O Prodígio, Emma Donoghue

 

Donoghue, Emma (2017). O Prodígio. Porto: Porto Editora.

Nº de páginas: 328

Início da leitura: 10/01/2022

Fim da leitura: 13/01/2022

**SINOPSE**

A jovem Anna recusa-se a comer e, apesar disso, sobrevive mês após mês, aparentemente sem graves consequências físicas. Um milagre, dizem.

Mas quando Lib, uma jovem e cética enfermeira, é contratada para vigiar a menina noite e dia, os acontecimentos seguem um diferente rumo: Anna começa a definhar perante a passividade de todos e a impotência de Lib. E assim se adensa o mistério à volta daquela pobre família de agricultores que parece envolta num cenário de mentiras, promessas e segredos.

Prisioneira da linguagem da fé, será Anna, afinal, vítima daqueles que mais ama?
Um drama intenso sobre os perversos caminhos do fundamentalismo, mas também sobre como o amor pode vencer o mal nas suas mais diversas formas.

**OPINIÃO**

Este é o segundo livro que leio da autora e é um romance em que dificilmente não nos questionamos sobre a fé. Até que ponto a fé pode mudar a vida de um ser humano? Justificará a fé comportamentos humanos tão macabros como os relatados neste livro? Não será a fé, muitas vezes, uma forma de expiar pecados, adquirindo contornos perversos? Até que ponto a fé justifica a “esmola”? Não poderá ser a fé uma forma de mascarar os próprios crimes?

Como é possível ver através das questões que me fui colocando, e através da própria sinopse do livro, há um ambiente de misticismo, de espiritualidade, ainda que estes sejam, muitas vezes, interpretações e vivências erróneas da própria fé.

Este é um livro que choca, angustia, nos deixa “com o coração nas mãos” e vemo-nos a acompanhar esta enfermeira, Lib, contratada para provar que Anna, uma criança adorável de onze anos, consegue sobreviver estando há quatro meses sem comer, desde o seu último aniversário. A ação decorre no século XIX, numa pequena localidade da Irlanda, Lib revela-se cética, analisa em termos médicos a situação de Anna, pondera todas as hipóteses, chega a confrontar-se com a dúvida perante as suas próprias teorias, mas não desiste desta criança. O que terá levado Anna a deixar de comer? Até que ponto ela é sincera? Não passará de um embuste? Não será uma criança trapaceira que tenta enganar todos os que a rodeiam, comendo às escondidas? E até que ponto a fé não poderá cegar uma comunidade, não lhe permitindo questionar os supostos desígnios de Deus? As revelações são surpreendentes, ainda que dramáticas. Um livro que abala convicções, que questiona a resiliência humana e a fé. Ao longo da leitura, confrontamo-nos com várias emoções: dúvida, crença, revolta, raiva, desilusão…

Ainda que a autora se tenha baseado nos cerca de cinquenta casos das chamadas “Virgens-Jejuadoras” das Ilhas Britânicas, Europa Setentrional e América do Norte, entre os séculos XVI e XX, a autora frisa bem que esta é uma história ficcional. Porém, estes factos conferem à história uma maior credibilidade e verosimilhança.

Aconselho a leitura deste livro, sem reservas!

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