As Meninas Proibidas de Cabul, Jenny Nordberg

Nordberg, Jenny (2015). As Meninas Proibidas de Cabul. Alfragide: Edições ASA.

Tradução: Mário Dias Correia

Nº de páginas:400

Início da Leitura: 28/08/2022

Fim da leitura: 29/08/2022

**SINOPSE**

Nas cidades e aldeias afegãs, há raparigas que se movimentam livremente e sem medo de represálias. Num país onde a mulher não tem valor nem privilégios, há meninas que vão à escola e brincam na rua. Elas existem, mas ninguém sabe quem são. Porquê? Porque estão disfarçadas de rapazes. São as suas próprias famílias a fazê-lo ao abrigo de uma tradição secreta ancestral chamada bacha posh.

Para uma família afegã, não ter filhos varões é uma tragédia. De forma a contornar este estigma, muitos vestem e apresentam ao mundo as suas filhas como se fossem rapazes. Mas este estado de graça só dura até à puberdade, altura em que são obrigadas a assumir a sua identidade feminina. Para as meninas que tiveram um vislumbre de autonomia, o choque é dilacerante.

A jornalista premiada Jenny Nordberg deparou-se com este costume e ficou fascinada. Pouco a pouco, conseguiu reunir um grupo de mulheres corajosas. Os seus testemunhos são fascinantes e dão-nos uma perspetiva totalmente nova sobre o que significa ser mulher e os sacrifícios a que obriga ainda nos dias de hoje.

Este é um livro repleto de personagens reais, às quais seria impossível não ficar presa. E, como diz a autora na dedicatória inicial “Para todas as raparigas que perceberam que, de calças, conseguiam correr mais depressa e trepar mais alto”.

Foi um livro que levou à autora 6 anos a ser escrito, que exigiu muita investigação, muitas leituras e o contacto com estas mulheres, a quem entrevistou. E, como em muitas situações desta natureza, o relato não podia deixar de ser “subjetivo”. Os acontecimentos relatados sucederam essencialmente entre 2010 e 2011.

Ser mulher afegã não é nada fácil, nada justo, nada aceitável, e, apesar de já terem ocorrido alterações, a maior parte dos direitos das mulheres continua a ser violado e calado. É importante elevar a voz e contar ao mundo o que sucede e as injustiças de que são alvo, não apenas pelos homens, mas pelas normas e costumes sociais e religiosos, em que nascem e em que vivem toda a sua vida.

Nascer homem é uma bênção. Nascer mulher é uma tragédia.

Não vou recontar o livro, riquíssimo em testemunhos, na forma como nos são transmitidas as tradições, as maneiras de ser e de pensar condicionadas pelo próprio meio social em que estas mulheres nasceram, mas não posso deixar de falar de uma ou duas situações que, por mais que estejamos esclarecidos sobre o assunto, nos deixam indignados.

A um homem afegão é permitida a poligamia. À mulher, não. Se um homem tem muitas mulheres, é porque tem um excelente estatuto social que lhe permite “adquiri-las”.

Um homem afegão é livre de se vestir e agir como quer. A mulher não, é sempre vigiada e controlada até estar pronta para casar (algumas aos 13 anos ou mal tenha “as regras”).

Um homem afegão só é considerado verdadeiramente macho se tiver um filho varão. Se tiver apenas raparigas, a sua virilidade é questionada.

Um homem afegão exerce, na maior parte das vezes, atos de violência contra as mulheres e as filhas, o que, no seu entender, é considerado normal.

Uma mulher não pode rir, cantar, dançar, vestir-se sem a burka em público, porque, dessa forma, é considerada leviana e nenhum homem a quererá tomar por esposa.

Uma mulher deve ter muitos filhos, e pelo menos um filho varão. Caso isso não aconteça, para que a virilidade do homem não seja posta em causa, uma das meninas é convertida em rapaz – bacha posh – sendo-lhe cortado o cabelo, sendo vestida e tendo direito a tudo o que os rapazes têm. Se, entretanto, nascer um irmão, voltam à sua condição de raparigas. Se não, são mantidas assim até à adolescência, altura em que já não conseguirão esconder as suas formas e em que têm de casar para terem a sua descendência, enquanto não forem demasiado velhas.

Uma mulher estéril, é menosprezada e considerada fraca.

A mulher deve ficar em casa a tomar conta dos filhos e marido.

As mulheres vivem de tal forma dentro deste espírito, que são extremamente cruéis umas com as outras.

As sogras batem, na maior parte dos casos, nas noras.

Não é fácil pensarem de outra forma, parecem formatadas pelo meio social com a ideia de que viver assim está certo e tudo o que não seja assim, é errado.

Este é um livro que transmite conhecimento muito bem fundamentado e, por isso mesmo, apreciei bastante e não deixarei de recomendar!

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