Mariah e as suas quatro filhas aparentam ser a família perfeita. Porém, Lucy não tarda a aperceber-se das fendas naquela fachada supostamente impecável. É que, na opulenta e vibrante Nova Iorque, como em Antígua, a desolação pode reinar à volta de uma mesa posta.

Perseguida pelo passado, limitada pelas circunstâncias de ser uma mulher negra, Lucy procura na escrita o lugar onde pode ser o que deseja. Com um olhar perspicaz, entre a raiva e a compaixão, intolerante tanto para com os dominados como para com os dominadores, tentará então reinventar-se à luz de quem foi e de quem poderá vir a ser."
Este é um romance breve, mas intenso. 
A protagonista, Lucy, é uma jovem antilhana, que viaja para os EUA para trabalhar como "au pair". A história põe em confronto duas realidades: a do passado colonial e das marcas deixadas pela educação e tradição no seu país de origem, e a nova vida, num espaço aparentemente mais livre, mas igualmente carregado de tensões sociais, raciais e de género.
A protagonista não procura agradar; pelo contrário, questiona e rompe com as convenções. É uma leitura que inquieta, que confronta e questiona.
Confesso que esperava mais, que não consegui, de todo, compreender ou conhecer a protagonista, nem perceber todas as suas motivações, ou melhor, tudo o que se oculta por detrás das suas atitudes e da sua impulsividade. 

Carr, Garrett (2025). O Rapaz Que Veio do Mar.  Alfragide: Edições Leya.

Tradução: Ana Saldanha
N.º de páginas: 344
Início da leitura: 21/08/2025
Fim da leitura: 23/08/2025

**SINOPSE**
"Esta é a história de uma família, da comunidade de uma aldeia piscatória e de uma criança.
Estamos em 1973. Numa comunidade unida na costa oeste da Irlanda, um bebé é encontrado abandonado na praia. Batizado de Brendan por Ambrose Bonnar, o pescador que o adota, o rapaz tornar-se-á uma fonte de fascínio e esperança para uma comunidade apanhada na tempestade de um mundo em rápida mudança.
Ambrose, mais à vontade no mar do que em terra, acolhe Brendan em sua casa por amor. Mas é uma decisão que fraturará a sua família e forçará este homem a tentar compreender-se a si próprio e àqueles de quem cuida.
Ambientado ao longo de vinte anos, O Rapaz Que Veio do Mar, de Garrett Carr, é um romance sobre um rapaz inquieto a tentar encontrar o seu lugar no mundo. É uma exploração dos laços que nos fazem e nos unem, enquanto uma família e uma comunidade avançam irresistivelmente para o futuro."
Este romance juvenil combina realismo com o fantástico, explorando temas como identidade, a solidão, a aceitação e o poder da amizade.
A intriga começa com a chegada misteriosa de uma criança à costa de uma pequena e isolada comunidade marítima.
O ritmo acompanha o movimento das marés - ora calmo e contemplativo, ora intenso e comovente. Ideal para ser lido em silêncio, de preferência ao som das ondas. 
Confesso que esperava mais, talvez porque a premissa era realmente boa.  Ainda assim, aconselho.

Thompson, Kate (2025). O Clube dos Livros Proibidos. Porto: Singular.

Tradução: Mafalda Abreu
N.º de páginas: 420
Início da leitura: 17/08/2025
Fim da leitura: 21/08/2025

**SINOPSE**
«Em tempo de guerra, duas mulheres lutam para restaurar a esperança.
Em 1940, a Alemanha invade a Ilha de Jersey, transformando um local outrora pacífico e acolhedor numa prisão sem muros, mas com leis severas.
Os alemães ordenam a destruição de todos os livros existentes na ilha considerados uma ameaça ao regime nazi, mas Grace La Mottée, a única bibliotecária local, recusa-se a obedecer e decide escondê-los. Inspirada pelos leitores assíduos da biblioteca, Grace cria um clube de leitura que serve de escape à dura realidade que os ilhéus enfrentam. Ao mesmo tempo, Beatrice Gold, funcionária dos correios, contribui com uma outra forma de resistência.
À medida que a ocupação se prolonga, a presença dos alemães gera violência, perda e caos, e os pequenos atos de coragem das duas mulheres tornam-se mais arriscados – e mais essenciais – do que nunca.
Um tributo inesquecível ao amor pela leitura e ao poder dos livros, inspirado em histórias verídicas e inéditas da Segunda Guerra Mundial.»
Apesar de ser uma história ficcional, esta obra baseia-se em vários acontecimentos e pessoas reais e constitui uma homenagem às bibliotecas como espaços de resistência e de refúgio, em Dublin dos anos 60.
As personagens femininas são bem trabalhadas, fortes e muito corajosas.
A escrita é acessível, envolvente e humana, equilibrando momentos de dor e injustiça com outros de esperança, amizade e descoberta. Aconselho a leitura.

Donlea, Charlie (2025). A Rapariga Sem Passado. Lisboa: Editorial Presença. 

Tradução: Fátima Andrade
N.º de páginas: 400
Início da leitura: 15/08/2025
Fim da leitura: 16/08/2025

**SINOPSE**
"A verdade, quando revelada, pode ser mais mortal do que qualquer mentira.
Sloan Hastings, uma jovem patologista forense, submete o seu ADN num site de genealogia com um único objetivo: candidatar-se a uma bolsa de investigação. Na verdade, Sloan tem algumas reservas quanto à experiência: é adotada e nunca pensou procurar os seus pais biológicos.
Os testes de ADN revelam que Sloan é Charlotte Margolis, conhecida como Baby Charlotte, desaparecida misteriosamente com os pais, em 1995. Em busca de respostas, Sloan viaja até Cedar Creek, no Nevada, onde conhece a família biológica. Embora inicialmente acolhedores, os Margolis escondem segredos sombrios e nem todos parecem satisfeitos com aquele regresso. À medida que Sloan investiga o passado, percebe que há quem prefira que certas verdades permaneçam enterradas - mesmo que isso signifique matar."
A Rapariga Sem Passado, de Charlie Donlea, é um thriller psicológico que cumpre exemplarmente a promessa de agarrar o leitor desde as primeiras páginas e mantê-lo em tensão até ao desfecho. O autor constrói uma narrativa em que o suspense não surge de forma brusca, mas antes se desenvolve em crescendo, alimentando a curiosidade e a ansiedade a cada novo capítulo. Essa cadência é talvez um dos pontos mais fortes do livro: a sensação de que há sempre mais uma peça de um puzzle por descobrir, o que impele a leitura contínua e quase compulsiva.

A escrita é ágil e direta, sem excessos estilísticos, o que a torna particularmente apelativa para uma leitura de verão — leve no ritmo, mas intensa na emoção. Donlea sabe criar atmosferas de incerteza e desconfiança, explorando bem o impacto da memória, da identidade e da verdade oculta. Ao mesmo tempo, as personagens são desenhadas de forma suficientemente complexa para que a intriga não se limite à ação, mas também ao psicológico, contribuindo para o efeito global de inquietação.

Se por um lado não se trata de um romance inovador em termos de temática — uma jovem sem passado, marcada por segredos e um mistério que a envolve —, por outro, a forma como a intriga é conduzida e a escalada gradual do suspense fazem dele uma leitura viciante. 
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Sobre mim

Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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