Pepetela (1997). Parábola do Cágado Velho. Lisboa: Círculo de Leitores.
Nº de páginas:190
Início da leitura:
23/09/2021
Fim da leitura:
25/09/2021
SINOPSE
"Falo
de um amor e de uma transgressão." "Quem sabe, talvez a transgressão
nunca fosse possível. Mas a granada existiu, essa granada que traçou no ar
espantado do planalto a figura da mulher amada. Mas uma granada, mesmo com tal
magia, pode materializar um Mundo?"
Pepetela
(Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos) nasceu em Benguela, Angola, em 1941.
Licenciou-se em Sociologia, em Argel, durante o exílio. Foi guerrilheiro do
MPLA, político e governante. A partir de 1984, foi professor na Universidade
Agostinho Neto, em Luanda, e tem sido dirigente de associações culturais, com
destaque para a União de Escritores Angolanos e a Associação Cultural
Recreativa Chá de Caxinde. A atribuição do Prémio Camões (1997) confirmou o seu
lugar de destaque na literatura lusófona.
OPINIÃO
Como
é que estive até agora sem ler este livro? Uma fábula simplesmente fabulosa!
É
notório que Pepetela nos remete, nesta obra, para a guerra civil angolana, num
ambiente rural e sob a perspetiva dos habitantes do kimbo (ou povoado).
Esta
fábula tem claramente uma função pedagógica, uma vez que transmite vários
ensinamentos.
Não
tenciono contar a história, mas destaco a relação de Ulume com um cágado velho
que, todos os dias, se deslocava calmamente até às águas do regato para beber.
Quando o cágado acabava de beber, dirigindo-se à sua gruta, Ulume bebia da
mesma água e perdia-se em profundas meditações, pois ele acreditava que o
cágado possuía uma sabedoria ancestral. Desejava que este, um dia, respondesse
às suas perguntas. É o único habitante que mantém esta relação com o cágado,
que acredita na sua sabedoria.
Luzolo
e Kanda, filhos de Ulume, partem para a guerra, mantendo-se cada um em “facções”
opostas, num confronto que realça bem o caráter absurdo desta guerra civil.
Durante
os ataques, os soldados aproveitam para saquear os bens alimentares dos povos,
raptavam raparigas e engravidavam outras, destruindo os kimbos.
A
par da guerra, surge o amor de Ulume por Munakazi e, a par das tradições destas
povoações, surgem novas formas de pensar. Por exemplo, quando Munakazi rejeita
a proposta de casamento com Ulume por este ser casado, e considerar que os
tempos eram outros, já não era o pai que mandava nela, ela é que tinha de
decidir se aceitava ou não e considerava que nenhuma mulher se deveria sujeitar
a partilhar o homem com outra mulher.
Saliento,
por fim, a capacidade de Ulume em recomeçar do zero, de cada vez que o kimbo
era destruído, a perseverança, a coragem, a resiliência que poderiam muito bem
servir de exemplo a todos os angolanos.
Um
livro muito bem escrito, de que aconselho muito a leitura e a reflexão sobre a história
que Pepetela nos apresenta desta bela forma metafórica.
Destaco
algumas das frases que me despertaram a atenção. Claro está, entre muitas
outras… E passo a citar:
“A
guerra voltou. Aviões e canhões destruíram os Kimbos e as gentes tornaram a se
entranhar nas profundezas das Mundas para sobreviver e lutar. Anos e anos. E a
fome sempre presente, pois é difícil cultivar ou tratar do gado se vivemos
escondidos em fuga. Ulume entendeu as razões desta dura guerra contra a fome, o
imposto e a palmatória.” (pág. 21)
“…homem
prudente dá uma volta ao rochedo antes de urinar nele…” (pág. 58)
“E
não posso aceitar ser segunda mulher. São outros tempos, aprendemos ideias
novas.” (pág. 60)
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