Botchan, Natsume Sōseki

Sōseki , Natsume. Botchan. Lisboa: Presença, 2025.

Tradução do japonês para o francês: Le Serpent à Plumes
Tradução do francês: Helder Guégués
N.º de páginas: 168
Início da leitura: 05 de junho de 2025
Fim da leitura: 06 de junho de 2025

**SINOPSE**
"Um clássico literário japonês aclamado pela crítica e pelos leitores em todo o mundo.

Arrogante, imaturo e com uma visão rígida da vida, Botchan é um jovem professor de Matemática, residente em Tóquio. Depois da morte dos seus pais, aceita partir para uma pequena localidade rural no distante distrito de Matsuyama e vê-se confrontado com muitos e distintos desafios, por parte tanto dos seus alunos como dos seus colegas.

Com uma moral rígida e uma visão simplista da vida num mundo cheio de contradições e complexidades, Botchan terá de aprender que ser adulto pode ser bem menos tranquilo do que perspetivava e irá confrontar-se com as suas próprias limitações e as de quem o rodeia.

Por meio de uma crítica mordaz às atitudes de superioridade, preconceito e falta de autocrítica, Botchan é também uma história de crescimento, em que as falhas do protagonista revelam as fragilidades da sociedade japonesa do final do século XIX e início do século XX.

Com personagens marcantes, humor irreverente e uma reflexão sobre os valores humanos, este livro continua a ser uma das obras mais amadas e influentes da literatura japonesa."
Este livro é um clássico da literatura japonesa, que combina humor e crítica social. Apesar de aparentar simplicidade, é uma obra profunda, cheia de tensões entre tradição e modernidade, honestidade e cinismo. É especialmente recomendada para quem se interessa pela cultura japonesa, pela transição histórica do Japão.
O que me surpreendeu mais foi o tom directo e quase infantil do protagonista — mas não no mau sentido. Botchan é alguém que vê o mundo de forma muito binária: ou é certo ou é errado, ponto final. Esta forma de estar, embora algo ingénua, torna-se incrivelmente humana, e, grande parte das vezes, até comovente. Ao longo do livro, dei por mim a rir das suas reacções impulsivas, mas também a sentir simpatia pela sua luta contra a hipocrisia à sua volta.
Gostei, particularmente, da maneira como Sōseki satiriza o ambiente escolar, que funciona como um espelho da sociedade. Aquilo que, à partida parece uma comédia leve sobre um professor de matemática desajeitado, transforma-se numa crítica mordaz à falta de carácter, à bajulação e ao compadrio — temas que, sinceramente, continuam bem atuais.
Algo que também me tocou foi a relação de Botchan com Kiyo, a criada, que praticamente o criou. Há entre eles um carinho verdadeiro e uma lealdade que contrasta fortemente com as relações artificiais que ele encontra no novo emprego. É uma personagem simples, mas cheia de ternura.
Por outro lado, confesso que algumas partes me pareceram um pouco repetitivas — o Botchan é tão teimoso e tão convicto nas suas opiniões que, a certa altura, quase parece que estamos a ouvir o mesmo discurso em loop. Mas talvez seja isso também que lhe dá alguma graça: é transparente, é o que é, sem filtros.
Em suma, Botchan é um daqueles livros que, apesar de ter sido escrito há mais de um século, continua surpreendentemente atual. A sua crítica social continua relevante e a sua voz narrativa, tão peculiar, é capaz de cativar leitores mesmo nos dias de hoje. Não é uma leitura pesada, mas obriga a pensar — e talvez isso seja o seu maior trunfo.

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