Poemas, Leya

Poemas é uma pequena antologia de poemas da Leya, publicado em 2009 e que reúne poemas de 28 poetas de expressão portuguesa e passo a citar: “Dizia Carl Sandburg que a Poesia é um eco que convida uma sombra para dançar. Se esta antologia convocar as sombras, e a dança com o leitor acontecer, estará plenamente justificada a sua publicação” (Grupo Leya).



E, realmente, esta antologia só peca mesmo por ser pequena, porque os poemas foram bem escolhidos e abordam vastas temáticas e poetas. Entre os temas abordados, destaco o “eu errante e mareante”, de Manuel Alegre; a ingenuidade dos nossos contemporâneos, de Fernando Pinto do Amaral; o materialismo em detrimento do sagrado, de João Aparício; o naufrágio da alma humana, de mia Couto; a despedida e solidão por Gastão Cruz; reinvenção da infância, de Manuel Gusmão; o abandono de si mesmo, de Guita Jr; ilusões, de Nuno Júdice; saudade, de Conceição Lima; entre outros.

Termino com dois poemas que apreciei particularmente:

Poema

Deixo que venha
se aproxime ao de leve
pé ante pé até ao meu ouvido

 

Enquanto no peito o coração
estremece
e se apressa no sangue enfebrecido

 

Primeiro a floresta e em seguida
o bosque
mais bruma do que neve no tecido

 

Do poema que cresce e o papel absorve
verso a verso primeiro
em cada desabrigo

 

Toca então a torpeza e agacha-se
sagaz
um lobo faminto e recolhido

Ele trepa de manso e logo tão voraz
que da luz é a noz
e depois o ruído

 

Toma ágil o caminho
e em seguida o atalho
corre em alcateia ou fugindo sozinho

 

Na calada da noite desloca-se e traz
consigo o luar
com vestido de arminho

 

Sinto-o quando chega no arrepio
da pele, na vertigem selada
do pulso recolhido

 

À medida que escrevo
e o entorno no sonho
o dispo sem pressa e o deito comigo

 

                       [Maria Teresa Horta, pp. 27-28]

 

Rondó da Escrita

No que escrevi me traduzi

e traduzi outros também

e traduzindo me escrevi

e a escrever-me fui eu quem

 

das várias coisas que senti

fez sofrimento de ninguém,

depois risquei, depois reli

e publiquei: assim porém

 

havia sempre mais alguém

para o chamar então a si.

também vivendo o que menti,

mas como seu, mas como sem

 

ter sido meu o que escrevi

fosse por mal, fosse por bem,

é a sua vez, e que mal tem?

no que escrevi sobrevivi.

 

                   [Vasco Graça Moura, pág. 43]

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