Ginzburg, Natalia (2021). As Pequenas Virtudes. Lisboa: relógio D’Água.
Tradução: Miguel Serras Pereira
Nº
de páginas: 152
Início
da leitura: 26/04/2022
Fim
da leitura: 27/04/2022
**SINOPSE**
Entre
1944 e 1962, Natalia Ginzburg escreveu um conjunto de onze ensaios de pendor
autobiográfico. São textos essenciais, o legado de uma das mais importantes
escritoras do século XX, que viveu retirada no campo com o marido durante o
governo de Mussolini e nos anos 60 se deslocou para Londres. Por eles, passam
as suas impressões sobre a juventude e a idade adulta, as consequências da
guerra, o medo, a pobreza e a solidão, as recordações de Cesare Pavese e a
experiência de ser mãe e mulher quando se é escritora.
São
páginas de uma perturbadora beleza, lúcidas, plenas de sabedoria, testemunho de
uma escrita capaz de transformar objectos e experiências quotidianos em
assuntos de grande significado sobre os quais o tempo parece não passar.
A Introdução é de Rachel Cusk.
Adorei
este livro! Apreciei cada capítulo, cada pequena virtude. A salientar alguma,
salientaria "As relações humanas", capítulo no qual a autora reflete
sobre as relações humanas ao longo da nossa vida, abordando, por exemplo, a
questão das relações familiares, que acabam por influenciar a relação das
crianças com o mundo. Na infância, confrontamo-nos sempre com o outro como um
ser superior que não conseguimos igualar, o que tende a aumentar a sensação de sofrimento,
agravada especialmente na adolescência, porque os adolescentes consideram-se
sempre, a dada altura, desprezados pelos colegas da escola, veem-se como seres
inferiores, têm uma fase em que a falta de autoestima se torna enorme e os
conduz a uma solidão envolta em névoas de dúvidas. Depois, esses jovens
tornam-se eles, mais tarde, pais e percebem que, quando os filhos nascem,
cresce, nos adultos, o medo, "medos infinitos crescem em nós, de qualquer
perigo possível ou sofrimento que possa atingir os nossos filhos",
"Amamos os nossos filhos de um modo tão doloroso, tão assustado..." que
nos esquecemos de que eles são do mundo e não nossos. E tudo passa tão
depressa, tudo é tão efémero que, quando nos damos conta, nós, ex-crianças,
ex-adolescentes, a vida passou por nós e o espelho devolve-nos um "rosto
sulcado, escavado", até que perdemos os nossos medos e o próprio medo da
morte.
Este
capítulo resume, de uma forma dura, mas tão bem escrita e intensa o nosso
humano percurso enquanto seres de passagem, com as suas coisas e memórias, mas
eternamente tímidos. Deste capítulo, salientaria ainda a frase "As
relações humanas devem ser redescobertas e reinventadas todos os dias".
O
livro termina com outro capítulo belíssimo, que dá título ao livro, “As
pequenas virtudes”, onde a autora reflete sobre a educação dos filhos,
distinguindo as pequenas virtudes: a poupança, a indiferença, a prudência, a
astúcia, a diplomacia e o desejo do sucesso das grandes virtudes: a
generosidade, a coragem, a franqueza e o amor à verdade, o amor ao próximo e a
abnegação e o desejo de ser e de saber. Preocupados que estamos em transmitir
pequenas virtudes, esquecemo-nos, muitas vezes, de transmitir as grandes
virtudes.
Serão
os filhos felizes com o que é mais cómodo para eles e para nós? Não será
importante que os filhos percebam que os próprios pais são imperfeitos? Será
que ao darmos um mealheiro ao nosso filho não poderá torná-los demasiado
ligados ao dinheiro, dedicando pensamentos para com o dinheiro que poderiam
estar focados em coisas deveras mais importantes?
Muitas
as reflexões sobre virtudes em que, na maior parte das vezes, não refletimos.
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