Ekvtimishvili, Nana (2022). Onde as Pêras Caem. Dom Quixote.
Tradução:
Maria do Carmo Figueira
Nº de
páginas: 160
Início da
leitura: 01/06/2022
Fim da
leitura: 02/06/2022
SINOPSE
Lela,
a protagonista deste romance, tem duas certezas na vida: a de que o seu
professor de História tem de morrer e a de que ela precisa de começar uma vida
nova para lá desse campo onde as peras caem.
Numa
Geórgia recém-independente, nos arredores de Tbilisi, fica uma casa apalaçada
onde funciona uma instituição que acolhe órfãos e crianças com deficiência
mental. É conhecida por Escola dos Idiotas, ainda que a maioria dos que hoje
ali vivem - como o pequeno Irakli - tenham sido simplesmente abandonados pelas
mães por desespero e não sofram de qualquer doença mental. Porém, em lugar de
serem acarinhadas e educadas, as crianças da Escola dos Idiotas recebem dos
professores sobretudo lições de negligência e abuso.
Com
dezoito anos feitos, Lela já tem idade para poder deixar o estabelecimento, mas
está lá há tanto tempo que não se lembra de ter tido família. E, não sabendo
para onde ir, aceita um trabalho na instituição para poder planear à vontade a
sua vingança suprema e, ao mesmo tempo, preparar a adoção de Irakli por um
casal norte-americano. Mas nem tudo corre como planeado…
Este é um retrato poderoso, mas sem sentimentalismos, de um grupo de jovens que se defendem mutuamente da crueldade do mundo dos adultos. Premiado e aplaudido pela crítica e pelo público, ficará seguramente na memória de todos os leitores.
Este
é um livro extremamente cru e direto, diria mesmo “sem rodeios”, sem floreados,
com o foco numa situação que nos constrange, que preferiríamos não conhecer,
porque magoa e choca e abala.
A
autora parte de uma escola real, muito perto da sua casa – uma escola para
crianças com deficiência, que acolhia também crianças abandonadas pelos pais.
Era conhecida no bairro como a “Escola dos Idiotas”.
As
negligências, os abusos, a violência entre pares, que marcaram estas crianças
para sempre, chegam até nós de forma chocante, sobretudo se atendermos à idade
destas crianças, entre os 6 e 18, que supostamente deveriam estar felizes, nos
seus lares, a brincar, a serem simplesmente crianças. Depois, os
desaparecimentos de algumas crianças a que as que permanecem vão assistindo. Por
fim, o parco sucesso destas crianças nas suas vidas futuras, o passarem ali
“toda uma vida”…
Para
além da fome, da pobreza em que vivem, há o constante medo, os abusos sexuais,
a indiferença dos pais que, ao encontrarem outras vidas, se descartam destes
“filhos sem préstimo”.
As
personagens são convincentes e, por alguma razão, tocou-me particularmente
Irakli que vai tentando sempre manter vivo o sonho de que a mãe vai regressar
para o levar, mesmo quando esta se muda para o estrangeiro. Contacta-a por
telefone, com a ajuda da protagonista, Lela, acreditando no que a mãe lhe vai
prometendo, que na “próxima semana” irá busca-lo. Lela também é cativante,
porque, tendo-se tornado forte à custa de muito sofrimento, vai tentando sempre
proteger os mais novos.
Um livro nomeado para o Man Booker Prize, que venceu o Prémio de melhor romance georgiano, o Saba Literary Prize, o Litera Prize, que merece ser lido.
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