Histórias Soltas Presas Dentro de Mim

Dazai, Osamu (2023). Um Homem em Declínio. Lisboa: Editorial Presença.

Tradução: Manuel Alberto Vieira
Nº de páginas: 160
Início da leitura: 15/10/2025
Fim da leitura: 17/20/2025

**SINOPSE**
"«A minha vida foi marcada pela vergonha. Não consigo sequer imaginar como será viver a vida de um ser humano.»

Yozo vê-se como um verdadeiro fracasso. A sua vida - a que ele mesmo nos narra - quase pode parecer normal, mas a incapacidade que sente em perceber os outros seres humanos é absolutamente dilacerante.

Desde muito cedo, Yozo viu crescer esse fosso entre si e o resto do mundo. Na adolescência, tenta sobreviver tornando-se o palhaço da escola, mas a máscara que usa para camuflar a sua alienação cai quando a tentativa de suicídio, já na vida adulta, sai gorada.

Não dando espaço ao sentimentalismo e sem conceder ao drama o que permite à dor crua, Yozo regista, nestas páginas, a crueldade dos dias, mas, do mesmo modo, os raros momentos em que se sente ligado aos outros, em que a ternura representa um vislumbre de vida humana.

Com claros traços autobiográficos, Um Homem em Declínio é o derradeiro e mais importante romance de um dos grandes escritores japoneses do século XX, Osamu Dazai. Sobre ele, muitos escreveram tratar-se de um símbolo de uma geração, a que deixava a guerra para trás e via já os alvores de uma sociedade pós-moderna. É, sem sombra de dúvidas, um brutal e íntimo retrato da alienação individual."

Esta é uma obra profundamente introspetiva e angustiante, que mergulha na psicologia do protagonista, Yozo Oba. O livro segue a jornada de Yozo, um homem profundamente atormentado com a sua própria identidade e incapaz de se conectar verdadeiramente com os outros. Dazai constrói uma narrativa marcada por uma sensação de desconforto existencial, onde Yozo luta com a sua própria alienação e com o conceito de identidade, refletindo as suas falhas, os seus medos e os seus momentos de auto destruição.

A obra é marcada por uma escrita perturbadora, mas de grande profundidade emocional, na qual o protagonista reflete sobre as convenções sociais e sobre a sua incapacidade de se encaixar nelas. Através de suas anotações, vemos não apenas o declínio físico e psicológico de Yozo, mas também o desespero de uma pessoa que sente que não há sentido em suas ações ou na sua própria existência.

O estilo de Dazai, frequentemente descrito como desesperançado e melancólico, cria uma atmosfera tensa e densa, mas também profundamente humana. A forma como ele explora o sofrimento psicológico e a alienação é uma das forças do livro, tornando-o, quanto a mim, uma obra importante dentro da literatura japonesa.
É um livro ideal para quem aprecia histórias reflexivas que abordam a complexidade da mente humana e as dificuldades existenciais. Gostei muito e recomendo.

Sans Segarra, Manuel; Cebrián, Juan Carlos (2025). A Supranconsciência Existe, Vida Depois da Vida. Lisboa: Planeta de Livros.

N.º de páginas: 232
Início da leitura: 12/10/2025
Fim da leitura: 15/10/2025

**SINOPSE**
"O médico Manuel Sans Segarra, prestigiado cirurgião e pioneiro na investigação da Supraconsciência, em colaboração com o jornalista e empreendedor Juan Carlos Cebrián, explora as Experiências de Quase Morte (EQM) à luz de não só uma ótica científica, inspirada na neurociência e física quântica, como também de uma perspetiva espiritual.

Através de relatos reais, este livro revela uma nova compreensão sobre a consciência humana e a vida depois da morte, desafiando todas as conceções tradicionais de existência e criando um guia poderoso para superarmos os nossos medos e refletirmos sobre a nossa vida.

O livro definitivo sobre o fenómeno das Experiências de Quase Morte e o seu poder para transformar as nossas vidas."
A Supraconsciência Existe – Vida Depois da Vida, de Dr. Manuel Sans Segarra e Juan Carlos Cebrián, foi, para mim, uma leitura completamente fora da minha zona de conforto. O tema — a existência de uma consciência superior e a possibilidade de vida após a morte — é, por si só, desafiante, especialmente quando não nos movemos habitualmente neste tipo de reflexão entre a ciência, a espiritualidade e a filosofia.
Tendo em casa uma situação semelhante às descritas no livro, entre experiências-limite e a procura de sentido perante o fim da vida, aproximei-me destas páginas com curiosidade, mas também com alguma expectativa de encontrar respostas — ou, pelo menos, novas perspetivas. No entanto, talvez por ignorância minha ou, simplesmente, porque não há ainda nada de facto cientificamente provado, acabei por sentir esta leitura como algo distante, demasiado filosófica e, por momentos, até aborrecida.
Os autores esforçam-se por conciliar a linguagem médica e científica com uma dimensão espiritual que procura transcender o físico, mas o resultado, a meu ver, fica num território ambíguo. Fala-se muito sobre energia, consciência e eternidade, mas sem o suporte empírico que um leitor mais racional pode esperar — e, sem isso, a mensagem perde força.
Ainda assim, reconheço o mérito da tentativa. É um livro que pode tocar profundamente quem já tenha refletido sobre o tema, ou quem procure um olhar mais espiritual sobre a existência. Para mim, no entanto, ficou a sensação de não ter encontrado respostas — talvez porque, no fundo, essas respostas ainda não existem, ou pertencem a um plano onde a ciência e a fé raramente se encontram.

Branco, Francisco; Alves, Roberto Macedo e Sousa, Válter (2025). Camões (Re)visitado. Funchal: Sétima Dimensão.

N.º de páginas: 98
Início da leitura: 12/10/2025
Fim da leitura: 15/10/2025

**SINOPSE**
"Camões (Re)Visitado é uma obra que apresenta uma abordagem contemporânea da figura de Luís de Camões, visando torná-lo mais acessível e relevante para os leitores mais jovens e para todos os que desejam redescobrir a sua obra.

Esta banda desenhada, que combina literatura, artes visuais e pedagogia, explora as várias dimensões do poeta e da sua obra através de diferentes expressões artísticas, destacando a sua presença no imaginário português e a sua influência na cultura lusófona.

Camões (Re)Visitado é um convite a mergulhar na vida e na obra de Camões, oferecendo uma nova perspetiva sobre o poeta e o seu legado, e reforçando a sua importância na identidade cultural portuguesa."
Esta novela gráfica, concebida para celebrar o quinto centenário de Luís Vaz de Camões, parte de uma história atual em que um jovem, Martim, é interpelado pelo próprio poeta após uma apresentação desastrosa, em Lisboa. Este jovem, comparado a um perdigão que “perdeu a pena”, acaba por encontrar o espírito de Camões, que o vai interrogando ao longo da narrativa, desafiando-o e levando-o a crescer espiritualmente.
Ao longo desse diálogo entre épocas e consciências, Martim aprende o verdadeiro sentido de valores como a resiliência, a criatividade e o poder da obra que perdura no tempo. O encontro entre o jovem e o poeta transforma-se, assim, numa viagem interior de descoberta e inspiração, que ultrapassa a simples homenagem histórica.
Camões (Re)Visitado revela-se, deste modo, uma forma diferente e atual de celebrar o autor de Os Lusíadas: uma presença ousada, que mistura o clássico e o contemporâneo, e que poderá inspirar novas gerações a olhar o legado camoniano com um inovo "olhar". Há, é certo, algumas correções ortográficas de que o texto ainda carece, mas nada que não possa ser melhorado numa próxima edição.

Montes, Raphael (2025). Suicidas. Lisboa: Cultura Editora.

N.º de páginas: 384
Início da leitura: 10/10/2025
Fim da leitura: 13/10/2025

**SINOPSE**
"Ainda antes de o mundo sonhar com o terrível jogo da baleia azul, que leva jovens a tirar a própria vida, ou que a série de televisão Thirteen Reasons Why se tornasse conhecida, Raphael Montes, então com 22 anos, já tratava do tema do suicídio entre jovens, com a ousadia que virou a sua marca registada.

Neste seu primeiro livro, que a Cultura edita depois dos sucessos Jantar Secreto e Uma Família Feliz, conhecemos a história de Alê e seus companheiros, jovens da elite do Rio de Janeiro encontrados mortos na quinta de um deles em condições que indiciam que os nove amigos haviam participado num jogo de roleta-russa.

O que terá levado aqueles adolescentes, aparentemente felizes e privilegiados, a tirar a própria vida?

A inspetora Diana Guimarães terá de juntar as peças de um puzzle sangrento e de convocar as mães dos suicidas para compreender o que aconteceu.

Do autor de Beleza Fatal e de Bom Dia, Verônica, séries da Max e da Netflix."
Como acontece com os restantes livros de Raphael Montes que já li, Suicidas confirma, mais uma vez, a capacidade do autor de nos surpreender e de nos prender irremediavelmente à narrativa. Montes tem o dom de explorar o lado mais sombrio da mente humana e de o fazer com uma crueza desarmante, sem filtros nem complacência.
Não é, de todo, uma leitura fácil. É um livro que exige estômago, que desafia o leitor a enfrentar a violência e a degradação moral que se escondem sob a superfície de uma juventude aparentemente banal. O autor constrói um thriller intenso, sangrento, quase claustrofóbico, que nos obriga a encarar o que há de mais desprezível - e, simultaneamente, de mais real - no ser humano.
O enredo, centrado num pacto macabro entre jovens que decidem pôr fim às suas vidas, não é apenas um exercício de horror psicológico. É também um espelho desconfortável da nossa sociedade contemporânea, marcada pelo vazio existencial, pela pressão do sucesso e pela incapacidade de lidar com a dor e o fracasso. Suicidas é, assim, uma chamada de atenção, que nos recorda o quão frágil pode ser a linha entre o desespero e a autodestruição.
Raphael Montes escreve com uma precisão quase cirúrgica: cada detalhe, cada diálogo, cada descrição contribui para adensar a atmosfera de tensão que domina o livro do início ao fim. Mesmo quando o enredo se torna quase insuportável, é impossível largar a leitura - somos arrastados pela curiosidade, pelo medo, pela necessidade de compreender o porquê de tudo aquilo.

Vieira, M.L. (2025). Danificada. Lisboa: Iguana.

N.º de páginas: 88
Início da leitura: 09/10/2025
Fim da leitura: 10/10/2025

**SINOPSE**
"Numa fábrica do futuro, máquinas e meios de transporte são montados por um batalhão de clones. Todas mulheres, todas iguais, cada uma com um número. Elas não têm personalidade, nem ansiedades, nem se interrogam sobre a vida. Até que um dia a 2518 começa a sonhar com uma vida diferente. Sonha com a liberdade e um propósito até que... tudo começa a correr mal.

Nesta estreia impressionante, M.L. Vieira pega na ficção científica e na banda desenhada, e dá-lhe uma prosa poética e atual."
Gostei muito desta novela gráfica. Danificada, de M. L. Vieira, surpreendeu-me profundamente pela forma como conjuga a crueldade e a poesia num mesmo traço narrativo. A história decorre num mundo distópico, onde nada é deixado ao acaso: as clones existem apenas para cumprir uma função, produzir bicicletas, e são privadas de qualquer liberdade, pensamento próprio ou emoção. No entanto, é precisamente nesse cenário mecanizado e opressivo que nasce a centelha da rebeldia. A 2518, uma entre tantas outras cópias, começa a sonhar com algo que nunca conheceu: a liberdade, o toque do vento, a possibilidade de escolher o próprio destino.
O contraste entre a frieza industrial do mundo retratado e a delicadeza dos sonhos da protagonista é o que torna Danificada tão poderosa. A narrativa visual reforça essa tensão: há uma beleza melancólica nas ilustrações. M. L. Vieira consegue criar um universo onde o silêncio fala tanto quanto as palavras - e onde a esperança, por mais frágil que pareça, ganha forma e movimento.
A pergunta que ecoa até ao final - conseguirá a 2518 fugir? - é mais do que um mero suspense narrativo. É uma reflexão sobre o que significa ser livre, sobre o preço da individualidade num mundo que prefere cópias à criação. Danificada é, assim, uma leitura que emociona e inquieta, um espelho das nossas próprias lutas contra as formas subtis de controlo e conformismo. Cruel e poética, sim - mas, acima de tudo, profundamente humana.

Mãe, Valter Hugo (2024). Deus na Escuridão. Porto: Porto Editora.

N.º de páginas: 288
Início da leitura: 07/10/2025
Fim da leitura: 09/10/2025

**SINOPSE**
"«Deus é exactamente como as mães. Liberta Seus filhos e haverá de buscá-los eternamente. Passará todo o tempo de coração pequeno à espera, espiando todos os sinais que Lhe anunciem a presença, o regresso dos filhos.»
Este livro explora a ideia de que amar é sempre um sentimento que se exerce na escuridão. Uma aposta sem garantia que se pode tornar absoluta. A dúvida está em saber se os irmãos podem amar como as mães que, por sua vez, amam como Deus.
Passada na ilha da Madeira, esta é a história de dois irmãos e da necessidade de cuidar de alguém. Delicado e profundo, Deus Na Escuridão é um manifesto de lealdade e resiliência."
Em Deus na Escuridão, Valter Hugo Mãe regressa à escrita mais íntima e espiritual, aquela que nos confronta com a fragilidade humana e a força silenciosa do amor. A frase que abre o livro - «Deus é exactamente como as mães. Liberta Seus filhos e haverá de buscá-los eternamente.» -  serve como mote para toda a narrativa. É um retrato terno e doloroso da relação entre o divino, a maternidade e a capacidade humana de amar, mesmo quando o amor é uma forma de escuridão - um espaço onde nada é garantido, mas tudo é sentido com intensidade absoluta.
A história, passada na ilha da Madeira, ecoa a solidão e a beleza agreste do lugar. A paisagem insular torna-se quase uma personagem: isolada, mas plena de uma espiritualidade que acolhe e desafia. É neste cenário que dois irmãos enfrentam o peso da existência e a necessidade de cuidar - um irmão mais velho, saudável e um irmão mais novo, que nasceu "sem as origens...vinha mordido entre as pernas como se algum predador o tivesse buscado na barriga de nossa mãe". O irmão mais velho, narrador desta história, assume o papel de proteger o irmão de tudo e de todos - um cuidador sensato e terno. O livro é, acima de tudo, uma reflexão sobre a responsabilidade que nasce do amor: a ideia de que amar é, inevitavelmente, um gesto de entrega e de fé, algo que se faz sem luz, sem certezas, mas com total devoção.
Valter Hugo Mãe escreve com uma delicadeza rara, onde a ternura convive com a dor, e onde o cuidado se revela como o mais humano dos atos. Deus na Escuridão é um manifesto de lealdade e resiliência, uma meditação poética sobre o amor que resiste, mesmo quando tudo parece perdido. É um livro que pede silêncio e atenção, porque cada frase carrega um peso espiritual - o de quem sabe que amar é, talvez, o mais divino dos gestos humanos.

Destaco, de entre muitas, uma passagem, pela beleza e pela verdade que encerra e em que me revi.
"Deus é exactamente como são as mães, que criam e depois vão ficando para trás, à distância, numa distância que parece significar que não são mais precisas, e Ele, como elas, só sabe amar acima de qualquer defeito e qualquer falha, com cada vez maior saudade, mas não sabe o caminho, não sabe por onde os filhos foram, só pode suplicar que não se percam e não se percam da vontade de voltar."

Stevenson, Robert Louis. A Ilha do Tesouro. Lisboa: Editora Guerra e Paz, 2016.

Tradução: Rui Brito Santana
N.º de páginas: 288 
Início da leitura: 05/10/2025
Fim da leitura: 07/10/2025

**SINOPSE**
"História de aventura e sonhos, com personagens inesquecíveis, de Billy Bones, o homem da cicatriz, ao heróico menino e moço Jim Hawkins, ao arquetípico pirata da perna de pau que é Long John Silver, ou ao terrível e malvado capitão Flint. Todos se movem por causa de um tesouro enterrado. Que talvez um mapa ajude a localizar."


Há livros que nos acompanham desde a infância, histórias que ficam gravadas na memória como aventuras inesquecíveis. A Ilha do Tesouro, de Robert Louis Stevenson, é um desses clássicos que atravessam gerações, reinventando-se em adaptações, versões infantis e novas edições. A edição da Guerra e Paz despertou-me a curiosidade de revisitar esta narrativa, agora com outros olhos - os de um leitor adulto que guarda ainda as recordações das leituras da infância.

Lembrava-me da emoção das primeiras páginas, do fascínio pelo mapa do tesouro, dos piratas e da promessa de aventura em mares distantes. Ao regressar à obra original, encontrei um texto mais denso, mais trabalhado, que confirma o talento de Stevenson e a razão pela qual o livro é um marco da literatura de aventura. No entanto, ao mesmo tempo, percebi que parte da magia se tinha dissipado. Talvez porque, na infância, a imaginação tem um poder que o tempo suaviza; talvez porque, ao crescer, lemos de forma diferente - mais crítica, menos entregue.

Ainda assim, valeu a pena esta leitura. A Ilha do Tesouro mantém a força de um grande clássico, uma história intemporal sobre coragem, ganância, amizade e descoberta. Não é apenas um livro de aventuras, mas também uma viagem interior, tanto para quem o lê pela primeira vez como para quem regressa a ele anos depois. E, mesmo que a magia não seja exatamente a mesma, há algo de reconfortante em perceber que ela ainda lá está, à espera de ser redescoberta - talvez por outros olhos, mais jovens, prontos para se deixarem encantar novamente.

Moriarty, Laura (2014). As Estrelas Brilham na Cidade. Barcarena: Editorial Presença.

Tradução: Marta Mendonça
N.º de páginas: 368
Início da leitura: 01/10/2025
Fim da leitura: 04/10/2025

**SINOPSE**
"Em 1922, Louise Brooks tem apenas 15 anos e vive em Wichita, no Kansas, quando parte para Nova Iorque a fim de frequentar um curso de dança. Com ela vai também Cora, uma mulher mais velha e já casada, para lhe servir de acompanhante. Contudo, apesar de Louise Brooks se ter tornado mais tarde um dos grandes ícones do cinema mudo, é a vida de Cora que Laura Moriarty recria neste romance. Cora Carlisle é uma sufragista bastante convencional, que oculta os seus segredos e tem motivos próprios relacionados com as suas origens para aceitar fazer aquela viagem. Por outro lado, a diferença de idades e de atitudes entre as duas mulheres permite à autora tirar partido do que distingue as duas gerações explorando engenhosamente as múltiplas facetas das mudanças que vão ocorrendo na sociedade.
As Estrelas Brilham na Cidade é uma narrativa fascinante e muito bem documentada sobre a história e a mudança de mentalidades durante o século XX."
As Estrelas Brilham na Cidade, de Laura Moriarty, é um romance de ficção histórica, que nos transporta para o início do século XX, acompanhando a vida de duas mulheres muito diferentes, que acabam por se cruzar de forma transformadora. A história começa em 1922, quando Cora, uma mulher de 36 anos, casada e de valores tradicionais, aceita acompanhar a jovem Louise Brooks a Nova Iorque. Louise é uma adolescente ambiciosa, rebelde e cheia de energia, prestes a tornar-se numa das grandes estrelas do cinema mudo - um ícone de uma geração que viria a desafiar convenções e redefinir o papel da mulher na sociedade.

As cinco semanas que passam juntas em Nova Iorque mudam Cora profundamente. Habituada a uma vida marcada pelas convenções e pelos “bons costumes”, Cora é confrontada com um mundo vibrante, boémio e moralmente ambíguo. No meio da efervescência dos anos 20 - entre o jazz, a Lei Seca e os novos costumes - ela começa a perceber que a moral não é uma linha reta, mas um território cheio de nuances. Aos poucos, torna-se mais compreensiva, mais tolerante e menos rígida nos seus julgamentos. A viagem, que inicialmente parecia um simples favor, revela-se uma jornada de autodescoberta e de crescimento interior.

Narrado do ponto de vista de Cora, o livro oferece um olhar íntimo sobre o contraste entre a América conservadora do Centro-Oeste e o espírito livre de Nova Iorque dos anos 20. Louise Brooks, com a sua personalidade intensa e a sua história marcada por traumas, é o catalisador dessa transformação - uma jovem que, apesar das suas falhas, encarna a modernidade e a busca pela autenticidade.

Laura Moriarty escreve com delicadeza e profundidade, captando as tensões sociais e morais de uma época em mudança. A narrativa estende-se do início dos anos 1900 até à Guerra do Vietname, mostrando como o tempo molda as pessoas e as suas convicções. É uma leitura rápida, envolvente e cheia de humanidade - um retrato sensível sobre a amizade, a liberdade e o poder de nos reinventarmos.

Ao longo da narrativa, vamos conhecendo várias gerações desta família tão pouco convencional, uma vez que a protagonista consegue a proeza - rara para a sua época - de chegar a uma idade avançada, ultrapassando os noventa anos. Essa longevidade permite a Cora assistir às profundas transformações do século XX, desde as mudanças nos costumes até às convulsões sociais e políticas que marcaram a América. Através dos seus olhos, percebemos como o mundo rural e conservador do início do século se foi diluindo num novo modo de vida, mais urbano, mais livre, mas também mais incerto.

Aconselho vivamente a leitura deste livro!

 Ayoyama, Michiko (2024). Chocolate Quente às Quintas-Feiras. Alfragide: Lua de Papel.

Tradução: C.S.C. Marques
N.º de páginas: 176
Início da leitura: 28/09/2025
Fim da leitura: 30/09/2025

**SINOPSE**
"Numa rua secundária de Tóquio, entre filas de cerejeiras em flor, é possível descobrir o Café Marble. Ali, todas as quintas-feiras, às três da tarde em ponto, uma misteriosa rapariga instala-se numa mesa junto à janela e pede um chocolate quente - mesmo nos dias de maior calor. Durante horas a fio, lê cartas em inglês e responde esmeradamente, com uma graciosa caligrafia, usando a sua caneta de aparo. Ela é a nossa primeira companhia numa viagem pelos sonhos, medos e alegrias de uma série de personagens, que aparecem e desaparecem na história, ligadas por fios invisíveis. Encontramos uma publicitária de sucesso que se vê obrigada a cuidar do filho - e a fazer -lhe uma omelete; uma professora primária que decide pintar as unhas de cor-de-rosa; ou ainda uma jovem que, em vésperas de se casar, tenta encontrar uma amiga com quem já não fala há anos…

Todas elas se cruzam no universo que Michiko Aoyama - a autora de O Que Procuras Está na Biblioteca - vai desvendando aos poucos. Conhecemos e apaixonamo-nos por aquelas personagens, tão próximas de nós nas suas aspirações, nos seus arrependimentos, nas decisões que tomam.

Chocolate Quente às Quintas-Feiras, fiel ao seu título, é um livro para se saborear lentamente, deixando que o tempo passe, reencontrando em cada página o calor daquele café onde todos nos sentimos em casa."
Ler Chocolate Quente às Quintas-Feiras, de Michiko Aoyama, é como entrar num espaço íntimo, onde o tempo corre devagar e cada gesto ganha um peso inesperado. As personagens são a alma desta narrativa - e foi nelas que encontrei o maior encanto. Por momentos, senti uma vontade quase física de atravessar a porta do Café Marble, pedir um chocolate quente e sentar-me diante da misteriosa rapariga que, semana após semana, lê e responde a cartas em silêncio. Esse ritual simples transforma-se em farol da história: um ponto de encontro entre vidas dispersas, um espaço onde os silêncios falam mais alto do que as palavras.

Ainda assim, houve instantes em que percebi uma certa dispersão narrativa. O enredo abre-se em várias direções, acompanhando personagens que surgem e desaparecem, deixando no ar a sensação de se que poderia ter aprofundado a história de cada uma delas. No entanto, talvez seja exatamente essa opção que confere ao livro a sua singularidade: cada figura é como uma janela breve, um vislumbre de vidas que carregam sonhos, fragilidades e escolhas, tal como as nossas. Essa multiplicidade cria uma tapeçaria de experiências humanas, em que a publicitária sobrecarregada, a professora que pinta as unhas cor-de-rosa ou a noiva em busca de uma amiga perdida se tornam reflexos possíveis do leitor.

O que parece disperso no início acaba, no entanto, por reencontrar um fio comum. É como se a autora, com delicadeza, nos mostrasse que não é necessário resolver tudo, mas basta reconhecer os laços invisíveis que unem as pessoas. E é nesse gesto que o livro nos envolve de novo: no regresso ao Café Marble, no aroma de chocolate quente, na tranquilidade que nasce de perceber que as vidas, mesmo distantes, ecoam umas nas outras.

Poe, Edgar Allan. O Gato Preto: 11 Contos Fantásticos de Terror e Mistério, 2020. Porto: Porto Editora.


Tradução: Leandro Marques
N.º de páginas: 240
Início da leitura: 28/09/2025
Fim da leitura: 28/09/2025

**SINOPSE**
"Era uma vez o sangue e o horror... As histórias de Edgar Allan Poe confrontam a violência dos pensamentos mais sombrios do ser humano. Na verdade mais crua podem esconder-se a insanidade e o horror.

A Clássicos Hoje é uma coleção inspirada por toda a luz antiga e moderna: nela cabem as maiores obras da literatura de todos os tempos, ilustradas por grandes nomes da arte contemporânea."
Ler O Gato Preto é entrar num universo onde a mente humana se revela tão assustadora quanto qualquer monstro. Nesta coletânea de onze contos, Edgar Allan Poe demonstra por que é considerado um dos mestres do terror psicológico: a sua escrita é precisa, quase cirúrgica, e cada história mergulha em atmosferas densas, feitas de culpa, loucura e fatalidade.

O conto que dá título ao livro é um dos mais perturbadores, explorando o remorso e a degradação moral de um narrador que tenta justificar o injustificável. Mas outras joias merecem destaque, como "O Escaravelho de Ouro".

O que impressiona é a atualidade dos temas: Poe escreve sobre medo, violência, delírio e morte, de forma tão íntima que parece falar diretamente para o leitor moderno. As suas narrativas curtas e intensas exigem atenção a cada detalhe, e a sensação de inquietação persiste muito depois da última página.

Para quem aprecia literatura sombria, O Gato Preto: 11 Contos Fantásticos de Terror e Mistério é leitura obrigatória. Mais do que assustar, Poe nos convida a olhar para o lado mais obscuro da alma humana – e é justamente aí que reside seu verdadeiro terror.

Donoghue, Emma (2025). O Expresso de Paris. Porto: Porto Editora.

Tradução: Cláudia Ramos
N.º de páginas: 264
Início da leitura: 20/09/2025
Fim da leitura: 27/09/2025

**SINOPSE**
«“Um enredo cheio de tensão e uma perspetiva da sociedade francesa do fim do século.”
THE NEW YORK TIMES - Alida Becker

Inspirado num desastre ferroviário de 1895, que ficou famoso pelas imagens extraordinárias da estação de Montparnasse, O Expresso de Paris é um romance intenso com um grupo de personagens fascinantes.
O expresso Paris-Granville é o cenário onde se encontram pessoas vindas de lugares tão próximos como a Bretanha e Irlanda ou tão distantes como a Rússia, a Argélia, a Pensilvânia ou o Camboja.
Nas várias carruagens seguem artistas e estudantes, deputados a caminho da abertura do Parlamento, lésbicas e gays, uma mulher grávida, um vendedor ambulante de café e também uma jovem anarquista francesa, Mado Pelletir, que tem um plano assustador.
Mas quando começa a interagir com os outros passageiros, descobre que eles são mais do que apenas um conjunto de rostos desconhecidos.
Evocativo e rico em simbolismo O Expresso de Paris capta sem esforço a política, o glamour e o caos que marcaram o fim do século XIX.»
Sou leitora fiel de Emma Donoghue e, por isso, confesso que O Expresso de Paris me deixou com um sabor agridoce. A autora, que tantas vezes me surpreendeu pela originalidade das histórias e pela subtileza com que constrói personagens memoráveis, parte aqui de uma premissa muito promissora – ainda por cima baseada em factos reais – mas o resultado não correspondeu às expetativas.

A história, passada a bordo de um comboio que liga Paris a Viena, poderia ser um palco perfeito para tensões, encontros e desencontros, mas acaba por se perder em detalhes que pouco acrescentam. Desfilam diante de nós uma multiplicidade de passageiros, cada um com o seu pequeno fragmento de história, mas nenhum suficientemente desenvolvido para nos prender. Ficamos como observadores distantes, a ver as figuras passar, sem nunca criar verdadeira empatia ou curiosidade.

Não é que a escrita de Donoghue tenha perdido qualidade – continua elegante e cuidada –, mas aqui falta a centelha que tantas vezes a distingue. É um livro que se lê, sim, mas que dificilmente deixa marca. Para quem, como eu, acompanha a autora e sabe do que ela é capaz, a sensação final é a de uma viagem promissora que chega ao destino demasiado cedo, sem ter cumprido todo o seu potencial.

Ibañez, Isabel (2024). O Que Guarda o Rio. Alfragide: Edições Gaialivro. 

Tradução: Elga Fontes

Nº de páginas: 528

Início da leitura: 23/09/2025

Fim da leitura: 27/09/2025

**SINOPSE**

"Inez Olivera, boliviana-argentina, pertence à luxuosa alta sociedade de Buenos Aires do século XIX, que se encontra imersa em magia antiga já esquecida. Inez tem tudo o que qualquer jovem quer, exceto o seu mais profundo desejo: estar com os seus pais, que passam o tempo a viajar pelo mundo e tendem a deixá-la para trás.

Quando recebe a trágica notícia das suas mortes, ela herda a enorme fortuna da família e um tio tutor legal. Em busca de respostas, viaja para o Cairo, levando consigo um anel de ouro que o seu pai lhe enviou antes de morrer para ser guardado. Mas, na sua chegada, a magia antiga ligada ao anel leva-a por um caminho sombrio e perigoso.

Com o desagradável e encantador assistente do seu tutor de guarda a frustrá-la a cada passo, Inez tem de confiar na magia antiga para poder descobrir a verdade sobre o desaparecimento dos seus pais - ou arriscar a tornar-se um peão num jogo muito maior que a pode matar."

Esta obra, de Isabel Ibañez, mistura elementos de fantasia com uma escrita encantadora e poética. A história transporta o leitor para um mundo onde o real e o mágico coexistem, criando uma atmosfera imersiva e profunda. O enredo é marcado por mistérios, segredos e personagens complexas, e ao longo da narrativa, a autora leva-nos a explorar a conexão entre o humano e o sobrenatural.

A escrita de Ibañez é rica em detalhes, com descrições vívidas que tornam o ambiente da história envolvente, ao mesmo tempo que mantém uma fluidez que faz com que a leitura seja prazerosa e dinâmica. Utiliza o ritmo da narrativa de forma eficaz, intercalando momentos de tensão com outros de reflexão e emoção. A autora também tem uma habilidade notável para criar diálogos naturais e expressivos que ajudam a aprofundar as relações entre as personagens.

A magia no livro é central para o enredo, mas não se apresenta de forma simplista ou excessivamente explicativa. Pelo contrário, a magia é tratada com um certo mistério, o que dá à história uma sensação de descoberta contínua. A autora faz uso de uma magia que não é apenas encantamento, mas também uma força ligada à natureza, ao espírito e aos sentimentos humanos, conferindo uma profundidade emocional à história.O enredo, com suas camadas de emoção, mistério e magia, não só cativa os fãs do género de fantasia, mas também provoca reflexões sobre temas como identidade, escolhas e o impacto das nossas ações. 
Recomendo!

 Wilson, Misty. Outono em Bramble Falls. Lisboa: Secret Society.

Tradução: Catarina Alves
N.º de páginas: 384
Início da leitura: 22/09/2025
Fim da leitura: 23/09/2025

**SINOPSE**
"Quando os pais decidem separar-se, Ellis tem de se mudar com a mãe de Nova Iorque para Bramble Falls.

A pequena cidade está cheia de distrações. Como Cooper, o ex-melhor amigo de Ellis - e o seu primeiro beijo -, que não só está ainda mais lindo, como também não quer ter nada que ver com ela.

Quanto mais tempo fica em Bramble Falls, mais difícil é fingir que não se está a apaixonar pela cidade. Com o regresso a Nova Iorque cada vez mais distante, Ellis é forçada a confrontar o que quer para o seu futuro - e o que isso significa para o seu presente."
Vou dar a minha opinião de uma forma diferente. Desta vez, aplico um teste de polígrafo a Outono em Bramble Falls, romance acusado de ser ligeiro, repleto de clichés e de frases feitas. O livro nega todas as acusações. Mas o polígrafo… esse não mente.

  • O romance tem personagens que viveram um amor adolescente? O livro diz que não, mas o polígrafo confirma: sim.
  • As personagens não pensam senão uma na outra a toda a hora? O livro nega, porém o polígrafo acusa: mentira. Eles não conseguem parar de pensar um no outro.
  • No início, os protagonistas não se suportam, só para mais tarde caírem nos braços um do outro? O livro diz que não, o polígrafo responde: verdade absoluta.
  • Há momentos em que uma personagem tropeça ou se desequilibra, caindo oportunamente nos braços da outra? O livro diz que não, o polígrafo aponta: mentira.
  • O texto evita expressões feitas como “borboletas na barriga”? O livro garante que sim, mas o polígrafo ri: falso, essa e outras frases feitas surgem várias vezes.
  • O romance é leve, tanto no conteúdo quanto na forma? O livro insiste que não, o polígrafo sentencia: é a mais pura das verdades.

 Ogawa, Yoko (2021). A Polícia da Memória. Lisboa: Relógio D'Água.


Tradução:Inês Dias
N.º de páginas: 248
Início da leitura:18/09/2025
Fim da leitura: 21/09/2025

**SINOPSE**
"Numa ilha sem nome, situada numa costa anónima, há objetos que começam a desaparecer. Primeiro chapéus, depois fitas, pássaros e rosas — até que a situação se agrava. A maioria dos habitantes permanece desatenta a estas mudanças, e os poucos com poder para recuperar os objetos perdidos vivem receosos da Polícia da Memória, entidade que assegura que o que desaparece permanece esquecido.

Quando uma jovem mulher, que luta por manter uma carreira de romancista, descobre que o seu editor está em perigo, elabora um plano para o ocultar debaixo da sua casa. À medida que medo e sentimento de perda se aproximam, rodeando-os, agarram-se à escrita como modo de preservar o passado."
Se soubesse que este livro era tão bom, tê-lo-ia lido muito antes. A Polícia da Memória, de Yoko Ogawa, é daquelas obras que nos agarra desde a primeira página, não apenas pela originalidade do enredo, mas pela delicadeza com que constrói um universo em desaparecimento.
Estamos perante uma distopia silenciosa, onde as coisas – objetos, lembranças, pedaços de identidade – vão sendo apagadas da vida das pessoas. Mais inquietante do que a perda física é a perda do significado, da ligação emocional, da própria capacidade de recordar. A autora consegue criar um ambiente denso, mas subtil, que nos envolve e nos faz sentir o peso de cada esquecimento.
As personagens são extraordinárias. A protagonista, com a sua força discreta, R, com a coragem de resistir, e o velhote, com a sabedoria terna de quem guarda o que resta, tornam-se âncoras num mundo em dissolução. É impossível não criar laços com eles. São os seus afetos, a sua tentativa desesperada de preservar as memórias, que nos mantêm atentos e nos lembram que a verdadeira luta é a de manter viva a essência do que somos.
Esta história é uma metáfora poderosa do nosso tempo. Mesmo que o nosso mundo não vá desaparecendo objeto a objeto, também nós assistimos a um lento desgaste: dos valores, da confiança, dos afetos. Ogawa lembra-nos que a perda nem sempre é ruidosa; às vezes é uma erosão quase impercetível, que só damos por certa quando já é tarde demais.
À medida que avançamos na leitura, o coração aperta-se numa angústia quase física. Sentimo-nos dentro da ilha, ao lado das personagens, testemunhas de um fim inevitável – não apenas de coisas, mas de tudo o que dá sentido à existência.
A Polícia da Memória é, sem dúvida, uma leitura imprescindível. Um livro que nos faz pensar, sentir e temer. Recomendo vivamente: é daquelas obras que permanecem connosco, mesmo quando fechamos a última página.

Monginho, Julieta (2024). Corpo Vegetal. Porto: Porto Editora.

N.º de páginas: 176
Início da leitura: 15/09/2025
Fim da leitura: 17/09/2025

**SINOPSE**

"«Ser ou não ser» é a questão com que Mimi se debate depois de conhecer Samson X, o célebre escritor americano cujo livro está a traduzir.

O corpo invadido, a vida estilhaçada, nada será como antes para esta mulher, que terá de decidir: ou age e faz ouvir a dor que toma conta dos seus dias, ou vive em silêncio o trauma e a raiva que a consomem, sem que o grito se escute, sem que a justiça se faça.

No novo romance de Julieta Monginho, a dicotomia consentimento versus abuso sexual ganha protagonismo, partilhando-o com as repercussões jurídicas e as consequências devastadoras que uma agressão desta natureza tem na vida de quem a sofre. Mas, com a mestria a que já nos habituou, a autora não deixa no tinteiro uma última nota de esperança, e Corpo Vegetal mostra como, mesmo no meio da dor e do trauma, é possível encontrar um novo fôlego, um novo caminho."

Corpo Vegetal, de Julieta Monginho, não é um livro que se ofereça ao leitor de forma imediata ou complacente. A sua leitura exige entrega, quase um abandono deliberado das defesas que normalmente erguemos perante narrativas de dor e de injustiça. A linguagem poética, cadenciada e densa, por vezes cria um certo distanciamento inicial, mas é justamente nesse ritmo peculiar que reside o poder da obra: o de nos enredar, lentamente, até já não conseguirmos escapar ao que nos é contado. O enredo cru, despido de ornamentos fáceis, coloca-nos diante de uma realidade difícil de encarar, mas tristemente reconhecível — a vulnerabilidade das mulheres, tantas vezes silenciadas, tantas vezes reduzidas a um corpo que se tenta apagar ou domesticar.

A protagonista, mergulhada nas dúvidas que cercam a denúncia de um abuso sexual, é confrontada não apenas com o agressor, mas também com a corrosiva desconfiança social que ameaça devorá-la. O romance expõe, assim, com firmeza e delicadeza, a violência mais subtil e mais devastadora: a de não se acreditar na palavra da vítima. Julieta Monginho dá corpo literário a esse dilema, transformando-o numa experiência sensorial e emocional que não se esquece. Gostei muito e recomendo.

Nelson, Suzanne (2025). As Bibliotecárias de Lisboa. Lisboa: Topseller.

Tradução: José Remelhe
N.º de páginas: 368
Início da leitura: 13/09/2025
Fim da leitura: 15/09/2025

**SINOPSE**
"Lisboa, 1943. A 2.ª Guerra Mundial assola a Europa.
Cidade glamorosa à beira do caos, Lisboa aloja espiões de duas fações. Entre eles, encontram-se Selene Delmont e Beatrice Sullivan, bibliotecárias de Boston. Oficialmente recrutadas para recolher livros proibidos, ambas são, na verdade, agentes secretas cuja missão consiste em infiltrarem-se na rede de espionagem do Eixo.
Em breve, contudo, dão por si envolvidas em jogos de enganos com dois dos homens mais conhecidos da cidade: um barão português exilado, Luca Caldeira, e um espião letal de nome de código Gable. Enquanto Selene seduz Luca nos seus luxuosos salões de baile, Bea, mais dada aos livros, mergulha no mundo sombrio dos informadores de Gable. Quando, porém, uma traição desvenda uma teia de mentiras cuidadosamente tecida, tudo aquilo por que ambas lutaram é posto em causa. Será este o seu ponto de rutura?
Inspirada por acontecimentos reais, Suzanne Nelson cria um enredo cativante com duas mulheres singulares, cuja coragem, determinação e amizade foram capazes de resistir à devastação da guerra."
Ao iniciar a leitura de As Bibliotecárias de Lisboa, de Suzanne Nelson, a expectativa de encontrar uma narrativa centrada na vida das bibliotecárias, com descrições ricas sobre livros e bibliotecas, cedo se revelou defraudada, uma vez que a obra se orienta sobretudo para uma intriga de espionagem em plena Lisboa de 1943. 
Essa deslocação do foco inicial pode gerar alguma deceção para o leitor que procure uma exaltação do universo literário ou das instituições culturais. Contudo, a autora compensa essa ausência com uma trama envolvente, marcada pelo mistério, pelo romance e pelo pano de fundo histórico da Segunda Guerra Mundial. A cidade de Lisboa, nesse período, surge como espaço privilegiado de encontros clandestinos e de jogos diplomáticos, e é justamente esse cenário que ganha protagonismo ao longo da narrativa. O reconhecimento dos lugares, o retrato da atmosfera de uma Lisboa dividida entre neutralidade e intriga internacional, bem como a forma como as personagens se movem nesse ambiente de tensão e ambiguidade, tornam a leitura cativante e dão ao romance um carácter singular. Assim, apesar da frustração inicial, o livro conquista pelo enredo e pela reconstituição de época, oferecendo ao leitor uma experiência literária que, embora distinta da esperada, acaba por se revelar aprazível e enriquecedora.
A autora parte de personagens e situações reais (como as bibliotecárias espiãs da IDC, como Adele Kibre e Maria Josepha Meyer; Aristides de Sousa Mendes, que terá inspirado a criação da personagem Luca Caldeira, meritório pelos seus extraordinários esforços em assegurar passagem segura para milhares de passageiros durante a guerra). E, por incrível que pareça, quando referidas as minas de volfrâmio de Portugal (contrabandeado para a Alemanha nazi), lá surgem as nossas Minas da Panasqueira, através do nome da minha cidade - Fundão (Cabeço do Pião).
 Aconselho a quem gosta de romances de ficção histórica, espionagem e romance.

Hart, Emilia (2025). As Sereias. Porto: Porto Editora.

Tradução: Célia Correia Loureiro
N.º de páginas: 352
Início da leitura: 12/09/2025
Fim da leitura: 13/09/2025

**SINOPSE**
"Uma história de irmãs separadas por séculos, mas unidas pelo poder do mar.
2019: Lucy acorda no quarto do ex-namorado, a asfixiá-lo. Horrorizada, foge para casa da irmã, Jess, numa cidade costeira em Nova Gales do Sul, em busca de conforto e de uma explicação para os sonhos vívidos que precederam o ataque. No entanto, Jess está desaparecida. Enquanto aguarda o seu regresso, Lucy vai descobrindo estranhos rumores sobre a cidade: desaparecimentos de homens ao longo de várias décadas, um bebé abandonado numa gruta à beira-mar, sussurros de mulheres vindos do oceano. Os sonhos de Lucy parecem mais reais do que nunca…
1800: Mary e Eliza são condenadas ao exílio e deixam o seu lar na Irlanda, embarcando num navio de prisioneiros com destino à Austrália. À medida que o barco as afasta de tudo o que lhes é familiar, começam a reparar em mudanças bizarras nos próprios corpos.
As sereias é um romance extraordinário sobre mulheres que enfrentam o inesperado e aceitam o potencial que descobrem em si mesmas. Uma história de resiliência feminina de cortar a respiração."
As Sereias, de Emilia Hart, é um mergulho numa narrativa onde o mar é tão personagem quanto as protagonistas. Entrelaçando passado e presente, o romance fala de irmandade, dor herdada, força feminina e o poder misterioso da natureza. Não se limita a um romance com mitos, é também uma reflexão sobre violência, desejo, sobrevivência e transformação. Em termos de recomendação, sugeriria-o para leitores de fantasia literária ou realismo mágico com apetência para o histórico, mas não necessariamente para quem procura ação intensa ou resoluções claras — aí talvez o ritmo ou a ambiguidade possam pesar. É uma obra que brilha, sobretudo pelo seu ambiente, pela evocação do mar, pelas personagens femininas carregadas de dor, força e mistério, e pela maneira como o passado e o presente se entrecruzam. Não é uma leitura leve — exige envolvimento emocional, disponibilidade para aceitar ambiguidades —, mas, para quem gosta desse tipo de narrativa, recompensa bastante. É um livro de lendas e água, de segredos e murmúrios, de mulheres que recusam ser silenciadas pelo tempo ou pelo medo. Recomendo!

Woods, Evie (2025). A Misteriosa Paradia da Rue de Paris. Porto: Singular.

Tradução: Luís Filipe Silva
N.º de páginas: 288
Início da leitura: 09/09/2025
Fim da leitura: 11/09/2025

**SINOPSE**
"Aninhada no meio das ruas empedradas de Compiègne, havia uma padaria em nada igual às outras. Pela cidade corriam rumores de que os seus bolos tinham um sabor mágico capaz de expulsar até a mais sombria mágoa. Uma mera dentada num croissant poderia trazer sorte, desbloquear uma memória preciosa há muito esquecida ou revelar desejos ocultos…
Depois de uma importante perda, Edith Lane sente que a sua vida precisa de uma mudança. Ao ver um anúncio de emprego, candidata-se à vaga que a faz viajar da Irlanda para Paris, onde se encontra a encantadora padaria para a qual foi contratada. Porém, quando se trata de Edie, a receita para o desastre não precisa de muitos ingredientes: uma quantidade pouco saudável de ilusões e uma pitada de desespero são suficientes para gerar o caos. É o que acontece quando percebe que não irá trabalhar na cidade dos seus sonhos, e que a padaria fica a uma hora de comboio da capital. Ao chegar lá, são muitos os dias em que pensa ter feito a escolha errada, sem perceber os mistérios daquele estranho lugar e o encanto que exerce sobre todos os que provam as suas iguarias. Contudo, o tempo e um segredo escondido sob as tábuas do soalho revelam-lhe não apenas uma história antiga cuja pista vale a pena seguir, mas também o caminho para encontrar o lugar a que verdadeiramente pertence."
Há livros que nos chegam às mãos como um verdadeiro bálsamo para a alma leitora — e A Misteriosa Padaria na Rue de Paris, de Evie Woods, é um desses casos. Não se trata de uma narrativa destinada a mudar radicalmente a forma como pensamos o mundo ou a literatura, mas antes de uma história envolvente, plena de charme e com um manifesto sentido de humor que a torna irresistível.

O romance constrói-se a partir de uma premissa simples, mas eficaz: personagens que carregam consigo fragilidades, sonhos por cumprir e um quotidiano por vezes cinzento encontram, naquela pequena padaria parisiense, uma centelha de magia capaz de alterar o rumo das suas vidas. Woods tem o talento de equilibrar leveza e emoção sem cair em excessos, oferecendo-nos uma narrativa que, sem exigir demasiado, nos envolve desde as primeiras páginas.

A escrita é acessível, quase coloquial, mas com uma cadência que prende e diverte. A autora joga com o humor de forma natural, nunca forçada, e cria situações que nos arrancam sorrisos genuínos. É este tom descontraído que faz do livro uma leitura perfeita para intercalar com obras mais densas ou exigentes: uma espécie de pausa literária que, em vez de quebrar o ritmo, o enriquece.

Não será, certamente, um título para quem procura uma literatura carregada de simbolismos ou experimentalismos, mas é um excelente exemplo de como a chamada “ficção de conforto” pode ser bem construída, cativante e memorável. 
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Sobre mim

Professora de português e professora bibliotecária, apaixonada pela leitura e pela escrita. Preza a família, a amizade, a sinceridade e a paz. Ama a natureza e aprecia as pequenas belezas com que ela nos presenteia todos os dias.

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