Mil Grous, Yasunari Kawabata

Kawabata, Yasunari (2009). Mil Grous. Alfragide: Publicações Dom Quixote.

Nº de páginas: 152

Início da leitura:19/09/2021

Fim da leitura: 21/09/2021

Tradução: Mário Dias Correia

SINOPSE

Com uma contenção que mal disfarça a ferocidade das paixões das suas personagens, um dos grandes romancistas japoneses do pós-guerra conta uma luminosa história de desejo, arrependimento, e da saudade quase sensual que liga os vivos aos mortos. Quando Kikuji é convidado para uma cerimónia do chá organizada por uma antiga amante do falecido pai, não está à espera de se ver envolvido com a rival e sucessora desta, a senhora Ota. Nem suspeita do sofrimento profundo que nascerá dessa relação. Mas, na cerimónia do chá, cada gesto tem um significado. E, em Mil Grous, até o toque mais fugaz ou o comentário mais casual têm o poder de iluminar vidas inteiras... por vezes no mesmo instante em que as destroem.

OPINIÃO

Com uma linguagem aparentemente simples, os livros de Kawabata têm de ser lidos nas entrelinhas, dada toda a simbologia evocada em cada comportamento, em cada personagem e até nos objetos que a nós nos poderiam parecer mais corriqueiros.

Começando pelo título, o grou é um dos símbolos mais tradicionais do Japão. Os japoneses acreditam que o grou é uma ave sagrada que simboliza paz e longevidade. Elas também simbolizam o amor conjugal e a fidelidade, porque essas aves são monogâmicas, unidas até à morte. Nos casamentos, muitos costumam juntar os amigos e parentes para dobrar mil origamis de grous dourados para dar sorte, fortuna e desejar ao casal uma vida longa e feliz.

Não consegui, porém, talvez me tenha escapado algo, compreender totalmente a relação entre o título e a história em si, salvo o momento em que o protagonista masculino fica encantado com o lenço de uma jovem com um padrão de grous.

Porém, não foi essa felicidade, essa longevidade que encontrei neste livro, antes uma imensa fragilidade humana, a infidelidade, a complexidade que é a mente humana nas suas decisões, relações e obsessões. Há, neste livro, algum surrealismo e não se torna fácil juntar as peças para lhe conferir um total sentido.

Considerei algo confusas as relações entre as personagens e fiquei com a sensação de que estas carregam em si as relações dos seus antepassados, como uma sina.

Gostei imenso das descrições dedicadas à preparação do chá, “a mais excelente das bebidas para cultivar o espírito”, os rituais, o culto dos utensílios utilizados para beber o chá, a preparação do chá no recipiente de ferro sobre as brasas, muito bem planeada, o recolhimento necessário, a concha de bambu, o silêncio, os gestos, a sensualidade…

Há uma efemeridade humana que contrasta com a longevidade dos utensílios onde é servido, cerimoniosamente, o chá. Mas este é também ele efémero.

As plantas do chá demoram tanto até dar a flor que, efemeramente, murcham para se apreciarem num breve momento em que se saboreia o chá. Não serão também as pessoas flores que, inevitavelmente, murcham?

Gosto de ler Kawabata, apesar de toda a complexidade, há na sua narrativa uma efusão que nos aquece o espírito.

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